Capítulo 18

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Já havia transcorrido praticamente uma semana, desde o beijo entre o casal.
Laura esbanjava um sorriso a todo momento. Já Sebastian, horas ficava alegre; horas ficava em dúvida, se havia feito o certo.
A moça o tratava carinhosamente, e ele; não tinha como não retribuir seu carinho.
Os pais de Laura já tinham partido, junto com a empregada Hermínia. Para poupar um pouco sua tristeza, ia visitar o orfanato a demasia; ainda mais que aquelas crianças também hão de partir. Poucas foram adotadas. O casal estava a tentar com que todos fossem. Porém, a cada dia chegava outras mais.
A menina Isabel, tinha a infelicidade estampada no rosto. A pequena tinha se apegado aos colegas, principalmente por Laura.
- Bom dia meu querido! – Cumprimentou Laura a seu amado, dando-lhe um rápido beijo nos lábios.
- Bom dia, minha linda Laura. – Ele estava sentado em sua cadeira no escritório. A jovem chegou mais perto e o abraçou. Logo depois, sentou-se em seu colo e abraçou o pescoço dele.
- Você tem estado muito à vontade, nestes últimos dias. – Ela sorriu.
- Eu sei. Quanto mais fico perto de ti, mais me sinto bem.
- Bom saber disso.
- Vejo que finalmente pendurou o seu quadro na parede. – Laura analisou.
- Sim. Estava indeciso onde colocar. – Ele pensou e coçou a cabeça. E em seu momento de distração, Laura o beijou apaixonadamente. Passando suas mãos pelo abdômen de Sebastian. Ele a parou. – Vamos tomar café?
- Sim. – Laura se pôs de pé, um pouco chateada. Ela ansiava por aqueles toques há dias. No entanto, sabia que com Sebastian, tudo seria devagar.
Chegando a sala de estar, o casal sentou-se e Teresa foi logo servi-los.
Instantes depois Franco chegou afoito no cômodo.
- Senhor! Senhor! – Ele gritava. – Não acreditará no que aconteceu! – Franco carregava consigo um jornal.
- O que houve Franco? – O patrão perguntou.
- É sobre a guerra. – Ele entregou o jornal a Sebastian.
- Meu Deus! Espero que não tenha acontecido algo terrível. – Laura fez a prece, receosa.
- Laura! A guerra... – Ele pronunciou. – Acabou! – Laura ficou de pé, encostando sua mão direita na boca.
- Mas como foi isso?
- Pelo o que jornal diz, os soldados invadiram a casa de Hitler e sua esposa foi encontrada morta. E o próprio também. Se suicidou.
- Meu Deus! – Disse Laura. – Esse homem devia ter ficado vivo para sofrer na cadeia!
- Sim, meu amor. Mas o ditador sempre dizia que preferia a morte do que a prisão.
- O senhor deve se encontrar muito feliz. – Concluiu Teresa.
- Não faz ideia do quanto! Franco, leve-me a casa de Osório. Agora que este pesadelo acabou, preciso resolver algumas coisas. Estarei de volta para o almoço. – E ele se foi, sem dizer adeus a sua esposa ou lhe dar um beijo.
Laura ficou triste e saiu rapidamente da sala e foi para seu quarto.
Começou a andar, ela estava desesperada.
TOC TOC
- Entre. – Laura respondeu e Teresa entrou em seguida.
- O que aconteceu Laura? Você está com um semblante preocupado. – A patroa suspirou.
- Realmente estou preocupada, Teresa. – Ela cruzou os braços. – Será que Sebastian há de voltar para Alemanha?
- Não sei, Laura. Mas porque tamanha preocupação?
- E se ele querer voltar e não me levar junto?
- Acho muito difícil a segunda opção. – Teresa riu. – Tenho absoluta certeza de que ele a levaria para onde quer que fosse. Ainda mais agora, que estão a se entender.
- Você pode ter razão. Melhor eu ir visitar minhas crianças no orfanato. Venha comigo, Teresa.
- Tenho trabalho a fazer.
- Deixe isso para depois. Você será minha acompanhante, isto é uma ordem!
- Está bem. – Laura pegou sua bolsa e junto com sua mais fiel companhia, foram passear.
........................
O relógio marcava mais de três horas da tarde e Sebastian encontrava-se em seu escritório, escrevendo no diário.
" 2 de Setembro de 1945
Finalmente a Guerra terminou. Achava que este dia nunca chegaria; estou mais do que contente. Estou livre. Posso dizer meu nome as pessoas sem medo de que me mandem de volta para minha terra.
Nunca pensei que me esconder no Brasil, traria minha felicidade. Me casei com a moça mais bela e amorosa que poderia encontrar; eu a amo e sou retribuído com o mesmo sentimento; ela não sente mais medo de mim e muito menos pena, pela minha condição física.
