CAPÍTULO 23

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Juliana abriu a porta e Clóvis entrou, sentou-se em uma poltrona segurando a cabeça entre as mãos.
- O que foi? - indagou ela.
- Estou agoniado. Não sei o que fazer.  Queria falar com Paulo, mas não tive coragem. Sei o que ele pensa a respeito. Estou desesperado. Minha vida é um fracasso! Sou um incapaz, um errado que não consegue fazer nada direito.
Juliana alisou-lhe a cabeça com carinho:
- Isso não é verdade. Acalme-se. O que está havendo?
- Sinto-me envergonhado. A Estela está grávida outra vez. Não me sinto com forças de fazer de novo aquela coisa horrível! Jurei para mim mesmo que nunca mais provocaria um aborto.
- Não se martirize. Juntos pensaremos em algo melhor.
- Você não entende. O pai dela vai descobrir exigir reparação.
- Você não gosta dela? Não deseja casar-se?
- Por mim já teria casado com ela há muito tempo. Eu a amo de verdade.
- Então está tudo resolvido. Vocês se casam e pronto.
- Não é tão fácil assim. E papai? Ele exige que eu me forme antes de casar. Sem isso, não vai consentir.
- Quando ele souber a verdade, vai concordar. Caso contrário, case-se do mesmo jeito. Você já é um homem e deve assumir sua vida.
- Desempregado, sem profissão, sem dinheiro? Acha que o pai dela concordaria?
Juliana olhou-o dizendo lentamente: - - Clóvis . Está na hora de assumir sua responsabilidades. De decidir o que deseja fazer de sua vida. Você odeia a faculdade, por que ainda está lá? Só por que papai quer?
Ele olhou-a pensativo. Ela prosseguiu: - Está na hora de procurar saber o que você quer e gosta de fazer. A idéia de que só se progride na vida quando se tem um diploma universitário é mentira. Você não é incapaz nem preguiçoso. É inteligente, esperto, ágil e honesto. Pode escolher outro caminho e se dar melhor do que muitos diplomados que tenho visto por aí. Por que não tenta?
Nesse instante, Paulo apareceu na soleira, e Juliana continuou:
- Fale com Paulo:
Clóvis permaneceu alguns instantes de cabeça baixa sem dizer nada. Foi Paulo quem se aproximou:
- Está acontecendo alguma coisa?
Clóvis levantou os olhos:
- Estou envergonhado. Não estou conseguindo resolver meus problemas.
- Estamos aqui para tentar ajudar. O que é agora?
- O velho assunto que se repete. Estela está grávida de novo.
- O que pensa fazer?
- Não sei. Nunca mais farei aquilo de novo.
Paulo sorriu:
- Nesse caso, só tem um caminho: o casamento.
- Eu quero, mas não posso. É o problema de sempre.
- Enquanto não enfrentá-lo, ele sempre se repetirá de uma forma ou de outra. Liberte-se da tutela paterna. Faça algo por você. Procure um emprego e case-se. Sei que ama Estela.
- Amo, amo muito. Não quero que ela sofra.
- Nesse caso, reaja. Uma vez eu disse que podia contar comigo, agora repito. Aconteça o que acontecer, estarei do seu lado.
Clóvis levantou-se comovido, abraçando o cunhado:
- Obrigado. Juliana também acha isso. Preciso antes de mais nada conseguir um emprego. Não posso pedir Estela em casamento sem ter nada a oferecer. O problema é que nunca trabalhei e temo não ter habilitação para isso.
- Gostaria de trabalhar com automóveis?
- Claro. Disso eu entendo bastante.
- Nesse caso falarei com um amigo meu que tem uma loja de carros. Sei que está precisando de vencedores.
Os olhos de Clóvis brilharam de entusiasmo:
- Acha que eu serviria?
- Não sei. Mas pode tentar. Conhecimento para isso não lhe falta. Tem boa aparência, é perspicaz, inteligente, e o principal, sabe tudo dessas máquinas. Terá só que ajudar o cliente a escolher e a comprar.
- Se for isso, vai ser fácil. Sempre ajudei meus amigos a decidir quando iam escolher carros para comprar. Acha que conseguirei?
- Posso apresentá-lo ao meu amigo. O resto corre por sua conta.
Clóvis levantou-se animado abraçando o cunhado com entusiasmo:
- Obrigado! Podemos ir lá agora?
- Claro.
- Acha que com isso vou poder sustentar uma família?
