CAPÍTULO 12

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Clóvis entrou em casa contrariado. Estava em uma situação difícil é precisava encontrar solução. Sua família não podia saber! Ele perdera a cabeça. Estava apaixonado por Estela. A atração dos primeiros tempos se transformara em amor.
A princípio, ela mostrara-se indiferente e distante. Acabara de sofre uma desilusão amorosa. Rompera um namoro de mais de um ano. A traição que sofrera ainda doía, e seu orgulho estava ferido. Fora seu primeiro namorado. Apaixonara-se por ele com a força do primeiro amor.  Desiludira-se com a leviandade dele. Havia sofrido e não estava disposta a sofrer de novo.
Clóvis, estimulado pela resistência dela, tudo fez para envolvê-la, mostrando-se ardente e impetuoso. Aos poucos, Estela começou a sentir-se atraída por ele, acabou descobrindo novas emoções em seus beijos e apaixonou-se também.
Quando estavam juntos, deixavam-se dominar pela emoção e aconteceu o inevitável. Agora, apesar dos cuidados que haviam tomado, ela estava grávida. Ela o chamara para juntos encontrarem uma solução, porém, eles não sabiam o que fazer.
Ela estava apavorada. Seu pai, advogado, era rigoroso quanto à educação das duas filhas. Sua mulher, Nora, acompanhava-as por toda parte, e elas não tinham perdição para saírem só. Seria difícil explicar-lhes como acontecera, o que ela fazia, fingindo ir dormir cedo e escapando às escondidas para encontrar-se com ele.
Estela desejava livrar-se daquela gravidez de qualquer jeito. Porém, ficava caro, e ela não tinha como arranjar o dinheiro. Além do mais, sentia muito medo.
Ouvindo-a, Clóvis sentia-se desesperado. Ele gostaria de poder casar-se com ela. Afinal, eles se amavam. Contudo, estava no segundo ano da faculdade e não tinha nenhuma renda a não ser a mesada do pai, quase sempre insuficiente para suas despesas pessoas. Temia abrir-se com o pai, que sabia ser intransigente e formal. Não o deixaria casar-se antes de terminar os estudos. Era o que ele sempre dizia. Casamento para ele só quando ganhasse o suficiente para manter uma família. Esse dia estava muito distante.
Os pais, sentados na sala, conversavam animadamente, e Clóvis procurou subir ao seu quarto sem ser visto. Estava em um beco sem saída. Ele também tinha medo de um aborto, contudo seria uma boa solução. Reconhecia que eles não tinham outro caminho.
- Vou arrumar dinheiro emprestado, - pensou, entendendo-se no leito. - Amanhã darei um jeito. Ninguém pode saber o que nos aconteceu.
Sentia muito medo de que os outros soubessem. Pensaria mal de Estela e dele.
Apesar de haver decidido isso, Clóvis não conseguia dormir nem pensar em outra coisa. Remexia-se no leito e maldizer o fato de ser jovem e não poder assumir o compromisso de casamento.
Era muito tarde quando, cansado, finalmente conseguiu adormecer. Levantou-se cedo no outro dia, o que surpreendeu Norma, vendo-o à mesa no café da manhã. 
- O que foi está doente? - indagou ela.
- Nao - apressou-se a dizer ele, tentando dissimular a preocupação.
O pai já havia saído, e Juliana tomava calmamente seu café. Norma sentou-se à mesa com eles, servindo-se por sua vez.
- É bom ver a família reunida - disse satisfeita. - Só falta a Vera. Sinto saudades dela.
-Por falar em Vera, meu amigo viu o Marcelinho com uma loura. Acho que ele está facilitando. Se a Vera descobre, com aquele gênio, ele vai se dar mal.
Norma levantou-se indignada.
- O que é isso! Não seja malicioso. Com certeza era alguma conhecida. Que maldade! Espero que não leve essa história aos ouvidos de sua irmã.
Clóvis deu de ombros.
- Eu, não. O marido é dela, não tenho nada com isso. Mas que ele é chegado à uma aventura, isso é.
- Não seja inconveniente. Não repita isso. Só você mesmo, sempre tão irreverente e sem medir o que diz. Logo ele, tão distinto e de família tão ilustre.
