- Capítulo 2 -

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Eu olhei para trás e vi os dois nos seguindo, como já estávamos meio afastados eles estavam quase correndo. Peguei na mão da minha irmã e comecei a correr junto com ela e papai. Olhei para trás de novo e eles estavam a dois metros de nós. Soltei a mão da Marina quando senti algo no meu braço e cai no chão. Foi alguma coisa que me deu um choque.
- Vai! Corre! - gritei para Marina e papai enquanto apertava o braço machucado.
De repente percebi que a mão que me segurava me largou e a pessoa deu um urro. Eu não entendi nada. Não era papai. Não era Marina.
Aproveitei a oportunidade e saí correndo, dando um tapa de leve nas costas de Marina e do meu pai para eles saírem do estado de choque e voltamos a correr ainda mais rápido, então ouvi um barulho de tiro.
Senti pontadas no braço, que foram se tornando uma dor muito mais forte. Parecia que unhas estavam rasgando minha pele até a carne. Caí no chão de joelhos, gritando de dor com a mão ensangüentada em cima do braço. Mari chegou perto e tentou me ajudar a levantar, então Nichol deu um soco no seu braço e prendeu minhas pernas e braços com cordas apertadas, que eu não sei de onde saíram. Ele começou a me puxar pelos pulsos e a chutar minhas costas.
Eu não estava aguentando mais, com certeza iria desmaiar.
- Vão! Me deixem! Se salvem! - disse em um sussurro quase inaudível.
Mari começou a se afastar com a mão na boca, chorando muito. Minha visão tinha começado a ficar turva e escurecida, nessa hora também escorriam lágrimas dos meus olhos.
Apesar de tudo consegui ouvir papai dizer:
- De jeito nenhum. Não vou perder você também.
De repente ele fez uma coisa que eu jamais pense que ele faria. Deu um soco no estômago de Nichol e Cassemeck, fez um movimento torcendo o braço de Nichol, que resistira em ficar de pé, o que o fez cair gritando de dor. Então ele me pegou no colo e a última coisa que ouvi antes de apagar foi:
- Vai ficar tudo bem.

{}{}{}

Save me, save me and you go to be free. Your life go to be hold on mine unless you save me.
Uma voz não parava de repetir em um ritmo estranho. Algo estava me empurrando. Eu estava em cima de um prédio. Papai e Mari estavam me segurando, mas não estava adiantando. Comecei a cair de cima do prédio com as mãos esticasas, estranhamente, eu não gritava.
Quando senti o baque no chão, não chorei, nao gritei, não fiz nada. Fiquei lá, sentada. Um homem de preto começou a se aproximar. Não consegui decifrar seu rosto. Ele pegou meu braço e o torceu, então eu gritei.
Ele pegou o outro, fez a mesma coisa, pegou meus pés e começou a me arrastar por eles.
- Pare - ouvi uma voz serena dizer. Eu conhecia essa voz.
O homem me soltou instantaneamente e sumiu tão rápido quanto. A mulher dona da voz apareceu na minha frente. Era mamãe.
Estava cheia de marcas roxas e feridas pelo corpo. Ela se sentou ao meu lado e me abraçou.
- Vai ficar tudo bem - sussurrou.
Não sei quanto tempo havia se passado. Talvez segundos, talvez minutos, talvez horas, até. Senti seu peso ficar maior em cima de mim. Me desencostei dela e ela não se moveu, não abriu os olhos. Levei a mão ao seu pescoço.

- Nina! Nina, acorde! - uma voz disse, mas a ignorei.

- Mamãe. Mamãe, por favor. Eu te amo. Mamãe, volta! - gritei.

- Melina! Você tem que acordar! - a mesma voz que eu havia ignorado disse, dando tapinhas de leve no meu rosto.


