#29 - Redenção

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Devastado. Esta era a resposta que eu daria caso alguém me perguntasse como eu estava me sentindo. Havia ainda a preocupação com o Guilherme e com o que seu pai poderia ter feito com ele depois que eu saí. Por mais que Marcos se mostrasse um homem machista e homofóbico em todas as ocasiões em que o encontrei, jamais imaginei que ele poderia chegar ao ponto de agredir fisicamente o próprio filho e me ameaçar.

Chegando em casa pude perceber que minha família inteira já estava a postos, faltando pouco para o jantar ser servido. Meu pai falava ao celular e meu tio parecia um tanto quanto apreensivo.

-Desculpem o atraso. – disse, entrando pela única porta da casa. Era impossível que todos não me vissem e reparassem a maneira como eu estava. Rapidamente meu pai desligou o telefone e começou a questionar o que havia acontecido.

-Tá tudo bem, pai. – eu começava, tentando conter o choro. Faziam anos que meu pai havia tomado uma atitude tão paternal como aquela, de correr para me abraçar como se quisesse me defender de qualquer mal. Também pudera, minha vida e minha postura antes de me mudar para o interior não lhe permitiam aquilo. – Foram uns caras, tentaram me assaltar e eu revidei. – menti. Sei que mentir para o pai era feio, ainda mais na frente de toda a família, mas essa foi a primeira resposta que me veio à mente. Revelar sobre os acontecimentos na casa do prefeito e, consequentemente, sobre meu namoro com Guilherme, eram fatos que não estavam em prisma naquele momento. Meu pai, tomado pelo instinto paternal, reagia.

-Temos que ir à polícia. – ele começava, agora eufórico. Eu respondia que não e que seria melhor apenas tomar um banho, mas ele continuava a insistir. – Tome um banho, se lave e depois vemos o que fazer. – disse, acompanhando-me até o quarto de Dereck. Meu pai esperou que eu pegasse as roupas e me acompanhou até a porta do banheiro. Como eu sentia falta disso, do meu pai. E como eu poderia ser tão bobo de ter perdido anos ao lado de alguém tão incrível. Estes pensamentos tomavam conta do meu banho, junto a toda preocupação que eu vivia.

A água parecia navalha cortando meu ego. As mensagens que enviei para o meu namorado sequer haviam sido entregues, eu precisava saber como ele estava para ficar mais calmo.

-Pronto. –minha voz ecoava pela cozinha e todos me olhavam ao descer escada abaixo. Dereck, dizendo-se preocupado, havia mandado uma carinha de triste por mensagem, perguntando também se estava tudo bem. Mesmo com dor, com vergonha e preocupado, percebi que todos me observavam e esperavam algo de mim, nem mesmo que dissesse que estava bem apenas para melhorar o clima do ambiente.

- A janta está pronta. Vamos comer. – dizia a minha tia, quebrando o gelo do momento. Na mesa tínhamos uma bela lasanha, comida preferida tanto do meu pai quanto minha, junto com alguns acompanhamentos. Coisa de família do interior que quando se reúne quer comer tudo o que pode e não pode. – Depois vocês dois podem cuidar disso, até porque acredito que vá demorar. – dizia minha tia, encarando a mim e ao meu pai em referência ao suposto assalto que eu sofrera. Durante todo o jantar escutei meu pai falar dos negócios dos últimos três meses, das viagens da minha mãe para se acalmar e meus tios falando sobre como eu estava me saindo bem como morador de uma pequena cidade. Meu pai demonstrava orgulho, rindo das situações contadas por eles como a caminhada no campo às 6 horas da manhã em pleno domingo. Caras e bocas não faltaram naquela mesa. Alguns elogios ao meu comportamento também não, mas aquilo era totalmente irrelevante pra mim. Minha preocupação estava na conversa que eu precisava ter com meu pai e em como o Guilherme estaria. Nem mesmo as mensagens haviam sido entregues.

- Nicolas. – era meu pai quem começava a falar. – Preciso falar com você, em particular. – seu olhar era expressivo, transmitia uma preocupação característica dele. O chamei para caminhar para conversarmos mais tranquilamente. – Já faz algum tempo que você está aqui, Nick. – falava ele, me chamando pelo apelido que a tempos não utilizava. – Eu preciso saber o que você está sentindo e o que você quer de hoje em diante. – Terminando, fitando-me com o olhar. Para contribuir com o clima áspero da situação, até mesmo uma brisa gélida passava por nós.