Clóvis riu irônico.
- Isso não quer dizer nada. Ele é um homem como qualquer outro. As tentações são muitos por aí.
- Quem tem boa moral não se deixa envolver pelas tentações, disse Norma.
Clóvis falara pensando em si mesmo e em seus problemas, por isso, considerou:
- Tenho um amigo na faculdade que está em sérias dificuldades. Está namorando uma moça, e ela ficou grávida.
Norma fez um gesto contrariado.
- Esse não é um assunto para se tratar à mesa do café, diante de sua irmã.
- O que é que tem? Juliana está cansada de saber essas coisas.
- Não é de bom-tom.
Clóvis ignorou e prosseguiu:
- Ele gostaria de casar-se com ela, é moça de boa família. Mas acha que seus pais não consentiriam. Ele está no segundo ano, comigo. Falta muito para formar-se e poder sustentar uma família.
Norma respirou fundo e, apesar de contrariada, respondeu:
- Estão muitos certos. Depois, essa moça, se entregou a ele com tanta facilidade é porque não tem boa moral. Onde já se viu? Se ele casar com ela, pode vir a arrepender-se.
- Mãe, ela é uma boa moça, de família muito conceituada.
Norma abanou a cabeça:
- Eu não acho. Moça boa e honesta só se entrega com o casamento.
Juliana continuava calmamente tomando seu café com leite, parecendo nem ouvir o que eles diziam.
- Mãe, às vezes, as coisas acontecem sem premeditação. Sabe como é, o amor, a proximidade...
- Não creio - disse ela, lançando um furtivo olhar para Juliana. Precisava diante da filha ensinar o certo. Não podia facilitar. - Seja qual for a situação, a mulher sempre pode reagir, preservar-se.
Clóvis passou a mão pelos cabelos impaciente. Sua mãe jamais poderia entender. O que diria seu pai? Seria mil vezes pior. Se não arranjasse o dinheiro, ele estaria perdido.
Não disse nada mais. Terminou o café e voltou para o quarto, tentando encontrar uma saída. Como arranjar o dinheiro? Seus amigos não tinham para emprestar-lhe. Quem poderia fazê-lo?
Vera deu os últimos retoques nos cabelos, apanhou a bolsa e desceu. A Nice passaria dentro de alguns minutos para apanhá-la. Iam ao "dentista" mais uma vez. Olhou o relógio, indo sentar-se na sala. Laura estava no escritório, como de hábito e não iria incomodá-la. Ela sabia que era dia de acompanhar Nice. Ouvindo a campainha soar, Vera apanhou a bolsa e saiu. Sabia que a amiga havia chagado.
Uma vez no carro, depois dos cumprimentos, Vera disse com entusiasmo:
- Onde vamos hoje?
- Há uma fita muito boa no Rosário, com Clark Gable.
Vera bateu palmas e sorriu:
- Adoro Clark Gable!
- Vamos à sessão das duas e depois ir às compras. Preciso encontrar um par de sapatos para a festa de sábado.
- Bem que eu gostaria de ir! Há tanto tempo não vou a uma festa!
- É uma pena. Quanto tempo ainda D. Laura vai guardar luto fechado?
- Ela disse que precisa completar um ano! Uma eternidade. Não aguento mais.
- Que horror! D. Laura é muito antiquada. Ninguém mais faz isso.
- Ninguém a convence do contrário. Se eu não estivesse saindo com você, não agüentaria focar naquela casa. Tudo é tão triste! Fico contando as horas para poder respirar um pouco,  ver outras coisas, sair de lá.
- O tempo passa, Vera, logo tudo voltará a ser como antes. Esse luto vai acabar um dia.
Vera suspirou.
- Sei disso, contudo, sinto que nada mais será como antes. As coisas estão tão diferentes!
Elas continuaram conversando animadamente. Foram ao cinema e na saída Nice fez algumas compras, tomaram lanche e finalmente apanharam o carro para voltar.
- Antes de levá-la, vou passar em casa de uma amiga para deixar uma carta. Mandaram para minha casa por engano. Não é longe e não perderemos mais de quinze minutos. Incomoda-se?
- Absolutamente. Ao contrário. Retardar a hora de voltar para casa é um prazer.
