Capítulo 5

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"Minha preciosa Agatha,

Em sua carta, você me perguntou como são os bailes em Londres. E eu me encontro em um dilema entre dizer a verdade ou dizer que estou me divertindo muitíssimo. Eu já posso imaginar você franzindo a testa e torcendo o nariz ao ler esse trecho, recriminando-me pelo meu pessimismo. É verdade que eu só compareci a dois bailes até o momento, mas ao meu ver, foram experiências mais que suficientes para formar uma sólida opinião. A temporada serve para criar alianças através do casamento, nada além disso, não se engane. Há pouca coisa que se pode aproveitar no meio desse tédio imensurável. Geralmente, a música é de qualidade, e não posso negar que valsar com belas jovens têm seu lado bom. Contudo, o resto... Você acreditaria se eu contasse que uma senhorita desmaiou em pleno salão pelo simples fato de outra jovem ter derramado um pouco de limonada em seu vestido? Quão sensível uma mulher é para deixar se abater por meras frivolidades? Causa-me desprezo essa demonstração pública de desequilíbrio. Eu jamais tomaria como esposa alguém demasiadamente fraca. Prometa-me, minha querida, jure pelo o que você mais ama que nunca será como elas. Sei que ainda falta alguns anos para seu debut, mas de pronto, eu já lhe advirto..."

(Londres, 13 de abril de 1865. Trecho escrito por Ethan Denbrook. Correspondência entregue.)

"Querido Ethan,

Não há nenhuma possibilidade que eu me transforme em umas dessas jovens de porcelana, que possuem a cabeça oca. Você me conhece, na história que você me contou, eu certamente seria a moça que derramou o copo de limonada. E teria grandes chances de não ter sido um ato acidental. Agora deixe-me contar sobre..."

(Gloucestershire, 29 de abril de 1865. Carta escrita por Agatha Crane. Correspondência entregue.)

De olhos fechados, fingindo um estado de inconsciência, Agatha prestava atenção na comoção que se desenrolava ao seu redor. O mais difícil, contrariando o que ela imaginara, não foi se manter imóvel. O que realmente lhe custou elevado domínio próprio foi prender o riso. Ela queria gargalhar de toda aquela situação absurda.
- Traga meu vidrinho de sais agora mesmo. - ouviu a voz da sua mãe rugir em algum lugar próximo ao seu corpo estirado no chão.
- Seria melhor chamar um médico. - recomendou lorde Tilghman, por cautela.
Enquanto decidiam o que fazer para acordá-la, Agatha esforçou-se para ouvir o que Ethan dizia, mas a sua voz era a única que se manteve em silêncio. Excelente, refletiu ela, certamente àquela altura ele estaria fazendo um cálculo,usando apenas a mente, para contar em quanto tempo ele chegaria em Londres se partisse imediatamente. Oh, não. Era claro que não. Agatha não poderia ser ingênua a ponto de presumir que tudo se solucionaria tão facilmente.

Pensando mais profundamente, a partida antecipada de Ethan Denbrook não lhe agradaria tanto quanto tê-lo ali, ao seu alcance, para acertar as contas do passado. Santo menino Jesus! Ele a tratou com uma cortesia plácida, como se os últimos seis anos nunca houvesse existido. Ela não tinha nenhuma importância para ele, como já suspeitara.

Quando a fragrância pungente dos sais invadiram suas narinas, a jovem lembrou-se que precisava despertar. Lentamente, seus olhos foram se abrindo, como se estivessem desfocados. Sua mãe estava inclinada sobre ela, com uma expressão indecifrável no rosto. Isabella abaixou para envolver a filha em seus braços.

- Oh, bendito seja Deus! Minha menina está bem. - exclamou a Sra. Crane efusivamente. Aproximando-se do ouvido da filha, ela sussurrou, com discrição. - Eu e você teremos uma conversa mais tarde, mocinha.

- Eu também pensei que nunca mais fosse vê-la mamãe. - disse Agatha, teatralmente, em resposta. Sua voz soou emotiva.

Ela parecia bem.
Lorde Ethan se manteve distante, com receio de que a jovem se sentisse sufocada. Não havia muito o que ele pudesse fazer para ajudar. Aqueles não eram seus criados, de modo que não poderia desferir ordens, assumindo o controle da situação. Também não sabia quem era o médico daquele lugar. Por isso, apenas observou seus anfitriões agirem, e tentou não atrapalhar.
Ela parecia bem.
O pensamento não saía de sua cabeça. Pouco antes do mal súbito atingir a jovem, ele poderia jurar que um anjo imortal estava sentado ao seu lado, com sua figura etérea e radiante.
Ele viu que Agatha recobrava aos poucos sua consciência, e exalou aliviado. Aproximou-se para ajudá-la a se levantar do chão. Ethan não pôde deixar de notar a forma deslumbrante como ela caíra no chão. Não como uma fruta podre que desabou de uma árvore, mas pareceu que uma mão invisível a posicionara confortavelmente sobre o piso de madeira. Ela era linda até mesmo desmaiada.

- Você se sente bem? - ele abaixou-se ao lado de Agatha, e examinou-a com o olhar. - Consegue levantar com a minha ajuda?

A jovem piscou algumas vezes, como se precisasse lembrar quem ele era. Pacientemente, Ethan esperou que ela fosse capaz de lhe dirigir a palavra.

- Eu me sinto tonta, mas acho que consigo ficar de pé. - assim que ela acabou de falar, ele viu seus olhos revirassem, suas íris quase desaparecendo sob as pálpebras.

Inferno. Ela não estava nada bem, de fato.

Ethan colocou as mãos nos braços dela, numa tentativa de acudi-la. Agatha agora parecia frágil e debilitada, o que fez com que ele quisesse tomá-la em seu colo e ir em busca de um médico, de um ajudante de médico, ou de uma parteira, até mesmo de um veterinário, caso não encontrasse um médico.

- Deixe-me carregá-la até seu quarto. - ele ofereceu em um ato impensado. Quando caiu em si, e viu quão inapropriadamente agira, ele virou-se para o Sr. Crane. - Peço que me desculpe, mas eu sou a pessoa mais forte aqui, e vocês podem nos acompanhar até o quarto, é claro.

Aquilo não poderia acontecer. Estar nos braços de Ethan seria um tiro pela culatra. Não queria que ele a tocasse. Já sentia-se incomodada com as mãos dele segurando seus braços.

- Lorde Ethan, não careço que me carregue. - disse apressadamente. - É muita gentileza sua, mas creio que com o auxílio de minha criada conseguirei chegar até meus aposentos. Ela já está acostumada com esse tipo de inconveniente.

Ele arqueou minimamente a sobrancelha esquerda, um pequeno gesto que ele não conseguiu impedir.

- A senhorita deveria consultar-se com outros médicos, para cuidar de sua saúde. Você está jovem demais para desmaiar frequentemente.

Ela deixou escapar um suspiro lento.

- Não é nada grave. - assegurou, movendo-se para tentar colocar-se de pé. - São meus nervos, apenas. Geralmente quando vivo uma forte emoção, meus nervos não aguentam e quando vejo já estou no chão.

- Ah. - foi tudo o que ele disse sobre aquilo.

Como enlouquecer um condeOnde histórias criam vida. Descubra agora