- Muitos vendedores têm conseguido isso.
Vendo-os sair entusiasmados, Juliana sentou-se em uma poltrona pensativa. Fazia quase dois anos que se casara e quanto mais convivia com Paulo, mais o admirava. Ele era seu confidente, seu amigo, e sua família. Juntos haviam estudado, pesquisado sobre mediunidade, paranormalidade, metafísica. Quando Dora lhes disse que estava na hora de iniciar o trabalho, ele alugou uma casa onde colocou alguns estudiosos para realizar pesquisas sobre fenômenos paranormais. Pouco depois, alguns fatos começaram a acontecer com Juliana. Dora retomou seu trabalho de cura, e logo a casa tornou-se pequena para atender as pessoas que a procuravam.
Quando Dagoberto soube, indignou-se. Tentou por todas as formas proibir Juliana e, como não conseguiu,  rompeu relações com ela depois de tentar inutilmente convencer o genro a não permitir que Juliana continuasse.
Juliana ficou triste, mas Dora conformou-a pedindo-lhe que confiasse prosseguisse sem suas atividades. O Dr. Morelli fez várias tentativas para demover Dagoberto daquela atitude, mas foi inútil. Apesar da amizade que os unia e de saber que ele não aprovaria, Morelli apoiou Juliana. Interessado em conhecer mais sobre mediunidade, acompanhou alguns casos atendidos por ela e chegou à conclusão que o fenômeno era muito mais sério e verdadeiro do que podia supor.
Paulo, inteligente, perspicaz, conversava com ele indicando-lhe livros, fazendo-o perceber detalhes que ele não via. Tornaram-se excelentes amigos, e o entusiasmo do médico crescia a cada dia. Conversava com Armando a quem tentava convencer da veracidade dos fenômenos ocorridos com Juliana, mas ele recusava-se a crer. Afirmava que o pai estava se iludindo, que tudo não passava de sugestão e que ele estava perdendo tempo. Enquanto Morelli pesquisava os casos atendidos por Juliana, seu amigo Dr. Osvaldo, integrara-se completamente naquele trabalho, chegando a levar alguns dos seus pacientes graves para que Juliana os tratasse. Sempre que tinha um caso complicado, ou estivesse em dúvida quanto ao diagnóstico, ele conversava com Dora. Interessara-se tanto que embora continuando como anestesista, voltara à clínica geral em um bairro pobre, onde havia muita gente necessitada.
Um dia, conversando com Clóvis, o Dr. Morelli comentou o quanto apreciava Paulo. Com Juliana tudo era diferente, e ela encontrada o marido ideal.
- Paulo é um homem extraordinário - concordou Clóvis com satisfação. - Poucos seriam tão desprendidos quanto ele e colocariam seu ideal acima dos interesses pessoas.
- Por que diz isso?
- Por que quando papai queria internar Juliana, ele a protegeu e para que ela se tornasse livre, casou-se com ela. Quem mais teria feito isso?
- Quer dizer que eles não se casaram por amor?
- Não. Eles vivem como irmãos. Se estimam muito, mas não são marido e mulher. A princípio pensei que com o tempo as coisas mudariam. Mas até agora continua igual. Eles vivem juntos, mas não se relacionam. Como marido e mulher.
- É inacreditável! Tem certeza disso?
- Tenho. Eles não têm segredos para mim. Falei demais. Confio em sua descrição. Ninguém sabe disso, e espero que continue assim.
- Juliana tem direito a ser feliz. E se um dia ela encontrar um amor?
- Eles combinaram que quando acontecer, seja com ele ou com ela, vão separar-se amigavelmente. Até lá, ela já terá atingido a maioridade e continuará livre.
- Eles tratam-se com tanto carinho... nunca imaginei uma coisa dessas.
- Ele se querem bem de verdade. Depois Paulo é como Juliana. Entende dessas coisas espirituais e leva isso muito a sério.
Morelli admirou-se e mais uma vez pensou na resistência de Dagoberto em aceitar a filha como ela era. Se tudo aquilo desse errado, se ela viesse a ser infeliz, ele teria sido um dos responsáveis, forcando-a a um casamento desses para conseguir sua liberdade.
Uma vez em casa, comentou com Armando contando-lhe o que descobrira. Ele ficou indignado.
- Que loucura! Como Clóvis permitiu uma coisa dessas? Juliana é tão ingênua, fazer um casamento desses! Logo ela, que se dizia tão verdadeira e que só fazia o que sentia. Um dia ela vai amar alguém e então arrepender-se do que fez.