Seguiram para um bairro residencial e Vera, deliciada, observava as magníficas casas recém-construídas, as avenidas arborizadas e os jardins bem cuidados. Ao passarem por um carro parado sob uma árvore, Vera empalideceu. Reconheceu o carro de Marcelinho. Dentro dele, um casal beijava-se apaixonadamente.
Vera segurou o braço da amiga com força, dizendo:
- Dê a volta, por favor. Quero ver bem
Era Marcelinho com uma loura. Vamos voltar.
Nice tentou dissimular:
- Você se enganou. O carro é parecido.
- Por favor. Faça o que estou pedindo.
Nice, preocupada, deu a volta no quarteirão.
- Vá devagar. Quero ver direito!
Nice obedeceu.
O casal estava tão entretido que nem um dos dois percebeu o carro delas passando devagar. Era ele mesmo.
Vera sentiu crescer a indignação. Então era assim que ele passava os dias, enquanto sua mãe tentava trabalhar e manter os negócios da família!
- Parece o carro aí na frente - disse com raiva.
- Vera, vamos embora. Acalme-se. Depois você fala com ele. Está muito nervosa.
- Parece o carro. Se eu não gritar a raiva, vou explodir. Pare, por favor.
Preocupada, Nice obedeceu. Vera desceu rapidamente, foi até o carro do marido e, num gesto decidido, abriu a porta do lado da moça dizendo com voz que a raiva abafava:
-Desça daí, sua sem-vergonha. Preciso falar com meu marido!
Os dois, assustado, afastaram-se imediatamente e surpreendidos não sabiam o que dizer. Marcelinho, pálido, olhos arregalados, parecia estar vendo um fantasma.
Vera puxou o braço da moça, dizendo colérica:
- Saía daí, já disse. Vá para casa. Tenho uma conversa com esse sem-vergonha.
Ela, interdita, olhava ora para um, ora para outro, sem saber como proceder. Claro que ela sabia que ele era casado. Ele nunca escondera isso. Mas ser apanhada assim, era muito desagradável.
Marcelinho, recuperando um pouco o sangue frio, tentou contornar a situação.
- Acalme-se, Vera. Não adianta fazer cena agora. Vamos conversar como pessoas civilizadas.
- Eu não sou civilizada. Sou uma mulher que ficava em casa o tempo todo cumprindo o papel de esposa, enquanto o marido circulava pela cidade com mulheres desclassificadas.
- Não lhe dou o direito de me ofender - disse a loura por fim. - Se você fosse boa, saberia prender o marido. Não tenho culpa se eu sou mais atraente do que você.
Vera aplicou-lhe uma tremenda bofetada. A outra tentou revidar, e Marcelinho, mais refeito, saiu do carro tentando puxar Vera para fora.
- Você está procedendo como uma mulher vulgar - disse com raiva. - Jamais pensei que chegasse a tanto.
Segurou-a com força, puxou-a para fora e fechou a porta do carro, impedindo-a de abri-la de novo. Nice aproximara-se tentando socorrer a amiga.
- Leve-a daqui antes que eu perca a paciência - disse Marcelinho dirigindo-se a Nice.
Descontrolada, Vera chorava de raiva e de vergonha. A amiga abraçou-a penalizada. A atitude de Marcelinho era injusta e deprimente.
Sem uma palavra, ele entrou no carro de novo e, ligando o motor, saiu rapidamente.
Ainda na calçada, abraçando a amiga, Nice tentava consolá-la.
- Não chore, Vera. Tente acalmar-se. Não adianta machucar-se dessa forma. Não vale a pena, você pode ficar doente.ey
- Você viu? Ele me deixou aqui, foi a favor dela, contra mim. Mostrou claramente que não tem nenhuma consideração. O que posso esperar depois disso? Não dá mais para suportar. Tenho que tomar uma decisão. Não quero mais saber dele. Nunca mais.
- Vamos para o carro. Venha. Tente se acalmar.
Sentadas dentro do carro. Vera chorou sentidamente. Era o fim das suas ilusões. O sonho de amor havia terminado. Marcelinho era falso e sem moral.
Nice tentou confortá-la. Deixou-a desabafar, ouviu-a pacientemente. Quando a viu mais calma, sugeriu:
- Vamos. Agora chega. Não vale a pena atormentar-se. Enxugue os olhos e dê um jeito no cabelo.
