Acho que se chama efeito dominó. Sabe, um movimento que gera o outro e antes que você perceba eles desmoronam. - Revenge.
– Que merda é essa? – sua voz grossa transmitia todo o nervosismo contido em si. Marcos, o pai de Guilherme sempre se mostrou um homem machista, desde sua postura até os assuntos aos quais tocava nas vezes em que estive presente. Os eventos que se seguiram jamais foram imaginados, nem por mim, muito menos pelo meu namorado.
-Nada pai. – Guilherme respondia nervoso como em poucas vezes eu havia o visto. Sua voz transmitia o medo que ele sentia e sua expressão fácil transmitia o pânico que permeava seus pensamentos.
-Como nada, Guilherme? – ele gritava aproximando-se de mim. – Eu te vi beijando um homem, um homem Guilherme. – as palavras homem foram ditas em um tom ainda mais alto, como se quisesse frisá-las. Ao fundo pude ver Marília, mãe de Guilherme, chorando. – Eu achava que você era homem, mas não, é só um viado. – Guilherme estava aos prantos ouvindo o que o pai dizia. E eu continuava ali, imóvel, sem saber o que dizer ou como agir.
-Não é assim, pai. – Guilherme tentava conciliar a fala ao choro, o que era praticamente impossível. Marcos se afastava de mim e aproximava-se dele.
-Me olha nos olhos Guilherme. – ele ordenava. Guilherme, em prantos, não conseguia. – Olha! – ele gritava, agora dando um tapa na cara dele. Como podia um homem de tamanho poder e influência agir daquele jeito? Bater e humilhar o filho simplesmente por sua sexualidade.
-Marcos, o senhor precisa se acalmar. – disse, reunindo toda a coragem que existia dentro de mim. Guilherme me olhou rapidamente como se quisesse que eu ficasse quieto. – O pai de Guilherme chegava perto de mim bufando de raiva. Juntei algumas migalhas de coragem e o enfrentei tentando proteger meu namorado. – O senhor pode ser o prefeito, pode ser quem quiser, mas homofobia é crime. Se encostar a mão em mim ou no Guilherme eu procuro a polícia e coloco o senhor na cadeia. – não adiantou. A raiva dele apenas cresceu e imediatamente ele me empurrava pra trás, fazendo-me cair sob a mesinha de centro da sala. Podia sentir alguns cortes pelo corpo causados pelo vidro quebrado.
Pela gola da camiseta Marcos me puxava para fora do tapete. Guilherme e Marília assistiam a tudo horrorizados sem conseguir se mover.
-Eu não quero que o meu tapete se contamine com viadagem. – eu estava em prantos. Nunca na minha vida inteira, mesmo nas brigas que tinha por garotas na cidade, tinha apanhado ou sido humilhado daquela maneira. Para fechar a sessão de horrores, Marcos cuspia no meu rosto ao dar as costas pra mim. Conseguia ouvir ao fundo a voz do Guilherme gritar com seu pai, mas nada que eu pudesse entender. Eu simplesmente não acreditava que tudo aquilo estava acontecendo, minha mente tentava se proteger bloqueando minha audição. Me pus de pé outra vez enquanto Marcos se aproximava de Guilherme.
-Eu não criei filho pra ser viado. – o dedo estava em riste apontado para Guilherme, quase tocando em seu nariz. Marília estava ao lado do seu filho, abraçando-o como se quisesse protege-lo de uma possível agressão física. Era nítido que aquela era apenas mais uma mulher submissa a um marido machista e mandão, como vemos pelo Brasil afora. Meu namorado tomava alguma coragem e ao tentar respondê-lo, vi a mão de Marcos subir para repetir com ele a agressão cometida contra mim. Tomei posse de uma coragem que não era minha e me aproximei, segurando a mão daquele homem que agora mais parecia um selvagem.
-O senhor pode fazer o que for comigo. Pode gritar, pode me xingar de viado, pode cuspir, fazer o caramba a quatro. – uma firmeza surpreendente podia ser sentida na minha voz. – Mas não toca nele. – eu quase o ordenava. Aquela era uma última tentativa de proteger o meu namorado, que agora vinha ao meu encontro. – Seu filho não é mais criança para apanhar do pai apenas por ser quem ele quer ser. Saiba que ele é um cara incrível, tem qualidades que o senhor jamais vai imaginar. E sabe por que? Porque o senhor não passa de um hipócrita, machista e.. – fui interrompido pela mão de Marcos que agora pressionava meu pescoço. Em meio a toda aquela euforia pude ver que Guilherme estava caído no chão, provavelmente tinha sido empurrado pelo seu pai.