Abri os olhos e um clarão branco me fez os fechar de novo. Então senti uma pontada no braço e levei a mão instintivamente a ele, me sentando.
Estranhei o lugar que eu estava. Era um quarto, mas um quarto bonito. As paredes eram brancas, em uma parede havia uma porta de vidro com uma cortina azul claro. Havia duas camas, separadas por um tapete e por uma mesinha de cabeceira de vidro também. Em frente às duas camas havia uma televisão grande, ao lado da televisão tinha uma porta com o batente entalhado em algo brilhante.
Do outro lado da cama em que eu estava, tinha um guarda-roupas azul claro grande, e do outro lado da parede que ele estava, percebi que era um banheiro.
Era tudo realmente chique. Aquele devia ser o "quarto de empregados", já que era um pouco... elaborado demais para tal finalidade.
A pessoa na minha frente era Marina. Quando a olhei, ela levantou da cama e abriu a porta perto da TV.
- Papai! Ela acordou! - gritou.
O que era aqulio? Um outro quarto embutido?
Ele apareceu na porta com a mão na boca, parecia surpreso. Papai chegou mais perto para me abraçar, e quando fez isso, soltei um gemido baixo por causa da dor.
- Me desculpe, Nina.
- Não tem problema. Mas eu tenho perguntas.
Mari se sentou na "minha" cama.
- Diga.
- Primeiro, que raios de quarto é esse?
- É a casa de empregados do orfanato.
- Que? Isso é uma casa?
- Sim. Cada empregado tem a sua. Há alguns dias, atrás o proprietário deixou a gente passar um tempo aqui, devido a sua condição, até ter um empregado para ocupá-la.
Papai só assentiu.
- Espera. "Há uns dias atrás"? Quanto tempo eu dormi?
- Digamos que uma semana.
- Meu Deus. Como assim? Por que? Como eu acordei?
- Bom, você dormiu tanto tempo assim por causa dos analgésicos que as enfermeiras te deram. Só para esclarecer: você levou um tiro. As enfermeiras daqui não conseguiram tirar a bala do seu braço, porque elas são só enfermeiras, não médicas. Elas só deram uns pontos. Ou seja, você está com uma bala dentro do seu braço. E eu te acordei porque você estava chorando. Não sei o que aconteceu - do tiro eu já sabia, havia anos que eu não chorava a não ser por pesadelos. Pensei que morreria. Que nunca mais veria papai, Marina ou Júlia.
Olhei para eles dois. Não queria tirar o sorriso do rosto deles.
- Pesadelo - respondi.
O sorriso saiu de seus rostos na mesma hora, mas logo disfarçaram, fingindo tossir ou coçar o nariz.
- Tem alguém querendo te ver aqui faz um bom tempo - papai disse.
Eu me levantei da cama na hora, e percebi que estava com outra roupa.
Uma leggin preta e uma camiseta larga, que caia de um ombro. Ignorei a dor lascinante no braço e fui direto para a porta. Ela dava para outro quarto, provavelmente o de papai, e era bem parecido com o nosso. Nele tinha outra porta, que deu para uma pequena sala de estar: ela tinha um tapete branco, um sofá marrom ao centro, um raque da mesma cor com uma televisão e uma mesinha entre o sofá e a TV. Além de uma cozinha logo ao lado.
No sofá estava uma ruiva. Me sentei no sofá e ela olhou para mim. Era Júlia.
- Meu Deus, Melina! Que susto! Pensei que você tinha morrido - disse ela me abraçando.
- Isso é o de menos. Você ficou ruiva, como assim?
- Ah, isso. Eu só quis dar uma mudada. Ficou ruim?
- Ficou maravilhoso - disse com sinceridade
Ela me deu um abraço e começamos a andar pela casa até chegarmos no quarto em que eu estava antes. Marina estava usando um vestido azul justo com um decote e uma bolsa preta.
- Nina, eu vou dar uma volta. Por que a Júlia não passa a noite aqui? - ela disse olhando para nós - Aliás, tem umas roupas bem legais no armário.
- Hm, ok. Se não tiver problemas - ela disse olhando para mim.