- Devo estar horrível.
- Não. Está abatida e pálida. Vamos melhorar essa aparência. Seja o que for que nos aconteça, sempre nos a sentiremos melhor se estivermos devidamente arrumadas.
Vera suspirou.
- Tem razão.
Olhou-se no espelho e considerou:
- Sou jovem e bonita. Não será por causa daquele patife que vou envelhecer, criar rugas e chorar. Nunca mais derramei uma lágrima por causa daquele sem-vergonha. Acabou.
- Assim é que se fala. O mundo não acabou por causa disso. Você é moça e pode refazer sua vida.
- Não com ele. Isso eu garanto.
- O que quer fazer agora? Vamos para casa?
- Sim. Vou para casa de D. Laura. Laura. Lá nunca foi minha casa. Vou apanhar meu filho, nossas coisas, e vou embora para casa de minha mãe. Depois do que aconteceu, eles não vão se recusar a me receber.
Nice balançou a cabeça.
- Não se precipite. Uma separação é questão delicada. Você e seu filho podem ser prejudicados financeiramente. Não será melhor esperar, conversar com Marcelinho, com seus pais, decidir tudo com calma?
- Depois do que houve, não tem o que conversar. Não posso ficar mais naquela casa.
- Fale com D. Laura. Ela pode chamar a atenção do filho.
- Ela sempre vai do lado dele. Acha que homem pode tudo. Nunca ficará do meu lado.
- Por que não procura seu pai, conversa com ele antes de tomar uma atitude dessas?
- Meu pai é um homem correto. Vai ficar do meu lado certamente. - Então. Vamos até o seu consultório. Você fala com ele, aconselha-se. É melhor.
- Você acha?
- Claro. O Dr. Dagoberto é muito consciencioso e além do mais é muito bom pai, a estima de verdade.
- É. Acho que está certo. Vamos até lá. Assim, com ele do meu lado, tudo será mãos fácil.
Uma vez no consultório de Dagoberto, tiveram que esperar o cliente sair da sala. Felizmente era o último e puderam entrar em seguida. Vendo-as, Dagoberto levantou-se surpreendido.
- Vera, querida, que surpresa! - Notando os olhos vermelhos de chorar e o rosto conturbado, perguntou:
- Aconteceu alguma coisa?
Ela atirou-se nos braços dele, dizendo comovida:
- Pai, preciso de ajuda!
- Você me assusta. O que há?
- Acabei de encontrar Marcelinho aos beijos com uma loura.
Dagoberto, abraçado à filha, não soube o que responder. A surpresa o emudeceu. Olhou para Nice como que procurando esclarecimentos.
- É verdade, Dr. Dagoberto. Foi muito desagradável. Houve uma cena muito penosa para Vera.
- Sente-se, minha filha. Acalme-se. Você também, Nice. Sente-se aqui e vamos conversar.
Era uma situação muito embaraçosa para ele. Não gostaria de intrometer-se na vida do casal, mas ao mesmo tempo, o rosto abatido de Vera o confrangia.
- Conte-me tudo. Como foi?
Vera abriu-se com o pai. Falou que Marcelinho não ligava mais para ela, não saíam mais juntos, que era muito dependente da mãe; só omitiu as mentiras que pregava neles para poder sair. Finalmente descreveu o que acontecera, finalizando:
- Pai, eu não posso mais viver com ele depois disso. Desejo me separar. Nosso casamento acabou. Quero voltar para casa com o meu filho, se você me aceitar. Preciso muito da sua proteção.
Dagoberto coçou a cabeça desgostoso. Eles eram muitos jovens. Os jovens são impulsivos. Um casamento não acaba assim, principalmente quando havia um filho para criar, que sofreria com a separação. Tentou contemporizar:
- Claro, filha. Você sempre poderá contar com minha proteção. Contudo, reflita mais um pouco. Seu marido pode estar iludido, era muito apegado ao pai. Está desorientado. Vai arrepender-se do que fez. Tenho a certeza de que isso é o que vai acontecer. Um grande amor não acaba assim. Ele a ama como sempre. Foi uma tentação e vai passar. Vai lhe pedir perdão e tudo voltará a ser como antes. Vocês têm tudo para serem felizes. Depois há Martin. Ele não pode sofrer pela leviandade dos pais. Ele precisa ser preservado.
