12 de abril
Era como se o fim do mundo estivesse acontecendo dentro de seu peito. À medida que Luís processava as palavras ditas, seu coração foi se partindo em pedaços ridiculamente pequenos. A dor era real, pulsante, invadia seus músculos, seus ossos, sua alma. Ficou paralisado, estático, encarando incredulamente o homem parado à sua frente que virara de costas para ele, apoiando a mão direita na parede, o punho fechado, a cabeça baixa. Uma infinidade de pensamentos assolou sua mente, indo e vindo mais rápido do que era capaz de processar. O único que ficou foi: o que estaria passando pela cabeça de Vicente naquele momento?
Luís não tinha ideia, mas sabia o que estava passando na sua. Cada momento dos dois passou como flashes, fotografias e filmagens em sua mente confusa e perturbada. Lembrou das férias, dos bares, das conversas, risadas e discussões. Lembrou dos dias de praia e dos dias de chuva. Das noites que viraram trabalhando arduamente na montagem do projeto da faculdade, cada detalhe sendo pensado com precisão. Lembrou dos livros trocados, dos filmes discutidos, dos museus visitados. Enquanto encontrava com Pedro e Jorge apenas na faculdade e nos bares e chopadas, Vicente havia se tornado parte fundamental da sua vida, uma amizade que cresceu forte ao longo dos anos. Frequentavam festas de família uns do outro, saíam com amigos da época de escola. Viviam juntos. Como irmãos, havia ouvido muitas vezes, e essa constatação deu um nó em seu estômago. O sentimento que nutria por aquele par de olhos cor do céu não era fraterno e ele não tinha certeza que algum dia havia sido. O que achou ser uma amizade, agora ele percebia, era um amor crescendo em fogo brando, sendo alimentado por companheirismo e confiança. E ali, olhando para o homem que ocupava grande parte do espaço livre do seu quarto e tomava todo o oxigênio restante do ambiente, se perguntou se eram esses seus pensamentos também. Se estava questionando cada momento que tiveram juntos. Se estava colocando sua amizade em dúvida. Se estava com medo de que pensassem que eles eram um casal. Se o odiava.
Seus pensamentos foram interrompidos quando Vicente lentamente se virou, os olhos baixos tornando sua feição impossível de ser lida. Com duas passadas, alcançou a cama onde Luís estava, sentando-se de frente a ele e então, finalmente, ergueu o olhar em sua direção. O par de olhos azuis estava preenchido por dor e Luís perdeu o ar. Perdeu o ar e o controle da confusão que se fazia dentro de si, o nó na garganta arranhando a fala, forçando por seu rosto as lágrimas até então presas no fundo de seus olhos castanhos. Dor e medo era tudo que conseguia sentir naquele momento.
— A minha vontade é gritar com você e te chacoalhar — Vicente começou a falar em um tom de voz contido e Luís cerrou os dentes, olhando para baixo. — Porque simplesmente não me entra na cabeça como você pode ter tentado me afastar de você e jogar nossa amizade no lixo por isso. Porque me dói o quão pouca confiança você tem em mim — concluiu e Luís levantou a cabeça em um salto, os olhos confusos procurando por uma explicação do que havia acabado de ouvir.
Vicente fechou os olhos por um segundo apenas e voltou a encará-lo.
— Mas isso não é sobre mim, é sobre você, então eu vou deixar essa parte pra depois. — Ele suspirou. — Eu sinto muito. Eu sinto muito que isso tenha te feito sofrer tanto nesses últimos meses, que esteja te fazendo sofrer agora. Sinto muito que você tenha medo. Gostaria de poder te dizer que não existe motivo nenhum pra temer, que a vida é sua e você tem o direito de fazer o que bem entender e ninguém tem nada a ver com isso mas... Bom. — Ele engoliu seco e Luís finalmente entendeu.
Como ele pôde esquecer? Como uma informação tão fundamental escapou por sua memória? Matheus era seu nome, e ele conhecia aquela história de cor, não somente porque o amigo havia lhe contado, mas porque lembrava das notícias. Matheus havia saído para jantar com o namorado, foram comemorar a promoção que ele havia recebido no trabalho. Saíam do restaurante, tarde da noite em uma vizinhança agradável e relativamente segura. Estavam de mãos dadas, sorridentes, exalando orgulho e felicidade. O restaurante era a apenas algumas ruas de distância da casa dele e resolveram ir à uma boate depois.
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Obsidiana Fraturada
Fiksi UmumObsessão. É difícil saber de onde vem, como começa, e em um ponto da história é difícil até de lembrar qual a causa inicial. Algumas pessoas têm um magnetismo próprio, alguma coisa que marca sua alma e faz com que automaticamente se tornem cent...