Capítulo 15 - Lara

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Perder um filho!
Eu via as mães no hospital sofrendo tanto por alguém que elas nunca tinham visto, mas só quando passei por isso que entendi. Você cria um laço inexplicável e não consegue cortar. Acho que sempre vou ter essa dor, sempre vou lembrar desse dia, sempre vai faltar esse pedaço no meu coração.
Recentemente me mandaram um poema de Carlos Drummond de Andrade em que uma frase me marcou muito:

''A dor é inevitável. O sofrimento é opcional...''

Então não adianta eu ficar sofrendo, isso não vai trazer meu bebê de volta. Nada vai!
Agora era hora de seguir em frente, de cabeça erguida.

[...]

Depois de dias trancadas no quarto sem querer ver ninguém resolvi sair. Acho que iria me fazer bem.
Desci as escadas e ouvi uma conversa na sala de estar, fui em direção a sala e Emma estava sentada atenta ao celular enquanto Enzo e Tom saiam. Acho que nem chegaram a me ver.
-Bom dia. - falei e ela me olhou surpresa.
-Larinha, como você está? - Emma me abraçou e eu respirei fundo prendendo o choro.
-Levando e você?
-Estou bem.
-Estou querendo ir no salão hoje, ver o Ariel e distrair a cabeça. Quer ir comigo? - perguntei.
-Claro, amiga. - alisou meu rosto. - Só vou precisar passar na joalheria, tem problema?
-Não. - fui em direção a cozinha e encontrei Ceci preparando um suco. - Bom dia. - Ceci me olhou e abriu um sorriso.
-Estou feliz em te ver longe do quarto, meu amor.
-Vou ao salão hoje, pode avisar ao Pereira por favor?
-Claro, quer comer algo?
-Só quero beber esse suco, posso?
-Não só pode, como deve. - me entregou um copo e eu bebi enquanto a observava fazer outras coisas.
-Que horas pretende ir, Lara? - Emma entrou na cozinha e eu dei de ombros. - Vamos agora, almoçamos fora e conversamos um pouco.
-Tudo bem, vou pegar minha bolsa.
-Vou ligar pra Bruna. - Emma falou pegando o celular do bolso.
-Faça isso. - falei indo para o quarto.
Estava pegando minha carteira quando um papel caiu no chão. Abaixei pra pegar, mas meu corpo foi ao chão quando eu vi o que era: uma foto da primeira ultrassom do bebê. Foi impossível não deixar lágrimas rolarem. Senti alguém abrir a porta e nem me importei em olhar, o cheiro já denunciava quem era.
-Lara, o que foi? - Enzo sentou ao meu lado e respirou fundo quando viu o que estava na minha mão.
-Ainda dói saber que eu não carrego mais ninguém dentro de mim. - ele me abraçou forte.
-Eu sei, mas a gente tem que superar isso.
-Pra você é fácil. - ele me soltou na hora e olhou nos meus olhos com um sentimento diferente.
-Fácil? Lara, estamos falando do meu filho. A pessoa mais importante da minha vida. Você acha que foi fácil pra mim?
-Desculpa? - ele deu de ombros e levantou estendo a mão pra mim. Peguei e quando estava em pé fui para os seus braços e o beijei. Tinha dias que a gente não se tocava e nem se beijava. Senti seu membro ganhar vida na minha cintura e dei o primeiro sorriso.
-Acho que minha situação serviu pra eu ver seu sorriso depois de algum tempo.
-Sim. Foi só um beijo.
-Foi o seu beijo. - eu olhei pra ele sem acreditar que tinha falado aquilo e ele quando percebeu fechou a cara. - Preciso trabalhar agora. - beijou minha testa e saiu do quarto rápido. Era sempre assim, se falava algo bonito, ele tomava sua postura de mafioso e fugia o mais rápido possível.
Guardei a foto numa gaveta e tranquei. Esse bebê seria apenas uma lembrança. Peguei minha bolsa e desci ao encontro de Emma.

[...]