- Martin nada sofrerá por isso. Ele nem liga para o filho.
- Isso não pode ser resolvido precipitadamente. Vá para casa, fique no seu posto. Lá é seu lugar.
- Não posso, pai. É demais para mim.
- Faça esse sacrifício pelo seu filho.
- Será inútil. As coisas não vão mudar.  Para casa, eu só volto para pegar Martin. Não ficarei lá nem mais uma noite.
- Você está muito nervosa. Precisa acalmar-se também. Vai tomar um calmante e ir para casa.
- Só se você for comigo e falar com eles.
Dagoberto respirou fundo. Mesmo contrariado, sentiu que precisava ir à fim de evitar uma tragédia. A separação deveria ser evitada a qualquer preço.
- Está bem disse. - Vamos até lá.
- Nesse caso, eu vou indo, - disse Nice.
Abraçou a amiga, despediu-se de Dagoberto e saiu. Abraçando à filha, ele tentou fazê-la ingerir um calmante que ela tomou contrariada.
- Vamos embora - disse. - Quanto mais depressa resolvemos esse assunto, melhor.
- Vamos nos sentar mais um pouco até que você se acalme. Não podemos tratar desse assunto tão sério assim, sem refletir.
Vera suspirou:
- Estamos perdendo tempo. Jamais esquecerei o que aconteceu. Quanto mais eu penso, mais nervosa fico. Pai, não percebe que meu casamento acabou? O que aconteceu hoje só fez confirmar o que eu já pressentia. Marcelinho mudou. Não gosta mais de mim.
Dagoberto passou o braço pelos ombros da filha tentando confortá-la.
- Vera, o homem age diferente da mulher. Para você, o que aconteceu pode parecer falta de amor, no entanto, para ele, pode significar apenas uma aventura passageira, uma tentação ocasional, já fuga das preocupações.
Vera sacudiu a cabeça energicamente.
- Isso, não. Eu também sofri com a morte do Dr. Vasconcelos, com o luto fechado. Fiquei entediada, angustiada, infeliz. Nem por isso optei pela infelicidade. E não diga que a mulher é diferente do homem. Os sentimentos são os mesmos. A dor é a mesma. Não. Eu não aceito isso. Vamos até lá resolver tudo de uma vez. Eu vou me separar de Marcelinho!
Dagoberto levantou-se, dizendo com voz firme:
- Você não vai fazer isso. Não vai atirar fora toda sua felicidade.
- Pai, você disse que me apoiaria.
- Apóio, sim. Para acertar as coisas, conversar com seu marido e tentar um entendimento.
- Não vai dar certo. Não, depois de hoje. Ele chegou a ser violento comigo, sendo que ele era culpado.
- Falarei com ele. Não gosto de me intrometer nos desentendimento de vocês. Seria muito mais sensato que ambos conversassem, se entendessem e procurassem viver melhor daqui para frente. No entanto, vocês são muito jovens e como ele não tem a presença do pai, tentarei ajudá-los.
Ver suspirou resignada. Sentia que seria inútil, contudo precisava do apoio do pai. As coisas se tornariam mais fáceis se Dagoberto percebesse a verdade.
- Está bem, pai. Vamos agora.
Dagoberto, resignado, conduziu a filha até o carro e, durante o trajeto, procurou conversar sobre o relacionamento conjugal, tentando fazê-la compreender a importância do casamento e da família.
Vera não disse nada. De que adiantaria? Percebera que seu pai jamais entenderia sua desilusão, sua tristesa, sua infelicidade.
Foi Laura quem os recebeu com distinção costumeira. Marcelinho ainda não voltara para casa. Vera olhou para o pai e ia começar a falar, mas ele interveio:
- Vá ver Martin, minha filha. Eu vou conversar um pouco com D. Laura.
Vera obedeceu, deixando-os a sós.
- Sente-se, Dr. Dagoberto. Sua visita foi uma surpresa agradável. Afinal, Vera saiu com a Nice e não me disse que pretendia visitá-lo.
