Lagarta à portuguesa

22 7 1
                                    



Já conhece a competição que é entusiasticamente praticada entre refeitórios de escolas de Lisboa e de Braga? Eu também não. A única coisa que sei é que foram divulgadas na televisão amostras primitivas de almoços para os putos, nomeadamente perninhas de lagarta mal passadas. E como se não bastasse a provocação para me abrir o apetite, até o vídeo de um frango a rastejar numa folha de alface partilharam.

Mas bem, vamos falar do que interessa. Tudo isto surgiu quando uma aluna da Escola Básica 2/3 André Soares, gravou o vídeo de uma lagarta a rastejar (assim é que está correto) no prato e pô-lo no Facebook. Como se não bastasse o sucedido, segundo medidas regulamentais foi-lhe aplicado um processo disciplinar porque, aparentemente, não gostou da brincadeira da minhoca no prato. Não por não se ter recusado a comê-la, mas por ter partilhado o vídeo, que se tornou, efetivamente viral na escola e na televisão nacional.

Em seguida, a encarregada de educação da aluna foi informada acerca do processo que lhe passaram. Justificaram-no dizendo que era contra o regulamento, sem primeiro se certificarem que a rapariga não estava a fazer algum trabalho para promover refeições dignas de serem comidas. 

Estou a brincar, não seja ingénuo, a aluna tinha antes ficado desiludida com a dimensão da amostra da larva de phyllocnistisa, por ser demasiado pequenina. Pelo que pediu um outro prato, na esperança de lhe calhar uma maior espécie no próximo e, assim, ser mais fácil de observar a olho nu. Eram fundamentais as características para o trabalho da aula que era já já a seguir.

No entanto, sinto-me a perder a razão ao ler descrição do vídeo, que aponta para o descontentamento do conteúdo alimentar. Ora dê uma vista de olhos comigo: "Só quero deixar aqui uma das coisas que se encontra na cantina da escola André Soares em Braga, só gostava que isto chegasse a imensas pessoas para verem o que 'nós' comemos na cantina da escola!"

É provável que até me tenha passado ao lado, distraidamente ou não, a razão de descontentamento da aluna. Jurei ouvir vezes sem conta escolas a dizerem que "a comida que os nossos alunos comem é sempre da melhor".

Por outro lado, um caso semelhante sucedeu na Escola EB 2/3 Noronha Feio, em Oeiras.
A associação de pais dessa mesma escola diz-nos "(...)foi, há pouco tempo, alvo de uma situação absolutamente inaceitável e escandalosa, quando foi servida uma refeição aos alunos constituída por frango com arroz, encontrando-se o frango efetivamente cru".

Todavia e extremamente intrigante, é nunca se ter falado em processos disciplinares quando houve a divulgação destas pernas de frango efetivamente cruas. Talvez o pessoal da direção das escolas não ande a ver os telejornais. Se andassem a ver, tenho a certeza que já tinham posto um processo na imprensa portuguesa, para camuflar a baixa auto-estima que atinge, cada vez mais, as cantinas das escolas do país.

Em conclusão, há um lado positivo na presença da lagarta no prato. É importante não esquecer que, se não fosse a lagarta, o conteúdo energético da refeição era mais pobre. Logo, se há coisa de que a menina não se pode queixar, é da falta e da diversidade de alimento naquele micro ecossistema feito de loiça.

Mistifórios do Hoje: Uma Sova de 2017Onde histórias criam vida. Descubra agora