Assim que entrei no salão, Ariel correu na minha direção me abraçando.
-Lara, eu sinto muito!
-Eu também, mas vim aqui pra você me animar.
-Veio a pessoa certa então.
-Emma está aqui também.
-Me diga que vocês trouxeram um homão daqueles que circulam a casa daquela perfeição que você chama de namorado.
-Sim, o Pereira está ai fora.
-Meu Deus! Aquele homem me faz querer ser sequestrado, só pra ter o prazer dele vir me salvar e me segurar naqueles braços fortes. - se abanou e eu tive que rir. Era disso que eu precisava.
-Ele é muito bonito mesmo.
-Nem tanto quanto seu namorado, está muito bem servida. - me deu um tapinha.
-Já está fazendo suas graças, Ariel?
-Emma, eu estava falando das perdições que você, Lara e Bruna tem a sorte de ter por perto.
-Eles são mesmo, tem que encontrar um pra você.
-Preciso ir no mesmo lugar que vocês. - balançou a cabeça como se tivesse sonhando. - E o que vamos fazer hoje em vocês?
-Quero hidratar meu cabelo. - falei.
-Amor, você não quer, você necessita. Ele está horrível e iremos fazer um milagre em você!
Deixei me envolver com as bobeiras de Ariel e consegui me divertir bastante.

[...]

Entrei na joalheria com Emma e fiquei observando as joias, tudo lindo e delicado.
-Essa peça foi comprada pelo Sr. Enzo. - uma moça falou e eu a observei.
-Sim. Ele compra muitas peças aqui? - perguntei acariciando o colar que Enzo tinha me dado.
-Foi a primeira vez, ficou bonita em você. Mas você colocou essa pedrinha no pingente?
-Obrigada. Não, já recebi assim. - olhei em volta e vi Emma vir rápido.
-Podemos ir já, só vim entregar uns papéis.
-Então vamos, tchau. - acenei para moça e saí entrando no carro que já nos esperava.
Aquilo tinha sido estranho, mas resolvi deixar pra lá e seguir meu caminho pra casa.

[...]

Já se passava das duas da manhã quando ouvi a porta do quarto abrir, olhei e vi um Enzo todo sujo de sangue e com o rosto com um pequeno hematoma. Levantei correndo e fui na sua direção.
-O que aconteceu?
-Nada. - falou sem me olhar nos olhos.
-Vou perguntar de novo: o que aconteceu?
-Eu encontrei o cara que tava dirigindo o carro no dia que a gente perdeu o bebê.
-E o que você fez com ele? - perguntei assustada.
-O que você acha? - ele deu um sorriso que fez meu corpo arrepiar.
-Você matou o cara? - perguntei indignada.
-Sim. - tirou a camisa e jogou no canto do quarto.
-E você acha que isso vai trazer o nosso bebê de volta?
-Não, mas que me fez sentir melhor. Isso fez! - me deu um sorriso e foi em direção ao banheiro.
-Enzo, eu não consigo te entender. - fui atrás e fiquei o observando tomar banho.
-Acredite, não quero nem que tente.
-Eu não gostei que fez isso! - ele me olhou sem entender.
-Ele matou nosso filho, eu dei uma morte tranquila pra ele. Deveria ter feito muito pior!
-Não quero nem que continue.
-Tudo bem. - o observei por uns minutos até que ele saiu e parou na minha frente todo molhado. Eu engoli em seco e resolvi me afastar.
Deitei na cama e algum tempo depois senti sua mão na minha perna. Abri os olhos e o encarei séria.
-Você tem seu jeito pra lidar com a dor e eu tenho o meu. Desculpe se não é o jeito que gosta, mas eu aprendi assim.
-Tudo bem, não vou entrar nesse assunto mais. - fechei meus olhos e senti sua respiração no meu rosto.
-Vou te dar um beijo. - disse e senti seus lábios tocarem o meu. Deixei ele me beijar. - Agora vamos dormir. - ele deitou ao meu lado e me abraçou.
Não iria comentar nada, mas Enzo me assustava, certas atitudes dele me deixavam completamente sem reação.

Atraída Pelo PerigoOnde histórias criam vida. Descubra agora