- Elas passaram em meu consultório. Eu pretendia conversar um pouco com Marcelinho. Mas, como ele não está, talvez a senhora possa me ajudar.
- Claro. Estou as suas ordens.
- Trata-se de um assunto delicado.
- Nesse caso, queira acompanhar-me ao escritório. Lá estaremos melhor.
Uma vez sentados um em frente ao outro, no luxuoso escritório que pertencera ao Dr. Vasconcelos e onde Laura cuidava dos negócios da família, ela considerou:
- Pode falar, Dr. Dagoberto.
Delicadamente, escolhendo as palavras, Dagoberto contou o que acontecera, concluindo:
- Vera indignou-se. Sabe como são essas coisas. Ela ama o marido e ficou muito magoada. Contudo, eu tenho experiência da vida e não penso que seja caso de uma separação. Eles são jovens, amam-se e acabarão por entenderem-se novamente.
Laura aborreceu-se, porém dissimulou. Era-lhe muito desagradável que o Dr. Dagoberto viesse a interferir na vida de seu filho. Estava claro que Marcelinho procurava divertir-se um pouco. Ele era homem, e ela não via nenhum mal nisso. Contudo, respondeu com delicadeza:
- Certamente, Dr. Dagoberto. Eles sempre viveram felizes!
- A senhora compreende. Vera está muito nervosa. Nós, que temos mais experiências da vida, precisamos ajudá-los a que se reconciliem. Sabemos que no casamento é preciso haver muita renúncia e dedicação de parte a parte para que a família se estruture.
Laura concordou e sorriu delicadamente ao responder:
- Certamente, Dr. Dagoberto.  Contudo, deve convir que a família se apóia na mulher. Como o senhor sabe, o homem está sempre fora nas atribulações do trabalho e sujeito a muitas tentações hoje em dia. É à esposa que cumpre preservar os valores do lar, mantendo-se fiel e dedicada, aconteça o que acontecer. Infelizmente, em nossa sociedade os costumes estão mudando, e as mulheres já não têm a estrutura de antigamente. Por qualquer motivo querem fugir à responsabilidade que lhes cabe.
Dagoberto franziu o cenho:
- Certamente não é o caso de minha filha. Encontrar o marido nos braços de outra mulher é sempre muito doloroso para quem ama, é a morte de  suas ilusões. Trata-se de uma situação delicada e muito desagradável que não foi provocada por ela. Ela está magoada e tem um motivo forte para isso.
Laura sorriu tentando dissimular o desagrado. A situação era-lhe sumamente desagradável. Sacudiu a cabeça negativamente enquanto dizia:
- Eu generalizei. Não estava me referindo à  Vera. Meu filho sofreu muito a perda do pai e ainda  não se recuperou. Acredito que tenha tentado apenas se distrair, sem imaginar que poderia ser surpreendido. Foi muita falta de sorte!
- Não foi um acontecimento feliz, com certeza. E ele não soube enfrentá-lo devidamente. Vera ficou muito magoada com a atitude dele.
- É natural. Ele não esperava. Por isso ainda não voltou para casa. Está envergonhado, com certeza! Meu filho é um cavalheiro e jamais seria grosseiro com a esposa.
- Foi o que pensei. Por isso, insisti com Vera para que reconsiderasse e voltasse para casa.
- Ela se Recusava a vir? Pretendia abandonar o lar?
Dagoberto respondeu sério:
- Tinha está intenção. Estava revoltada. Acredito que agora esteja mais calma e tenha pensado melhor. Estou aqui para pedir-lhe que os ajude a reconciliarem-se.
- Eu? O que posso fazer? Esse é um problema deles.
- Eu concordo. Eu mesmo vim a contragosto. Não gosto de me envolver na vida deles. Porém, senti que a situação de era grave e tentei evitar o pior. A senhora pode aconselhar seu filho a que peça  desculpas  a ela, afinal ele foi o responsável. Quem sabe assim. Tudo volte ao normal. Sei que ele sempre ouve o que a senhora diz. Depois, mãe sempre sabe como fazer isso.
Laura sorriu com certa satisfação.
- Tentarei, Dr. Dagoberto.
Dagoberto levantou-se.
- Obrigado. Sei que o assunto está em boas mãos.  Agora devo ir.
