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Nove semanas.

Estou com dois meses e nunca me senti mais deprimida.

Me sinto enjoada, meus hormônios estão loucos e o jeans já começa a incomodar.

Estou próxima da décima semana e o Natal também está batendo na porta. Eu sempre passo o Natal com minha família, mas dessa vez estou com medo.

Minha mãe perceberia. Sem sombra de dúvidas perceberia. Se não fosse pelo fato de eu vomitar todo fim de tarde e chorar até vendo comerciais de sabão em pó, seria pelo radar de mulher grávida que vem embutido em mamãe.

Ela conseguia perceber uma gravidez antes mesmo da grávida e arrisco dizer que antes do espermatozoide terminar de comemorar sua chegada ao óvulo. Costumamos chama-la de farejadora de fetos, tamanha sua precisão.

Tinha medo do que pensariam sobre isso. Medo de suas reações ao saber que não ficaria com o bebê.

Eu poderia não ir e chorar durante todo o Natal, quando eu completaria dez semanas, ou ir e contar sobre a coisinha.

Não... não podia deixar de ver meus pais, no entanto.

Com isso, eu estava resgatando minha mala recém chegada em Miami e controlando minha vontade de chorar.

Orei para que não estivessem usando perfumes doces ou entregariam tudo.

Arrastei minha mala até me encontrar no pavimento movimentado do aeroporto e procurei minha família, já enjoada de pavor.

Ali estavam eles, mamãe já cheia de lágrimas, Sofia agarrada em minha mãe e papai ao lado de minha irmã caçula, uma mão pousada em seus ombros em apoio.

Meu peito doeu de saudades. E senti meus olhos queimarem com as lágrimas que me invadiram.

Apressei o passo e assim que a proximidade foi o bastante me lancei contra os três, nos juntando em um abraço.

-Senti tanta saudade! - choraminguei.

Mamãe nos separou e segurou meu rosto pelas bochechas, os lábios apertados em linha reta enquanto seus olhos varriam meu rosto.

Foi quando suas sobrancelhas se arquearam que eu tive a certeza: ela sabia.

Mamãe já havia farejado a coisinha de Lauren em meu ventre.

Mas ela não disse nada, me deu um beijo terno na testa e me soltou, permitindo que meu pai me agarrasse em um aperto desajeitado.

-Sentimos sua falta, filha - ele disse em espanhol, como costumávamos falar entre família.

-Senti saudades, papa - escondi o rosto em seu peito.

Quando papai me soltou pude observar melhor minha irmã. Ela estava tão crescida!

Treze anos e quase maior que eu, o rosto ainda redondo e as grandes bochechas coradas.

Minha tão linda irmã...

-Você está tão grande - brinquei, ainda emotiva demais.

Um sorriso travesso marcou o rosto de Sofia, que me cutucou a barriga.

-E você está gorda - provocou e sorri de nervoso.

-Não consigo sair daquela cafeteria -  admiti, fazendo uma careta - mas nem estou tão gorda assim.

-Está mais gorda que da última vez que nos vimos - contestou Sofia - Está quase tendo peitos de verdade.

-Sofia! - mamãe ralhou.

-Vamos logo para casa, não quero ouvir sobre os peitos da Kaki - papai nos chamou, resmungando e me tomando pela mão, como de costume.

O caminho para casa foi cheio de Sofia me contando sobre a escola e as amigas da escola.

Nunca me senti tão aliviada em não conseguir falar de nada a meu respeito.

Subi diretamente para meu quarto porque me sentia exausta e precisava dormir e mamãe não contestou, deixando mais do que claro que sabia o motivo.

Pela primeira vez na vida ela teve que me acordar para comer, o que não poderia ser mais que inconveniente para meu disfarce já inútil.

Como de costume, vomitei assim que levantei da cama logo após a saída de mamãe.

O jantar estava maravilhoso e não me contive de comer mais do que a lógica afirma ser possível, o que era perfeitamente normal.

Mantive minha conversa animadora com Sofia sobre sua vida em minha ausência e quis chorar ao notar o quanto havia perdido.

Então papai interrompeu.

-Mas nos conte, filha, como está a faculdade?

Eu já esperava por isso, ainda assim hesitei em dizer e quando falei minha voz saiu fina como a zoada de um balão furado.

-Muito bem...

Ele ergueu as sobrancelhas como se esperasse que eu acrescentasse alguma coisa, mas como me mantive calada, continuou o interrogatório.

-Não está mais gostando do curso?

-Não! - exclamei, alarmada com sua preocupação - eu realmente gosto, mas estou bem cansada, estudar é muito.... exaustivo.

Ele assentiu. E mamãe assumiu o controle do interrogatório.

-Está se alimentando direito? - perguntou - Não pode viver apenas de doces e pizza, vai acabar diabética.

Corei. Era exatamente assim que estava vivendo antes de Lauren Jauregui lotar minha geladeira de frutas, verduras e legumes e restringir minhas idas a sua própria cafeteria.

Nos exames que precisei fazer, minha glicose estava atingindo os limites do saudável e eu  também estava a beira de uma anemia.

Resumindo: graças a coisinha em minha barriga eu estava sendo obrigada a ter uma vida saudável.

-Nossa geladeira está cheia de coisas saudáveis, mamãe - a tranquilizei - não se preocupe.

-É mesmo? - questionou, desconfiada.

-É mesmo.

-O que jantou ontem?

Queria me pegar no pulo, esperta.

-Brócolis, cenoura e filé de frango com purê de batatas.

-E quem preparou tudo isso? Você não sabe cozinhar - Sofia acusou.

Lauren Jauregui.

-Ally - menti, me voltando para minha própria comida.

-Está bebendo água direito? Descansando bem? - mamãe interrogou - Você estava tão abatida e cansada quando chegou, não tem dormido?

Estava querendo me acuar até confessar a gravidez?

Com certeza.

-Estou me cuidando, mamãe - afirmei, tentando não ser grossa ou levaria uma chinelada na cara.

Ela me bateria mesmo estando grávida?

-Estava muito cansada da viagem e não dormi muito essa noite de ansiedade.

Mamãe assentiu.

Ninguém ousou questionar a falta de chinelas voando pela casa.

-Vou tomar um banho, me sinto sonolenta ainda - avisei ao terminar o jantar, me retirando da mesa quando meus pais assentiram.

Camila, você está ferrada. Pensei durante o banho.

Mamãe não iria parar com as indiretas e perguntas estranhas até conseguir arrancar uma confissão.

Enquanto me vestia liguei para Ally e em seguida para Lauren e avisei que estou viva e bem cuidada. As duas me ameaçaram pela demora reclamando do quanto haviam ficado preocupadas.

Passei alguns minutos com meus pais antes do cansaço me dar um soco na cara novamente e voltei para meu quarto para dormir.

Em momento algum mamãe parou de me lançar olhares acusadores. Eu estava ferrada. Eu estava completamente ferrada.

LIVRO 1 - TRILOGIA COMPLETA - With All My Love [Primeira Temporada]Onde histórias criam vida. Descubra agora