2017.
Saí correndo como uma doida do escritório do Théo. Nem cheguei ao primeiro lance de escadas para que as lágrimas começassem a cair dos meus olhos. Vi aquelas fotos minhas e abriu uma fresta no meu peito. As lembranças explodiram na minha mente e o choro foi inevitável. Estava com o rosto sobre os meus braços, apoiados em cima do volante. As mangas da minha blusa estavam molhadas assim como os pelos dos meus braços. O meu lábio inferior estava inchado de tanto eu mordê-lo de nervoso. Achei que tinha superado muita coisa, mas eu estava errada quanto a isso. O que vinha sentindo naqueles dias só me mostrava como fora tola em acreditar que o passado podia ser esquecido apenas ficando longe dele. Trancando-o numa caixinha nos fundos do armário. Mas é impossível se afastar de algo que está dentro de você. As recordações... As cicatrizes estavam todas aqui, em mim. Escutei um barulho do lado de fora, que me fez voltar dos meus pensamentos. Antes de levantar o rosto para ver quem era, fiquei com medo de que fosse um assaltante. As batidas eram fortes. Por curiosidade, dei uma olhada e me deparei com o Théo. Estava com a cara e as mãos coladas no vidro da porta. Então, ele perguntou:
— Está tudo bem?
Respondi que sim com a cabeça, em seguida enxuguei o rosto.
— Tu está chorando, o que foi?
— Eu quero ficar sozinha — falei, sem saber se ele me ouvia fora do carro. — Dá licença.
— Eu vou ficar aqui até que tu abra a porta. — Ele continuou batendo no vidro. — Ninguém chora por qualquer coisa, aconteceu algo.
Olhando para ele todo engomadinho embaixo daquele sol escaldante imaginei que logo desistiria e voltaria para o conforto da sua sala refrigerada. Deitei a cabeça sobre o volante de novo. O som das batidas cessou. Após alguns minutos, espiei por entre meu braço e o volante, bem de rabo de olho. Para minha surpresa ele continuava plantado feito um pé de jaca do lado da porta. A camisa molhada de suor nas costas. Fiquei com dó do rapaz. Acabei cedendo e destravei a tranca da porta. Não estava com vontade de falar nada com ninguém, mas não poderia deixar Théo do lado de fora, com aquele sol de derreter o cérebro sobre a sua cabeça e o asfalto quase esfumaçando sob seus pés.
— Quer conversar? — Perguntou Théo sentando no banco de passageiro.
Fiz que não com a cabeça.
— Ok. Eu fico aqui usufruindo do teu ar condicionado então. — Ele brincou enquanto fechava a porta.
Aquele não era um bom momento para conversar, eu estava com o humor de um crocodilo e a delicadeza de um cavalo selvagem. Ainda que involuntariamente, eu daria alguns coices nele. Théo queria eu falasse a respeito de algo que eu não gostava de compartilhar, não só por me deixar para baixo como também por vergonha.
— Eu quero ficar sozinha, dá para você ir embora — falei com o som da minha voz abafado sobre o volante. — Que saco, viu.
— Certeza? A gente pode tomar um suco e tu me conta o que aconteceu — insistiu. — Está muito quente hoje, um suco bem gelado ou um sorvete cairia bem.
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A Menina do Casulo
RomanceSINOPSE: Elisa Meyer é uma mulher solitária que guarda no corpo e na alma marcas de um passado cheio de traumas e mágoas. Ela nasceu com uma deformidade no rosto em decorrência de uma falha congênita, isso fez com que ela sofresse muitas agre...