22 de fevereiro
Pedro se esforçaria para ser uma pessoa melhor esse semestre, era sua resolução de ano-novo. Não se atiraria nas calouras, muito menos aceitaria todas as investidas que elas fizessem. Já estava na metade do curso e precisava começar a dedicar mais horas no laboratório e menos horas na cama — em todas as atividades relacionadas com o local. Repetia para si mesmo que dessa vez seria diferente e que, com seus vinte e três anos, já estava na hora de parar de se comportar feito um adolescente no cio e focar em coisas mais importantes que sexo. As camisinhas na carteira que pesava no bolso traseiro da sua calça debochavam do seu discurso patético e vazio.
A voz de Helena ressoava, o megafone agora já esquecido, o tom robótico abandonado dando lugar à sonoridade delicada de suas palavras. Ela sorria, sendo vez ou outra interrompida por Jorge quando ele via alguma coisa que gostava. Pedro se questionava do porquê de não corresponder aos sentimentos dela. Ela era bonita, gostosa, inteligente e vinha se mostrando uma boa amiga nos últimos meses. A vida seria tão mais fácil se ele simplesmente parasse de perder tanto tempo com mulher. Talvez devesse dar uma chance a ela e...
Pedro sequer finalizou o pensamento quando viu uma garota, baixinha e um pouco acima do peso, dirigir-se até a cadeira. Suas pernas grossas estavam marcadas por um short jeans curto, seios pouco avantajados recobertos por uma regata amarela, nada de especial, exatamente igual à de todos os outros. Seus cachos escuros emolduravam seu rosto arredondado e seus olhos cor de obsidiana eram grandes demais para um rosto tão pequeno, mas, ainda assim, havia uma harmonia de traços em suas feições que fez com que Pedro ficasse hipnotizado. Sua pele negra completava o que parecia ser uma pintura de museu, pensada nos mínimos detalhes. Ou pelo menos era assim que parecia para ele.
— Qual seu nome, caloura? Nome, idade, estado civil, curso e posição favorita — Helena perguntou em um tom de voz já automático, o sorriso fixo em seu rosto fazia com que suas bochechas começassem a doer e ela, àquele ponto, já estava agradecendo aos céus por estar quase no fim das apresentações.
Era divertido ver os calouros alternando entre ridiculamente tímidos a ponto de engasgar na hora de responder a última pergunta e desinibidos o bastante para participar da brincadeira, mas também era cansativo, não negaria isso.
— Laura, dezoito, solteira, biologia. Qualquer uma que me faça gozar — a menina de pé em cima da cadeira respondeu dando de ombros, um sorriso descontraído solto em seus lábios, recebendo uivos e palmas como resposta. Pedro cruzou os braços em frente ao peito, ouvindo interessado.
Não era a primeira e nem seria a última garota a chegar ali e se comportar como se tivesse o mundo na palma da mão, com respostas engraçadinhas e um tom provocativo. Não foi sequer a primeira naquele dia, mas Pedro continuava olhando para ela como se estivesse na fila do açougue, decidindo se levaria aquele pedaço de charque para casa ou não. Helena continuou olhando para a garota com um sorriso nos lábios — apesar de sua mente estar gritando puta ao fundo — e deu prosseguimento à entrevista informal.
Laura desceu da cadeira e caminhou aos pulos até alcançar um grupo de outras três meninas em um canto, sorridente. Pedro viu quando uma das garotas apontou em sua direção. Talvez devesse ter tentado disfarçar, mas não se deu ao trabalho, apenas continuou fitando-a, descaradamente, e, quando Laura olhou em sua direção, deixou um sorriso lentamente crescer em seu rosto. Ela sustentou o olhar no seu por alguns segundos, a boca entreaberta, e a mente de Pedro começou a dar cambalhotas com a explosão de ideias que o atingiram ao olhar para seus lábios. Até que Laura olhou de volta para a menina que o havia apontado e deu de ombros, imediatamente mergulhando em uma conversa entretida sobre um assunto qualquer e esquecendo — ou simplesmente ignorando — a existência dele.
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Obsidiana Fraturada
Ficção GeralObsessão. É difícil saber de onde vem, como começa, e em um ponto da história é difícil até de lembrar qual a causa inicial. Algumas pessoas têm um magnetismo próprio, alguma coisa que marca sua alma e faz com que automaticamente se tornem cent...