Por muito tempo, achei que ninguém me amaria, mas ela o faz e não tem medo de demonstrar. No entanto, ainda tenho medo de me entregar a este amor e depois sofrer, pelo fato dela perceber que não sou eu quem ela ama. Mesmo sabendo que seu grande amor não deve voltar jamais, ela pode não me querer. A cada dia, Laura pede mais essa entrega e meu corpo também. Só ainda não fiz, por medo. Diria que essa palavra me resume neste momento."
- Deus, o que devo fazer? Me dê uma resposta. Lhe suplico. – Sebastian orou, com esperança. Ele desejava encontrar uma luz no caminho, como resposta. Estava atordoado. Não sabia o que fazer ou pensar.
Sebastian levantou-se e rumou até o quarto de sua amada. Bateu na porta e entrou assim que sua entrada foi concedida.
Encontrou Laura de costas, olhando pela janela.
- O que tem sua atenção?
- Estou apreciando as estrelas. – Sebastian foi andando até ela. – Gosto de pensar que minha irmã virou uma delas.
- É um gesto lindo.
- Sim. Eu tenho conversado com ela assim. Não pense que fiquei louca, mas é meu jeito de sentir melhor.
- Nunca pensaria que ficou louca, meu amor. – Apesar dele estar com medo de se entregar a este amor, não deixava de pronunciar as palavras "meu amor". – Você é apenas uma pessoa doce. – Laura sorriu e foi até os braços dele e ficou ali durante um tempo.
- Você está tenso...
- Toda vez que me toca, fico assim.
- Isso seria bom? – Indagou Laura e o homem ficou um tanto surpreso com a pergunta.
- Talvez sim. Talvez não. – A moça suspirou.
- Me responda uma pergunta?
- Se eu souber a resposta... – Laura suspirou e soltou-se dos braços dele. Tomou uma pequena distância para ver sua reação.
- Você pretende voltar para Alemanha?
- Por que pensa nisto?
- Porque logo que soube da notícia, fora atrás de Osório. – Concluiu.
- Sim...mas por outro motivo. Pedi à ele que conseguisse um documento para eu trabalhar em minha profissão.
- Não. Acredito. Você quer voltar a ser médico? – Laura perguntou, completamente entusiasmada com a possibilidade.
- Sim. Eu sinto falta de ajudar as pessoas, salvá-las.
- Isto é maravilhoso meu amor! Estou muito contente por você.
- Agora me responda você. – Laura arqueou suas sobrancelhas, em uma forma de interrogação. – Você se sentiria mal se mudássemos para Alemanha?
- Nós? Eu achei que...você pretendia voltar e... Sozinho. – Sebastian abriu um pequeno sorriso.
- Meu amor, saiba de duas verdades. Eu não quero voltar para minha terra. Aquele lugar só me traria péssimas lembranças e estou feliz por viver neste país lindo. E por último, não ficaria sem você por nada. Eu a levarei para qualquer lugar que for.
- Mesmo? Porque, às vezes, lhe acho tão distante...e você não se entrega por completo, como eu fiz. Não é somente pelo fato de não ter consumado o nosso casamento, mas também, me parece com medo.
- Não vou mentir para ti, Laura. Estou com medo sim. Porém, não se preocupe. Só preciso de tempo.
- Tudo bem. Eu esperarei. Mas...fique aqui comigo. Quero sentir seus braços em mim. Ainda que não aconteça nada.
Sebastian pensou e pensou. Relutou um pouco; repensou mais uma vez e decidiu por fim aceitar. Ele apenas passou em seu quarto para tomar um banho e trocar de roupa.
Quando voltou, encontrou Laura já deitada em sua cama, lendo um livro de poesias.
- Achei que não gostasse de poesias... – Sebastian pronunciou, enquanto deitava-se.
- Quando a gente se apaixona, passamos a gostar de tudo que seja romântico.
- Espere... Eu conheço este livro. – Laura fez uma careta de que havia sido pega em flagrante.
- Roubei de sua mesa. Desculpe.
- Você tem se mostrado uma dama de terríveis costumes.
- Sempre fui assim. Você que não percebera antes. – Ele riu. – Leia algo para mim.
"Memória
Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão
Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.
Carlos Drummond de Andrade."



Assim que Laura terminou de ler, percebeu que Sebastian havia pegado no sono. Depositou o livro na mesinha ao lado de sua cama e contemplou mais um pouco o rosto daquele que ela amava.
Laura não via mais as marcas naquele rosto, pois ela o via com amor. E quando alguém passa a ver o próximo com um sentimento lindo desse, não vê defeitos ou marcas. Apenas ama. Com todo seu coração.
Laura apagou a vela que iluminava o quarto e antes de tentar pegar no sono, chegou mais perto de Sebastian. Puxou seu braço e depositou em sua cintura.
Ela dormiria plenamente.

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