- Ela está muito bem e feliz. Paulo é um moço excelente e cuida dela com todo carinho. Está melhor com ele do que com os próprios pais. Pelo menos é livre para viver sua vida do jeito que quer.
- Isso é fanatismo. Colocar essa ilusão acima dos próprios sentimentos, é loucura. Um dia vão arrepender-se. E você, não vai fazer nada? Diz que gosta dela e aceita tudo sem tentar ajudá-la?
Morelli sorriu:
- Quem lhe disse que ela está precisando de ajuda? Juliana está feliz e alegre. Tem uma vida boa. Não precisa de nada. É você quem está exagerando. Não sei se fiz bem em lhe contar.
- Juliana é menina diferente, gosto dela. Gostaria que fosse feliz.
- Ela é. Ponha isso em sua cabeça.
Armando meneou a cabeça e não disse mais nada. Porém, a partir daquele dia não parava de pensar nisso. Seu rosto, seu sorriso, não lhe saía da lembrança. Decidiu procurá-la.
- Pai, você me convenceu. Quero conhecer as pesquisas que estão sendo feitas em casa de Juliana.
- Não é casa de Juliana. É um centro de estudos que eles fundaram.
- Seja. Queri ir até lá.
- Você não queria nem ouvir falar nisso. Por que essa mudança agora? Teria sido pelo que lhe contei?
- Pode ser. Quero ver com meus próprios o que anda acontecendo por lá.
- Está certo. Pode acompanhar-me. Mas observar calado e não mencionar o que lhe contei. Eles pensam que eu não sei de nada. O Clóvis confidenciou, mas pediu descrição.
- Não direi nada. Não venho nenhuma  intenção de me meter na vida deles.
- Então por que quer ir?
- Digamos que por curiosidade. Você não fala em outra coisa nos últimos tempos.
No dia seguinte, quando Morelli foi ao centro de estudos, Armando o acompanhou. Juliana surpreendeu-se, mas  recebeu-o com carinho. Apresentou-lhe Paulo e a partir desse dia Armando começou a aparecer, procurando aproximar-se de Juliana, depois que ela terminava de atender as pessoas, fazendo perguntas sobre mediunidade, interessando-se por tudo quanto ela fazia.
Percebeu que ela não era mais a menina que ele havia conhecido. Estava mais mulher, mais bonita e requintada. Olhando para Paulo, ele não compreendia como ele podia viver na mesma casa com uma mulher tão atraente e conservar-se distante. O que seu pai lhe contara seria verdade mesmo? Não seria invenção de Clóvis? Haveria de descobrir.
Notou que embora eles se tratassem com carinho delicadeza, não rinham certas intimidades, comuns entre marido e mulher. Todas as tardes, Juliana ia para o Centro de Estudos onde permanecia atendendo alguns casos, respondendo cartas, orientando  as pesquisas, estudando sob orientação de Dora que lhe indicava e que ler e onde pesquisar. Graças a isso, durante aqueles dois anos, tomara conhecimento com as várias correntes de espiritualidade existentes, algumas das quais entrara em contacto, mantendo proveitosa correspondência.
Era-lhe fácil entender s filosofia oriental com a qual identificava-se muito, dedicando-se à meditação com satisfação. Podendo agir livremente, Juliana fazia com naturalidade, manifestando sua própria natureza, expressando sua beleza interior. Seus olhos tinham mais vida, mais brilho, seu carisma ficara mais evidente, mesmo quando não estava com Dora.
As pessoas aflitas que a procuravam, mesmo as mais velhas e formais, em sua presença sentiam-se encorajadas a abrir-se, relatando fatos que não haviam tido coragem para contar a ninguém, esperando ansiosos sua palavra. Alguns que se curavam, tentavam venerá-la, mas ela tratava logo de mostrar-se como pessoa comum. Alertando que eles haviam melhorado, mas que a cura definitiva dependia deles. As doenças eram fruto de suas atitudes e se eles não as modificassem, logo apareceriam outras.
Ela afirmava que cada um é responsável pela sua vida. Cada atitude atrai um resultado correspondente. Se o resultado era ruim, se a doença e a dor apareciam, havia uma causa, uma atitude que as provocara. A cura definitiva só se daria quando essa causa fosse identificada e a atitude geradora, substituída por outra mais adequada.
