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–  Luke

  

    Vivemos sós, morremos sós, o resto é ilusão. Esta frase era o meu apoio desde há dois anos. Convencia-me de que as coisas boas eram uma ilusão, mas uma ilusão bonita. A Nina era então uma ilusão. Os seus olhos verdes escuros que eram parecidos a arbustos cheios de vida eram uma ilusão. O seu cabelo castanho claro que cheirava a amêndoas era uma ilusão. Os seus lábios rosados e finos eram uma ilusão. O som do seu riso que me fazia lembrar uma melodia era uma ilusão. As suas curvas eram ilusões. Ela era uma ilusão, mas uma ilusão bonita. Ela estava a mudar a minha forma de pensar, eu era diferente quando estava perto dela, e a minha mente estava doida talvez pelo facto de eu não saber como controlar isso. Podia ainda sentir as pontas frias dos seus dedos a passar pela minha bochecha carinhosamente e delicadamente, como se eu fosse um prato de porcelana que pudesse partir muito facilmente com um movimento brusco. Podia ainda sentir o seu olhar posto no meu rosto, podia ainda sentir o seu joelho a embater no meu, podia sentir a presença de duas camadas a impedir as nossas peles de se tocarem. Pela primeira vez tinha medo de morrer. Parecia que ainda não tinha experienciado tudo o que o Mundo tivesse para me oferecer.

    "Consegues explicar-me o que aconteceu?" – uma voz fez-me despertar dos meus pensamentos. Voltei à realidade, apenas num abrir e fechar de olhos.

    Encontrava-me sentado na ponta da cama de Nina. Estávamos ambos em casa dela, sozinhos. Ela tinha-me convencido a ficar cá. Sentia-me mal por ter arruinado a sua noite de filmes, mas ela insistiu em dizer para eu não me preocupar e reforçou a sua frase com um conjunto de palavras – "vales a pena". Eu sabia, pelo contrário, que não valia a pena, eu não merecia o seu esforço e dedicação, não merecia a sua preocupação. Mas Nina pensava que sim, e, sinceramente, não podia sentir-me mais feliz, lá no fundo, por isso.

    "A-Acho que sim" – tentei acalmar-me, respirando fundo inúmeras vezes. O meu olhar subiu até ao rosto iluminado de Nina. Os seus cabelos estavam ligeiramente despenteados e o seu olhar focado em mim, como se não houvesse mais nada no Mundo. Fiquei mais nervoso, como é óbvio.

    "E-Eu tinha chegado a casa e ouvi um barulho vindo da cozinha, então fui lá e vi o suposto namorado da minha mãe a beber de várias garrafas de vinho" – fiz uma pausa, para abanar a cabeça negativamente – "Fui estúpido ao ponto de pensar que o conseguiria parar" – olhei para o meu colo – "Caminhei até ele e agarrei na garrafa de vidro, mas acabei com ela espetada na minha bochecha" – ao lembrar-me da dor e da vulnerabilidade que senti naquele momento, senti os meus olhos em água – "Depois fugi de casa com o telemóvel na mão e liguei ao Calum enquanto andava até à sua casa" – encolhi os ombros, como se não fosse nada de mais.

    "Ele devia estar bêbado" – Nina respondeu, na sua voz habitualmente ternurenta – "Ninguém deveria de te agredir, Luke. Não o mereces"

    "O que mais me irrita é o facto de nem sequer o conhecer bem, entendes?" – olhei para a rapariga à minha frente, com lágrimas de raiva pousadas nos meus olhos – "A minha mãe só escolhe gente de porcaria, é sempre assim"

    "Ela pode não perceber, mas tem muita sorte em ter um filho como tu" – respondeu-me, continuando a olhar-me directamente nos olhos.

    "Não não tem" – falei com a voz firme – "Eu sou um fracasso, só gosta de mim pelas minhas notas" – suspirei – "Nem se iria importar se eu fosse atropelado por um autocarro. Provavelmente diria que eu era merecedor disso"

    "Mas não és, Luke" – Nina aproximou-se ligeiramente de mim – "E não és um fracasso, pelo contrário" – a sua mão foi até ao meu joelho, fazendo-me lembrar do pequeno momento que tínhamos tido – "Como já te disse, estou grata por te ter conhecido"

    "Nina porque é que me b-beijaste?" – arrisquei em perguntar. Ela logo pareceu admirada, pois a sua expressão facial mudou. A sua fria mão despediu-se do meu joelho e logo me senti incompleto, não sabendo bem o porquê.

    "Não sei" – respondeu, honestamente – "Precisavas de apoio, estavas a ter um ataque de pânico. Foi a minha forma de te ajudar. Distraí-te para que te acalmasses" – deu de ombros – "Vamos esquecer isso, não quero que interfira na nossa amizade, Lukey"

    "Lukey?" – soltei uma pequena risada ao ouvir a alcunha que ela me tinha dado.

    "Sim, Lukey vai ser a tua nova alcunha" – sorriu largamente, fazendo os meus problemas desvanecer pelos seguintes minutos.

    "Deita-te" – ela falou amavelmente, colocando-se por debaixo dos lençóis. O meu corpo ficou congelado.

    "Ah, não quero incomodar Nina, a sério" – acabei por proferir com alguma dificuldade e nervosismo. Ela ignorou completamente o meu comentário e tapou-me.

    "Queres mais mantas?" – sugeriu, ajeitando a cabeça na sua almofada.

    "Não, estou bem assim" – fiquei sentado na sua cama com as costas apoiadas num suporte. Nina suspirou e esticou o seu braço em direcção ao chão, apanhando depois três almofadas que colocou no meio dos nossos corpos.

    "Já te podes deitar, Luke" – voltou a repetir. Um suspiro escapou dos meus carnudos lábios, e, por própria vontade, o meu corpo deixou-se escorregar até a minha cabeça ficar pousada sobre a confortável almofada. Conseguia ver Nina mesmo assim. Apenas a luz do candeeiro estava ligada e fios da mesma embatiam na pele da sua bochecha suave.

    "Tens frio?" – ela inquiriu assim que me viu a estremecer. Eu estava completamente distraído devido aos seus lábios e à forma de como se mexiam quando ela estava prestes a dizer uma palavra.

    "Um pouco, mas eu estou bem" – disse honestamente.

    "Até ia buscar mantas mas estou demasiado preguiçosa" – sorriu e fez uma breve pausa – "Queres um... Abraço? Assim para te aqueceres" – finalizou. Entreabri os lábios, procurando por uma resposta na minha mente. Decidi desafiar a minha maneira de pensar uma vez.

    "Sim" – murmurei quase inaudível, continuando a olhá-la fixamente. Os lábios de Nina curvaram-se num pequeno sorriso. O seu corpo aproximou-se do meu em câmara lenta e segundos depois observei as almofadas que antes nos separavam no chão. Os braços finos e macios de Nina envolveram-se no meu tronco, puxando-me um pouco para si. Um som de espanto escapou da minha garganta e rapidamente olhei para baixo com vergonha enquanto um sorriso se aflorava nos meus lábios. Correspondi ao suposto abraço de Nina e encaixei os nossos corpos, sentindo as suas pernas entre as minhas. Coloquei o meu queixo no seu ombro e decidi tomar atitude pela primeira vez na minha vida. Desenhei pequenas figuras imaginárias nas suas costas com as pontas dos meus dedos, fazendo-a suspirar.

    "Boa noite, Luke" – sussurrou ao meu ouvido.

    "Boa noite, Nina"



Treehouse ➤ Luke Hemmings [Completed]Onde histórias criam vida. Descubra agora