Capítulo Oito

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Acordei em uma manhã de sábado disposta a tocar minha vida pra frente.  Comecei pelo meu emprego, só não sabia se seria possível voltar,  já que eu não me recordava do mesmo, não imagino que seja seguro, mesmo assim, eu estava disposta a tentar. 

Peguei um táxi e o mesmo me levou até o hospital, o mesmo que eu passei os três últimos anos.

- Regina!- Uma enfermeira veio me cumprimentar assim que eu passei pela recepção.- Que bom que voltou. O chefe vai ficar muito feliz.

Eu apenas sorri, o rosto dela não era conhecido, entretanto, não havia dúvidas de que ela me conhecia.

- E onde o chefe está?- Indaguei.
- Na sala dele. Vem, eu te acompanho até lá.

A segui até o segundo andar do hospital, e paramos diante de uma porta onde estava escrito: "Diretor de cirurgia".

- Bom, eu vou deixar vocês conversarem.- Me deixou ali e seguiu o caminho por onde viemos.

Eu respirei fundo antes de bater na porta e escutar um "Pode entrar" vindo de lá de dentro.

Abri a porta e lá dentro havia um homem um pouco mais velho que eu. Seus cabelos era um charme para o resto de seu corpo, que de longe denunciava que o médico a minha frente frequentava academia.

- Nossa melhor médica voltou!- Se levantou e veio ao meu encontro  e me abraçou. 
Imagino que éramos muito íntimos, porque aquele abraço durou no mínimo quinze segundos.

Não que eu tenha contado, é claro!

Olhei em seu jaleco o nome Phillips, o que me ajudou a dar prosseguimento à conversa.

- Doutor Phillips...- Ele me interrompeu.

- Regina, éramos amigos antes do acidente, amigos muito íntimos, pode me chamar de Phill.

Eu estranhei a forma como ele havia dito, e a forma como ele estava me olhando.

- Como assim "muito íntimos"?- Indaguei com medo da resposta.

- Digamos que nós nos encontrávamos na sala de sobreaviso durante os plantões.

Senti meu estômago embrulhar naquele momento.
Que tipo de pessoa eu fui?
Me levantei de lá sem dizer mais nada e sai.

- Regina?- A mesma enfermeira que me recepcionou veio atrás de mim.- E aí, você vai voltar a trabalhar conosco?- Perguntou animada.

- Eu preciso ir!- Falei e sai dali o mais depressa possível. Entrei no carro da minha mãe e dirigi sem rumo.

[...]

- Você não valoriza nosso casamento!- Caio falou alterado.
Eu não o olhava nos olhos, conseguia ver o papel do divórcio em suas mãos

- Caio, é o meu emprego. Eu te apoiei quando você precisou.- Falei sentindo meus olhos arder por conta das lágrimas retidas.

- Eu sei!- Falou suspirando e desviando o olhar de mim.- Por favor, vamos Conversar.- Pediu tentando manter a calma.

- Sabe que eu não posso, eu estou atrasada.- Falei esperando compreensão da parte dele. Mas não foi o que aconteceu.

- Certo Regina. Você sempre está com pressa.- Ele olhou o papel em suas mãos e depois os entregou para mim.- Veja o que é prioridade para você.

Dito isso, ele saiu do meu campo de vista.

***

Ouvi o som de uma buzina muito perto, o que me despertou do meu breve devaneio, me fazendo desviar no último segundo, e indo parar no acostamento.

Percebi que faltavam poucos quilômetros para eu sair da cidade.
Eu não fazia ideia do quanto eu havia dirigido, mas sumir dali e nunca mais voltar não me parecia uma má decisão, não por mim, mas pelas pessoas que me amavam. Elas não mereciam uma pessoa como eu na vida delas, eu nas as merecia. Comecei a chorar no carro mesmo. 

Talvez descobrir quem eu era seria mais doloroso do que eu podia imaginar.

Descobri que eu era uma mulher que traía o marido, e ainda frequentava a igreja. 
As pessoas achavam que eu era algo, quando eu fazia algo tão baixo quanto a traição. Vivi uma mentira, uma farsa.
E Caio? Ele não merecia. Eu não valorizava meu casamento, minha família... eu não valorizava nada.

Entendo agora porquê eles receavam em me contar meu passado. Ninguém se orgulharia de uma vida assim, eu não me orgulhava. Não entendo porque voltar do coma se eu não merecia a vida que eu tinha. 

Respirei fundo tentando me controlar, olhei no banco do carona minha bolsa. Eu havia colocado uma chave dentro dela mais cedo. A procurei até que a encontrei. 

Dirigi alguns minutos até parar de frente a minha casa, a observei por um momento, decidindo se saía do carro, ou dava partida no mesmo e voltava pra casa da minha mãe.
Optei pela primeira opção, já que eu precisava dar um ruma na minha vida.

Não me apressei para chegar diante da porta, meus passos foram curtos e lentos. Parei diante da porta de cor branca. Mas aí senti medo de  entrar, então dei as costas para ir embora, entretanto parei ali mesmo. Suspirei  fundo e usei a chave para abrir a casa.

Entrei e encontrei Caio na sala olhando umas fotos que estavam dentro de uma caixa, ele me olhou confuso, e nenhum de nós disse uma palavra sequer.

CONTINUA

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