Para isso, orientada por Dora, reunia grupos a quem ministrava aulas, tentando ajudá-los a identificar as atitudes geradoras dos seus problemas, como as que seriam mais adequadas para substituí-las.
O sucesso foi intenso e absoluto. Muitos melhoraram, havendo recuperado a saúde, a alegria de viver. Por causa disso, o número de pessoas que buscava o Centro de Estudos aumentava a cada dia.
Armando que se aproximara por curiosidade, descrente e disposto a não se deixar envolver  pelo carisma de Juliana, foi aos poucos se interessando pelas lições que ela distribuía com naturalidade e bom humor. Eram teorias novas que ele nunca ouvira, muitas das quais negava completamente tudo quanto ele havia aprendido como regra geral, mas que para sua surpresa, funcionavam de forma rápida e eficiente. Disposto a não aceitar, ele não acreditava e as achava simplistas demais. Porém. As pessoas voltaram diferentes, mais alegres, cheias de entusiasmos, a relatar que as coisas haviam se modificado em suas vidas, para melhor. Era sugestão, pensava ele, apenas isso.
Essa idéia de que o pensamento interferia na vida da pessoa, que idéias negativas prejudicam a saúde, que pensando de forma positiva a vida se modificaria, era pueril. A psicopatologia comprovara exaustivamente que o estado emocional do ser humano era causado pelo funcionamento químico das glândulas. Juliana afirmava justamente o contrário. Eram os pensamentos, as impressões, as crenças que estabeleciam e controlavam todo o funcionamento glandular, provocando problemas físicos quando não eram adequados.
Ele não podia crer. Tentou conversar com ela, convencê-la de que estava errada, o que não conseguiu. Inconformado, desabafou com o pai:
- Juliana está errada! Ela não estudou, não sabe como o organismo funciona. Como pode fazer afirmativas como essas? Está enganado aquelas pessoas! Tentei explicar-lhe, mas ela não me ouviu.
- Ao invés de tentar influenciá-la, por que não pensa no que ela diz? Garanto que tem base. Os resultados têm sido excelentes. Nunca os obtive em minha clínica.
- As pessoas se sugestionam facilmente. Elas ficam cegas! Acreditam em tudo com facilidade. O que Juliana afirma não tem nenhuma base científica.
- Se espera encontrar no trabalho de Juliana o que aprendeu na universidade, é melhor desistir. Ela tem outros meios de pesquisa, muito diferentes dos nossos e, pelo que tenho visto, são eficientes. Dora sabe das coisas. Pode crer.
- Não acredito que essa figura exista realmente. Vocês fanatizaram-se. Tem sido assim sempre. As pessoas ficam fascinadas por seres do outro mundo, com poderes sobrenaturais. O que me admira é você, um homem de ciência, aceitar essa teoria.
Morelli sorriu:
- Cuidado com a pretensão. Ela é mais perigosa do que qualquer pensamento positivo. Enquanto este último ajuda a viver melhor, a pretensão fatalmente termina na desilusão, na comprovação da própria impotência. O radicalismo é inimigo da ciência e o preconceito também.
- Eu não sou radical nem preconceituoso.
- Nesse caso, por que não faz como eu? Quando venho aqui, procuro deixar de lado qualquer idéia preconcebida e fico aberto a todas as coisas novas. Só assim poderei ter isenção para compreendê-las.
- Não consigo. Passei anos estudando, tentando aprender e agora deverei esquecer tudo por causa de uma menina ingênua e cheia de ilusões?
- Você não é obrigado a aceitar as idéias de Juliana, mas nós também temos o direito de pensar de outra maneira. Não é natural isso? Por que se envolve dessa forma? Se não aceita o que fazemos no centro de estudos, por que continua indo lá?
- Juliana me preocupa. Depois, tenho a medicina como causa sagrada. Não me agrada ver pacientes sendo enganados daquela forma.
- As pessoas procuram Juliana porque querem. Sentem-se beneficiadas. Melhoram, ficam mais felizes. Essa menina tem feito coisas que sempre desejei poder fazer e não consegui. Acredite ou não, seja com a ajuda de Dora, ou da forma que for, o fato é que ela tem aliviado a dor de muitos, contribuído para que eles se sintam melhor, recuperem a confiança em Deus, na vida, queiram fazer alguma coisa por si, superar as próprias dificuldades. Eu tenho certeza de que Juliana é uma médium dos espíritos superiores, que veio com a tarefa de aliviar o sofrimento humano e ajudar as pessoas, mais ainda que isso não fosse verdade, só pelo que essa menina tem ensinado, pela filosofia de vida que consegue transmitir, valeria a pena estar a seu lado. Confesso que tenho aprendido muito através  das aulas que ela dá e tenho sido muito beneficiado também.