-Olha aqui moleque. Eu não vou falar outra vez então é bom prestar a atenção. – eu quase não podia respirar com a garganta sendo prensada pela mão dele. – Eu vou te dizer o que você vai fazer agora. Você vai sair dessa casa, ficar quietinho e sumir dessa cidade ou nunca mais vai ver o Guilherme na sua vida inteira. E nem adianta ir na polícia, gritar, espernear. Aqui eu mando em tudo e te faço sumir se não ficar quieto. – o tom de voz dele passava de agressivo a ameaçador. A expressão de Marilía agora era de quem lembrava de alguma coisa e tentava esquecer. Guilherme olhava para o chão, como se suplicasse para que eu o obedecesse. E assim o fiz quando Marcos me soltou. Juntando o pouco de dignidade que me restava, olhei para Guilherme no chão e saí porta afora, temendo o que poderia acontecer com meu namorado. E pensar que um beijo de despedida podia dar nisso.
Tomado pelo pânico caminhei sem rumo pelas ruas. A vergonha de chorar em público havia passado e as lágrimas não me obedeciam ao mandá-las parar de correr pelo meu rosto. Quem me via passar estranhava meu estado mas não questionava nada. Ao me acalmar pude ver que estava próximo da praça e lá me sentei no mesmo banco de sempre. A noite chegava, eu me acalmava cada vez mais e tentava não pensar em nada do que tinha acontecido.
-A gente definitivamente precisa parar de se encontrar aqui. – entre risos, era Matheus quem falava ao sentar-se no banco. Ele desfez o sorriso ao perceber minha expressão fácil. – O que aconteceu Nick? – fui tomado pelo abraço lateral do meu amigo. Matheus era hoje um dos meus únicos amigos naquele lugar e eu realmente precisava de um. Sem muito pensar ou me perguntar se haveria alguma consequência, lhe contei tudo que havia acontecido minutos antes. Sua expressão era de espanto.
-Nick. – ele começava. – Vou te contar o real motivo do meu pai ter morrido. – meu amigo iniciava a sua história, que a esse ponto não fazia muito sentido pra mim. – Meu pai era o homem de confiança do Marcos. Ia com ele para todos os cantos e até fazia algumas coisas que não podia nos contar. Até que um dia descobriu que o prefeito mandou matar o último concorrente dele nas eleições, porque ele ia ganhar e também porque estava tendo um caso com a sua esposa. – meu choro era tomado pelo espanto. Aquele homem conseguia se tornar ainda pior a cada palavra dita pelo Matheus. – E não é só isso. Ele lava dinheiro nas empresas dele, suborna pessoas, policiais. É por isso que o inquérito da morte do candidato foi arquivado e não houve sequer uma investigação sobre a morte do meu pai. – lágrimas corriam pelo rosto do Matheus, em um mix de raiva e tristeza. – Eu tenho certeza que foi ele, Nick. Certeza. Foi ele que mandou darem um jeito no meu pai e fingir um acidente. Ele descobriu o que o meu pai sabia e matou ele. – os papéis tinham se invertido e agora quem consolava era eu. A essa altura, ouvindo a tudo que Matheus tinha me contado, eu tomava ciência do risco que corria e a minha indignação apenas se alimentava disso. Nada deveria ser dito. Tudo que eu podia fazer era dar um abraço em Matheus e tentar suprimir sua dor. – Toma cuidado Nicolas, aquele homem é perigoso. – ele me alertava ao mesmo tempo que se levantava do banco para ir embora. O tempo havia passado sem que fosse capaz de perceber, os cortes já não me incomodavam mais e a essa altura meu pai já deveria estar me esperando.
Despedindo-me de Matheus rumei para casa, pronto para enfrentar a próxima batalha que estaria por vir.
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O Filho do Prefeito: Origens (Livro 01) - [Romance Gay]
Teen FictionDedicado a todos aqueles que sabem que não escolhemos a quem amar. Amor apenas se vive, apenas se sente, apenas se descobre. Acompanhe a história de Nicolas, e surpreenda-se com "O Filho do Prefeito". Chegamos ao Spotify! É só procurar por O Filho d...