- Imagina, Ju. Vai ser até melhor eu não ficar sozinha, mas dona Marina, aonde a senhorita pensa que vai com essa roupa?
- Aí, Nina. Me deixa. Vou curtir um pouco com os meus amigos.
- Sei.
- Afe, estou indo. Tchau! - saiu e bateu a porta.
Eu e Júlia morremos de rir, Marina era sempre assim. Que nem cachorro, saía, se metia em briga e encrenca mas sempre voltava para casa. Então eu tive uma ideia. Comecei a abrir o armário até achar o que queria. Aventais. Joguei um para ela.
- Vamos fazer uma torta - disse.
Júlia bateu palminhas e fomos para a cozinha. Chegando lá ela se sentou na bancada de mármore e eu peguei um bowl para fazer a massa.
- Me conte sobre o baile - pedi enquanto colocava a manteiga para derreter.
- Bom... O Cameron foi me buscar umas duas horas depois que você saiu. Ele me levou para o baile e me deixou SOZINHA no meio daquele mar de gente, tinha uns caras muito... muito estranhos. No meio da festa eu fui procurar ele, e... ele tava se agarrando com uma piranha. Eu saí correndo e topei com o Ray - Ray era seu melhor amigo - ele me segurou e me fez falar porque eu estava daquele jeito, depois nós dançamos e... ficamos juntos.
- Ai. Meu. Deus! - eu comecei a pular e acabei jogando um pouco de farinha da forma que eu estava passando nela.
Ela fez a maior cara de indignação de todas e pegou um punhado de farinha e tacou na minha cara. Revidei jogando mais no seu cabelo e Júlia fez a mesma coisa. Do nada papai apareceu na cozinha. O chão já estava todo sujo, assim como a bancada. Ele só olhou para nós e colocou a não na cintura, pedindo explicação.
- É... a gente estava fazendo uma torta - falei com cara de inocente.
Coloquei a forma já com a massa e o recheio no forno e saímos correndo.
Chegamos no quarto e Júlia disse:
- Nina, você tem uma garrafa aqui?
- Acho que sim, mas por quê?
- Me dá e você vai ver.
- Tá, né.
Fui ao banheiro e vi que havia um frasco de shampoo vazio. Peguei-o e dei para Júlia. Ela se sentou no chão e pediu para eu fazer o mesmo.
- É o jogo da verdade - disse colocando o frasco ao centro. - Vamos girar a garrafa e para o lado que a tampa cair, a pessoa vai ter que responder uma pergunta da outra. Ok?
- Não sei se é uma boa ideia, mas tudo bem.
Júlia girou a garrafa e caiu apontando para ela mesma. Era minha vez de perguntar. Resolvi começar de leve.
- Júlia, você está gostando do Ray?
Ela ficou da cor do seu cabelo, e eu já soube a resposta antes de responder.
- Sim.
- Eu sabia! - girei a garrafa e caiu apontando para mim.
- Melina, Melina. Você preencheu o formulário da Seleção?
Ela estava entrando em uma zona complicada.
- Sim.
- E você está animada?
- Era só uma pergunta lembra? - perguntei com a mão na garrafa.
Ela colocou a mão no meu braço para me parar.
- Ah, por favor, Nina. Eu não posso participar e estou muito ansiosa por você.
- Tá... Ok. Eu não sei o que pensar, na verdade. Uma parte de mim quer muito ir só para estudar, sei que tem uma biblioteca enorme lá, mas a outra tem medo de ir e acabar iludida. Acho que estou... não sei nem o que estou - omiti o fato de eu querer descobrir mais sobre os caras que me deram o tiro, porque por enquanto, era melhor ninguém mais saber.
- Isso é normal, Nina. É uma coisa nova, e você não é a maior fã de coisas novas.
- É, acho que sim. Mas nós estamos sendo muito precipitadas, sabia? Eu nem vou ser escolhida. Vou continuar nessa vida, com sorte, conseguirei um emprego e com certeza não vou conhecer ninguém e me apaixonar perdidamente. Viu? fácil - disse com um certo nervosismo.
- Qualquer coisa é considerada impossível até que aconteça.

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