- Você? Sempre viveu muito bem e sem problemas.
- O que você sabe de minha vida interior? Das minhas lutas e necessidades? Da minha impotência lutando contra a morte, perdendo sempre? Do esforço que fiz para conviver com o quadro terrível do sofrimento humano, pretendendo ajudar e podendo tão pouco?
Armando olhou o pai, emocionado:
- Posso avaliar porque também tenho vivenciados esses problemas. Nosso martírio é que, pretendendo aliviar a dor, somos obrigados a conviver com ela todos os dias.
- Juliana tem realizado meu sonho. Tenho a visto colocar a mão sobre a cabeça de pessoa em sofrimento, e ela ser curada. Não é um milagre?
- Nem todos têm sido curados. Nem sempre essa cura se mantém.
- Por isso ela ensina as pessoas. Se estudasse esses assuntos sob o ângulo da espiritualidade, haveria de entender por que e como a dor existe e nem sempre pode ser afastada. Seria mais sensato de sua parte tentar observar os fatos mais profundamente e sem idéias preconcebidas.
- Para mim, essa cura é uma ilusão. Um paliativo. Não será um erro enganar essa pessoa, que se julga curada e pode deixar de lado seu tratamento médico e ser prejudicada?
- Juliana nunca interfere no tratamento médico, nem sugere que o deixe de lado. Há casos em que ela diz que os espíritos vão ajudar o médico da pessoa e que é lá que ela vai se curar. Já a vi fazer isso mais de uma vez. É comum ela ser procurada por pessoas desenganadas pela medicina, cansadas de correrem pelos consultórios médicos sem obter nenhum resultado. E onde nós não conseguimos ajudar, eles conseguem. Aliviam a dor, confortam.
- Pelo jeito, você já está convencido mesmo.
- Estou. Tenho muita admiração e respeito por Juliana. Ela é admirável. É um espírito superior que veio para aliviar o sofrimento humano. Tenho certeza disso. Não gostaria que você se pusesse contra ela.
- Gosto de Juliana. Mas tenho minha ética. Preferia que ela não se envolvesse com essas coisas.
Morelli fixou o filho e havia um brilho indefinível em seu olhar quando disse:
- Um dia você ainda vai entender.
Armando meneou a cabeça negativamente. Para ele, esse dia nunca haveria de chegar. Se continuava indo ao Centro de Estudos de Juliana era na esperança de poder fazê-la desistir dessas idéias e assumir sua função de mulher, acabando com aquela farsa, construindo um lar verdadeiro. Juliana fora feita para o amor, e ele sentia por ela grande atração. Naquelas circunstâncias, tentava resistir a seus encantos, não demostrar o que sentia, ser discreto.
A descoberta de que ela não se havia casado por amor, despertara-lhe a vontade de conquistá-la e fazê-la esquecer aquelas idéias disparatadas. Tudo seria fácil se ela viesse a amá-lo. Se o seu casamento com Paulo não fora consumado como diziam, seria simples conseguir a anulação. Eles se casariam, ela se reconciliaria com os pais. Tudo ficaria como deveria ser. Acariciando esses projetos, sem dizer nada a ninguém, nem a seu pai, Armando a cada dia procurava aproximar-se mais de Juliana.
Ela o recebia com alegria e o tratava com consideração e carinho. Era muito ocupada, mas quando dispunha de algum tempo livre, não se furtava ao prazer de conversar com ele.
Quando ele expunha suas dúvidas e tentava fazê-la  acreditar no que dizia, ela sorria e delicadamente mudava de assunto. Ele não insistia, mas não desistia. Guardava suas palavras para um momento que julgasse oportuno. Juliana falava de coisas interessantes, tinha um jeito todo seu de enxergar a vida, a natureza, as pessoas, e ele sempre se interessava pelo que ela dizia, encantado pela vivacidade dos seus olhos, a beleza do seu sorriso. Ele não percebia que a pretexto de atraí-la para o que ele queria, era ele quem a cada dia mais e mais deixava-se fascinar por ela.

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Pelas Portas do Coração - COMPLETO - ZIBIA GASPARETTOOnde histórias criam vida. Descubra agora