Capitulo 14

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Pov. Camila

Estou na recepção da agência de publicidade da minha família, aguardando meu avô terminar uma reunião. Uso uma saia preta de pregas, apenas dois dedos acima do joelho, e uma baby look vermelha com um coração amarelo no centro, por dois motivos. A saia porque é comprida o suficiente para que ele aprove, e a baby look porque tem as cores da Espanha. Quer ver vovô feliz? Lembre-o de sua terra natal. Na verdade são três motivos: o All Star vermelho foi presente da vovó.

A recepcionista diz que posso entrar, e assim que ele coloca os olhos em mim seu sorriso surge. Ele capta a mensagem que quero passar e também sabe que fiz de propósito.

— Cariño, sabe que fico triste quando preciso ligar para que você venha aqui. — Ele me abraça e a razão de eu fugir está aí. Seu cheiro, sua postura e seu tom de voz são iguais aos de meu pai, apesar de serem pessoas diferentes, tanto em personalidade quanto em aparência. Tem também a presença de um forte sotaque espanhol. — Sua avó também está com saudades. Você e sua irmã não podem se isolar assim. Aliás, não gostei nada da sua irmã cancelar o almoço. Ela disse que passa em casa depois, mas fiquei decepcionado.

— É uma fase complicada. — Eu o observo se sentar outra vez e apontar para a cadeira vaga de frente para a sua. — A gente não ia almoçar?

— Vamos, sim. Só estou esperando uma pessoa.

Eu me sento, ajeito a saia, passo os olhos pela mesa perfeitamente organizada e vejo a foto de minha família, que antes ficava na mesa do meu pai.

— Como está sua mãe? — ele pergunta, entrelaçando os dedos e descansando as mãos sobre o colo.

— Daquele jeito... — O que dizer?

— Ainda acho que devíamos mandá-la para uma clínica. Assim ela receberia todo apoio possível. — Ele se inclina mais para perto de mim, tentando segurar minha mão sobre a mesa.

— Ela não aceitaria. — Eu me afasto. Ninguém vai internar minha mãe.

— Podemos fazer isso sem a autorização dela. — Ele quer me convencer.

— Não. — Fico ereta na cadeira, na defensiva.

— Hoje é um dia especialmente difícil para a sua mãe.

Expresso confusão ao olhar para ele. Não sei do que está falando.

— É o dia em que ela e o seu pai se conheceram.

Eu não fazia ideia. Meu vô tem uma memória surpreendente.

— Ela estava à mesma quando saí. — Não que isso seja bom. — Vou voltar para casa depois do almoço e passar o resto do dia por perto.

— Soube que você tem saído bastante... — ele comenta, aproveitando o tema.

Vovô é muito bom em jogar o tema certo na hora certa, preparando a pessoa para tocar no assunto que ele quer.

— Na verdade, passei o último mês praticamente todo em casa. Exceto pelos últimos dois dias. — Ele pega algumas folhas de papel.

— O relatório de entrada e saída da casa mostra horários preocupantes.

— Vovô, você sabe que é errado controlar nossos horários. Meu pai nunca fez isso. Não somos mais crianças. — Meu tom é brando e cuidadoso. Se eu despertar sua curiosidade, será pior.

— Vocês sempre serão minhas crianças. E já perdi uma esse ano, não quero perder outra. — Ele se refere, claro, a meu pai, tocando bem no ponto fraco.

Coração perdido (G!p)Onde histórias criam vida. Descubra agora