-Pai. – só agora eu percebia a quanto tempo eu não falava aquela palavra com tanto carinho. - Eu me sinto bem aqui. Não quero ir embora. – eu respondia, já indicando minhas intenções. Na verdade, mesmo com tudo de errado que vinha acontecendo como o desvio de valores na fazenda do meu pai e a reação que o pai do meu namorado teve ao descobrir nosso relacionamento, eu não queria sair dali. Queria ter tempo para descobrir ainda mais os pequenos detalhes da vida e resolver tudo. – E.. – eu recomeçava, hesitando sobre o que falar. – Tem coisas que eu quero investigar. – o olho do meu pai saltou como quem quisesse perguntar imediatamente sobre o que eu estava falando.

-O que você está investigando? – meu pai perguntava, um tanto quanto desconfiado. Seu olhar era um misto de desconfiança com curiosidade.

-Algo que pode mudar a nossa vida, pai. – eu tentava não dar mais detalhes, afinal de contas boa parte das provas que eu tinha dentro do HD sumiram. – Mas quando eu tiver provas eu te conto, prometo. – finalizei, esperando meu pai consentir. E ele assim o fez depois de relutar um pouco.

Meu pai precisava ir embora, mas antes de se despedir voltou a insistir para irmos a polícia para falarmos sobre a suposta tentativa de assalto que eu havia sofrido. Na verdade inventar que tentaram me assaltar foi uma péssima ideia, mas a única que me passou pela cabeça.

-Deixa quieto pai. Vai tranquilo que amanhã eu vejo o que fazer. – respondi. Seria estranho – e um crime também – eu ir até a delegacia e prestar falsa comunicação de crime. Eu também continuava com todos os meus pertences.

Meu pai se despediu de toda a família para ir embora e meu pensamento continuava no Guilherme. O que será que estava acontecendo com ele? Será que estava bem? Eram dúvidas que eu queria responder. Fui para a cama e Dereck, estranhando minha expressão de tristeza e preocupação, até tentou puxar conversa e perguntar se estava tudo bem. Sem sucesso. Acabei por pegar no sono.

O dia nascia e pequenos raios de sol iluminavam o quarto. Acordei como fazia todas as manhãs e imediatamente me preparei para ir até a casa de Guilherme. Eu sabia que àquela hora seu pai provavelmente já teria saído, já que antes de ir para a prefeitura ele conferia suas propriedades e dava uma volta pela cidade. Mal tomei café e rumei para lá.

-Bom dia. – eu dizia, sem saber quem atendera o interfone. – O Guilherme está? – perguntava, esperando uma resposta positiva.

-Oh meu filho. – pela expressão carinhosa eu sabia que era a Lúcia, a doméstica da casa que sempre me tratou bem. – Ele saiu hoje com umas malas e o pai dele. Mas a dona Marília tá aqui. – ela desligou, abrindo o portão antes mesmo de eu responder. O medo da reação que a mãe do meu namorado teria ao me ver tomava conta de mim.

-Você veio. –Dona Marília começava, enfrentando-me ao melhor estilo Victoria Grayson – Ele foi embora. Meu marido o levou. – ela olhava para baixo, como quem quisesse admitir culpa por não se opor. – Eu sei que vocês se amam Guilherme. Eu já tinha notado alguns olhares e até mesmo o jeito como ele falava contigo. Com os outros amigos dele era diferente. – ela pausava, suspirando. Eu continuava quieto, pensando sobre a primeira frase que ela havia dito. – Se você quer o bem dele, vá embora. Deixe-o, esqueça dele. – aquelas palavras cortavam meu coração.

-Pra onde ele foi? – eu perguntava, tentando conter o choro.

-O Marcos mandou ele pra Irlanda pra morar com o tio. – ela afirmava. E ele vai ficar lá até esquecer de você e o meu marido esquecer de tudo que aconteceu ontem. Ele foi essa madrugada mesmo. Está sem celular e vai ficar sem internet por um tempo lá também. - as lágrimas já escorriam pelo meu rosto. Segurar era impossível. Eu estava com medo do rumo que tudo aquilo poderia tomar. – O melhor a fazer agora é você esquecer do Guilherme e seguir a sua vida. A partir de hoje ele vai viver a vida dele e o Marcos vai controla-lo, ele não admite um filho gay. – ela terminava, demonstrando ainda mais culpa.

Semresponder a todo aquele absurdo decidi sair dali. Sem rumo, com a cabeça pesadae com medo. Medo do futuro, da constância que acabava. O amor, antes umsentimento tão bonito e vívido dentro de mim, agora se transformou em tristezae saudade. Chorando caminhei pela rua e me sentei na praça. Será mesmo que aminha história com o Guilherme havia acabado? Eu acredito que não. Essahistória ainda vai render.     

O Filho do Prefeito: Origens (Livro 01)  - [Romance Gay]Onde histórias criam vida. Descubra agora