Mesmo com toda a insistência para que eu ficasse mais tempo, deixo o apartamento da minha mãe um mês depois. Não havia a necessidade de ter ficado por lá durante tanto tempo, mas me ajudou em muitos sentidos.
Nós duas reconstruímos nossa relação nesse tempo. A cada dia ela conquistou um pouco mais de minha confiança e eu pude receber o afeto que ela me negou na infância. Me permiti ser mimada por ela e consertamos os erros do passado. Meus laços com Doug e Lacey também se estreitaram e finalmente senti que eles eram minha família.
Minha mãe também me contou tudo que podia sobre Luna. Lemos seus diários e a cada dia que passava eu tinha cada vez menos certeza do motivo de ela ter voltado por meio de mim. Passei horas enfiada em livros, lendo tudo sobre reencarnação, mas tudo continuava um mistério para mim.
Lendo os diários de Luna, conheci mais sobre seu passado. Ela foi a filha de Afrodite mais diferente que já conheci. Não era fresca ou fútil, era aventureira. Ela se preocupava por seus amigos e sua família, se parecia comigo em certos aspectos. Alguns dos relatos dos diários se assemelhavam aos meus sonhos. O último escrito foi de um dia antes do acidente e relata que ela tinha discutido com seu melhor amigo, Jonah.
Esse nome despertava algo em mim, sabia qual deveria ser meu próximo passo.
Como psicólogo, Doug conhecia muitas pessoas e com um trauma daquele tamanho, não foi difícil localizar quem eu procurava. Por fim, acabou sendo um dos pacientes de um colega muito próximo do meu padrasto. Ele, teoricamente, não podia compartilhar essa informação. Uma questão de ética profissional, mas eu sei ser muito persuasiva quando quero.
- Tem certeza disso? - minha mãe pergunta enquanto eu arrumo algumas coisas que ela me deu para ajudar em minha busca.
- Tenho, mãe. É a única forma.
Fecho a bolsa e me dirijo até a sala, onde Doug se prepara para sair.
- Laila, foi um prazer conhecê-la, sinta-se a vontade para voltar quando quiser. - sorrio para ele, educada.
- Vou voltar, eu prometo. Doug, nem sei como agradecer sua ajuda. Obrigada, de verdade.
Meu padrasto abre um sorriso comovido antes de me abraçar e sair para o trabalho. Lacey está na escola, de forma que não posso me despedir dela, mas sinto que ainda vamos nos ver várias vezes. É como se eu tivesse uma segunda chance com Josh, pois os dias que passei com ela pude notar que as personalidades eram bem parecidas. Me senti feliz por isso.
- Bom, acho que está na hora de você partir...outra vez. - minha mãe entra na sala suspirando. - Filha, quero que saiba que pode voltar quando quiser. Eu estou muito feliz que tenhamos resolvido as nossas diferenças.
- Eu também, mamãe. Vou voltar, prometo. - a puxo para um abraço e sorrio. - Nos vemos logo, sim?
...............................................................
Uma surpresa me aguarda assim que saio do prédio. Paro, sem saber ao certo o que fazer. Considero entrar novamente e ficar mais uns dias com minha mãe, mas já é tarde de mais, ele me viu.- Podemos conversar?
- Will? O que faz aqui? - ele se aproxima de mim com as mãos nos bolsos de seu casaco.
- Eu precisava te ver.
- Não foi você quem disse que deveríamos dar um tempo?
- Não. Deve ter sido alguém bem babaca pra pedir pra ficar longe de uma garota tão incrível. - ele sorri, na tentativa de dar um tom mais amigável à nossa conversa. Não esboço nenhum sorriso.
As primeiras noites na casa de minha mãe não foram fáceis. Eu tinha que decidir se confiava nela, eram várias questões assustadoras sobre meu passado e, pra tornar a situação ainda mais difícil, Will não me saía da cabeça.
Passei noites em claro debatendo se deveria continuar a pensar nele, até que decidi que não. Deveria seguir em frente, afinal, havia sido escolha dele romper nosso noivado. A culpa não era minha. Aquela foi a última noite que pensei nele e chorei por ele. Mas agora ele estava ali, em pé em frente a mim, querendo conversar. Eu não esperava nada disso.
- Você fez sua escolha, Will. Achei que tivesse consciência disso.
- Eu sei. Fui um estúpido.
- Você sabe que dia seria hoje, não sabe? - pergunto com uma ponta de amargura na voz.
Ele apenas assente. Claro que sabe qual dia é hoje. Seria nossa primeira semana como casados. Nós estaríamos voltando da Itália, da nossa lua-de-mel, felizes e nos preparando para o resto de nossas vidas como marido e mulher. Mas claro que o ego ferido dele ficou entre isso, porque ele simplesmente não pôde aceitar um não como resposta.
- Sabe, uma pessoa me abriu os olhos recentemente. Eu nunca luto pelo que quero, eu simplesmente me sento e assisto tudo o que amo partir. Você sabe minha história. Sabe como eu era apaixonado por um garoto e como fui estúpido o suficiente para perdê-lo. Agora eu estou fazendo o mesmo com você e eu odeio isso. Não quero te perder depois de tudo que passei pra te ter. - ele retira o anel que eu deixei no Acampamento antes de partir do bolso. - Me perdoa, por favor. Me deixa consertar o que eu fiz.
Tenho consciência das lágrimas que borram minha visão. Passei semanas fantasiando Will me pedindo perdão, então por que eu não podia simplesmente aceitar aquilo? Ele parecia realmente arrependido afinal.
Então eu entendi que não era ele, mas eu. Quando mergulhei nessa aventura em relação ao meu passado, eu não sabia quanto tempo levaria. Não foi Will quem estragou as coisas entre nós, eu muito menos. Tudo era exatamente como deveria ser. Olho no fundo daqueles olhos, sem conseguir conter a dor que cresce no meu peito ao ver todo aquele sofrimento refletido no lugar onde sempre vi tanto amor e bondade, enquanto nego lentamente com a cabeça.
- Não há nada a ser consertado, Will. Tudo é como deveria ser. - ergo a mão para conter o protesto assim que ele abre a boca. - Eu estou finalmente descobrindo quem eu sou, não vê? Talvez, tudo aconteceu da forma que aconteceu para que eu pudesse finalmente me acertar com meu passado.
Lágrimas rolam pela face dos dois enquanto nos encaramos. Ao dizer aquelas palavras em voz alta, vi sentido na minha busca e vi onde Luna se encaixava em tudo: ela era a garantia de que eu faria as pazes com meu passado.
Depois de alguns segundos, Will se aproxima inesperadamente de mim e me puxa para um abraço.
- Espero que encontre sentido em tudo o que está fazendo e que isso te traga alguma paz. - ele me encara por alguns segundos e, sem que eu possa reagir, ele me beija por um segundo, antes de sussurrar um "eu amo você" e me dar as costas.
Enquanto ele se afasta, eu fico ali, totalmente petrificada, sentindo cada pedacinho de mim desmoronar.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Crônicas de uma Filha do Mar🌊
Hayran Kurgu°SÉRIE "Contos de Semideuses" - LIVRO II° Depois da missão de resgatar Piper McLean, Laila, a filha de Poseidon, se vê ainda mais assombrada por seu passado. Sua vida entra em um turbilhão: tem que lidar com os preparativos de seu casamento com Will...