Laura levantou-se e acompanhou-o até a sala. Vera esperava-os. Dagoberto abraçou a filha dizendo:
- Vera, preciso ir.
- Vou comer você.
- Não, agora. Não pode abandonar seu lar antes de procurar entender-se com seu marido. Seu lugar é aqui, com seu filho. Pode contar com D. Laura. Ela vai ajudá-la. - respondeu ele fitando-a com carinho.
Vera abriu a boca e tornou a fechá-la. Sabia que a sogra não apoiaria. Contudo, não se atreveu a dizer nada.
- Amanhã, mais calma, você pensará melhor. Tome outro calmante e procure dormir. Não há nada como o tempo para curar as feridas. Agora eu vou indo. - Beijou-a delicadamente. -  Até amanhã.
- Até amanhã. - respondeu ela tentando reter as lágrimas.
Depois que Dagoberto saiu, Laura tentou conversar com a nora.
- Sente-se, Vera quero falar com você.
Ela obedeceu, a Laura prosseguiu:
- Seu pai me contou o que aconteceu.
Não obtendo nenhuma resposta, ela continuou:
- Infelizmente os homens são diferentes de nós, mulheres. O que você está passando, eu também passei.
Vera surpreendeu-se:
- O Dr. Vasconcelos também?
Laura deu de ombros.
- Qual é o homem que não comete um deslize de vez em quando?
Se eu tivesse desistido, abandonado o lar, a nossa família teria se desmoronado. O valor da mulher está em manter-se firme e fiel, aconteça o que acontecer. A fidelidade no homem é uma ilusão. Jogar fora sua posição, seu nome e seu lar por causa disso não se justifica.
Vera sacudiu a cabeça:
- Eu não aceito isso. Se eu posso ser fiel por amor a ele e em respeito ao nosso casamento, por que ele não? Os direitos são iguais.
- Engana-se, Vera. A sociedade dá toda liberdade aos homens e nenhuma às mulheres. A infidelidade dá ao homem um atestado de virilidade e força que o torna mais atraente, enquanto que à mulher, um atestado de leviana imoralidade. A mulher que abandona o lar e se separa, só tem a perder. É muito mal vista pela sociedade que nesses casos perdoa sempre o homem e dúvida da moral da mulher.
- O que a senhora está me dizendo é injusto. Como pode aceitar isso?
- Vivemos em sociedade e temos que respeitar seus costumes. Sem isso, toda civilização cairia por terra.
Vera levantou-se indignada.
- Pois eu não aceito isso! Exijo respeito dos meus sentimentos. Sou uma esposa boa e honesta, uma mãe dedicada e nunca deixei de cumprir meus deveres de mulher. Não posso aceitar o amor de um homem leviano e fraco que se envolve com outras mulheres.  Para amar e viver com um marido, é preciso respeitá-lo. Não posso respeitar um homem que me traiu e engana.
Laura impacientou-se:
- Desse jeito, você vai acabar com seu casamento e ficar sozinha pelo resto da vida. Se fizer isso, vai se arrepender.
- Tenho meu filho. Jamais ficarei sozinha.
- Saiba que Marcelinho jamais abrirá mão do filho. Certamente ficará com ele. É nosso único herdeiro. Nunca permitiremos que ele deixe essa casa.
Vera olhou-a surpreendida. Laura continuou:
- Por isso, menina, pense muito bem antes de tomar qualquer atitude. Se fizer isso, ficará sozinha. Agora chega deste assunto desagradável. Seu pai pediu-me para sconselhá-la, eu tentei. A responsabilidade é toda sua. Vá para o quarto e pense se, por um assunto tão corriqueiro, você vai atirar fora toda sua situação social, o marido e o filho.
Vera abriu a boca e tornou a fechá-la. Sentiu aumentar sua indignação, mas percebeu que de nada adiantava discutir com ela. Era com Marcelinho que ela precisava falar. Foi para o quarto e estirou-se no leito. Embora tentasse se aclamar para encontrar a melhor solução, não fazia outra coisa senão pensar, pensar, pensar.

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Pelas Portas do Coração - COMPLETO - ZIBIA GASPARETTOOnde histórias criam vida. Descubra agora