April e Richie - na cozinha
- É merda, né? - Richie se virou para trás, largando a panela ensaboada dentro da lixeira e desistindo de uma vez de lavá-la.
- Saber que não posso falar nada porque alguém vai perder a paciência e me mandar sair de perto? - ela perguntou - Sim. É uma merda...
Ela olhou para algo no canto do chão da cozinha:
- Ei... Isso é - ela deu um passo para o lado e observou mais de perto - Maconha? - virou pra ele e riu.
- Haha. É. - ele também se aproximou, agachou sobre os joelhos e tocou algumas folhas - Das melhores. Já usou?
- Puta merda! Se eu já usei? Ela foi a causadora das melhores noites da minha vida. - ela passou as mãos pelos olhos e deu um sorriso largo. - E você? Planta pra vender ou usa?
- Os dois, na verdade. É como dizem: é difícil plantar pra vender e nunca experimentar.
- Como dizem... - ela refletiu - Quem disse isso?
- Não sei. Talvez eu. Hahaha.
Os dois riram.
- Eu só uso, mesmo - colocou a mão dentro do bolso da saia plissada e tirou três cigarros compridos de dentro.
- Se foi você que fez... Foi um trabalho muito bem feito - ele reparou, analisando de longe.
- Ah, não. Agradeça ao taxista que nos trouxe do aeroporto... Ele sabe das coisas - ela piscou o olho delineado e seus cílios cobertos de rímel se chocaram.
Ele percebeu como os olhos dela eram diferentes dos que já havia visto. Tinham traços orientais e eram de cor castanho escuro.
Lá fora, por um momento, as nuvens descobriram o céu e uma breve rajada de sol entrou pela janela, batendo no rosto dela. Os olhos mudaram de cor, ficando mais claros e tomando um tom mais avermelhado. Talvez cor pinhão.
- Quer experimentar? - ele perguntou, desencostando os cotovelos do balcão gelado e se desligando como que por um choque daquele breve momento de fascinação.
- Não tenho nada que me impeça, não é mesmo? - ela disse, com um sorriso agradável no rosto, enquanto o observava arrancar a planta e enrolá-la em um papel que tinha tirado de algum lugar - Você... - ela titubeou, olhando em volta e percebendo que não haviam utensílios culinários no lugar, apenas o balcão da pia, a planta de Richie e duas panelas dentro uma caixa de papelão, além dos poucos talheres, pratos e duas canecas com logos geeks. A lixeira metálica ficava praticamente no meio do caminho, e era fácil tropeçar nela se não olhasse por onde estava pisando.
- Eu? - ele perguntou, sem tirar os olhos do que estava fazendo, mas parando por um momento para ajeitar os óculos, que estavam deslizando pelo nariz como em um tobogã.
- Você planta desde quando? - ela não pareceu fazer a pergunta que tinha pensado em fazer anteriormente. Colocou uma mecha do cabelo escuro para trás da orelha.
- Já faz alguns meses... - ele finalizou o cigarro e o olhou de vários ângulos para ter certeza de que estava bom - Comecei quando vi que meu pai fumava também - ele o entregou pra ela, que colocou o cigarro ainda apagado na boca.
- Seu pai usa? Caralho... - ele rolou o dedão pelo isqueiro, que fez um rangido no começo, mas logo acendeu e ela se inclinou para frente para acender o que tinha entre os dentes - Ah, valeu.
- É... Na verdade meu pai usa tudo o que pode. É uma merda humana. Pó, maconha, heroína... - ele estendia os dedos a medida do que falava, contando tudo - Aquele filho da puta - ele falou baixinho.
- E você? - ela deu uma tragada e fechou os olhos por alguns segundos, sentindo os efeitos formigarem pelo seu corpo - Usa mais alguma coisa? - soltou a fumaça e passou o cigarro pra ele.
- Só cigarros. - ele soprou pela janela - Mas... Quem nunca, né? - ele perguntou, naturalmente; e passou o cigarro pra ela.
- Ela - April inclinou a cabeça para a sala, onde Spencer estava sentada no chão ao lado de Will - E o seu amigo. O... Bill, né?
- Will. É. O mais careta que eu já conheci.
- Isso porque você não viu Spencer - ela riu, olhando para a amiga - Só de ver fumaça já pira!
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Amor em Toronto
RomanceQuando duas adolescentes brasileiras - April e Spencer - de personalidades totalmente diferentes resolvem cursar a universidade no Canadá, conhecem Richie (um garoto rebelde) e Will (o nerd mais bonito do Campus) se apaixonar no campus não é tão fác...