Capítulo XXV - Cinta-liga cor-de-rosa

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AVISO DE CONTEÚDO SENSÍVEL •

(violência doméstica)

As noites tornavam-se frias e os dias nublados ao passo que as frentes frias aproximavam-se do Hemisfério sul. Helena decidira passar um tempo no Rio de Janeiro para fugir do inverno petropolitano e hospedou-se com os filhos e o marido na casa dos pais. Por mais que gostasse da tranquilidade de sua casa, a agitação de estar na cidade lhe fazia bem. E, claro, acompanhar a prima em suas farras e escapadas era um passatempo mais do que bem-vindo. O que lhe entristecia era sua amiga. Marieta mal saia de casa; passava o dia arrumando coisas que não precisavam ser arrumadas, plantando e desplantando flores no jardim, lendo novelas de folhetim e indo à missa.

– Nêta, não preferes chamar alguém para fazer isto? – Perguntou Helena, enquanto observava a amiga encaixotar os pertences de seu falecido marido.

– Não há necessidade. – Respondeu uma Marieta.

– Não sei se isso lhe faz bem. – Comentou Helena, começando a ajudar a amiga. – O que pretendes fazer com este escritório?

– Fechar. – suspirou – E manter fechado. – Informou Marieta, fria, mas muito doce, como sempre.

– É, talvez seja melhor.

As duas continuaram empacotando os pertences das estantes em silêncio. Marieta dirigiu-se até a escrivaninha e começou a recolher o que estava em cima - papéis, alguns livros, tinteiros e objetos de trabalho –, tudo ainda intocado desde que Lourenço estivera ali pela última vez.

– Acho melhor recolher esses papéis, pode ser que Benício precise deles na empresa. – Comentou Marieta, recolhendo as folhas, cadernos e pastas de cima da mesa.

– Tens razão. Aqui, há uma caixa vazia aqui. – Disse Helena, estendendo a mão para tomar os papéis.

Helena guardou os objetos na caixa e permaneceu em silêncio recolhendo as coisas de uma das estantes. Não era exatamente como pretendia passar seu dia, mas sua amiga precisava de companhia, embora não dissesse – não havia nada que Marieta detestasse mais do que incomodar, mas, após anos de convívio, Helena sabia exatamente quando era preciso se fazer presente.

Marieta começou a esvaziar as gavetas da escrivaninha, separando apenas os papéis que julgava importantes para entregar para o irmão mais tarde. Ao abrir a primeira gaveta da direita, sua expressão denunciou um estado de choque profundo.

– Mas o que... – Disse ela, com a voz falha.

Helena virou-se para ver do que se tratava. Marieta encarava a gaveta.

– O que houve, querida? – Perguntou Helena, aproximando-se.

Marieta pôs a mão na gaveta e tirou algo de lá. Quando ergueu o braço, Helena viu sobre o que se tratava. Era uma cinta-liga cor-de-rosa.

– Como as... – Começou Helena.

– Isso não é meu. – Esclareceu Marieta com a voz estrangulada.

– Nêta, querida, eu... – Helena estava em choque, não sabia o que dizer para a amiga.

– Não, não. – sorriu – Tudo bem. Está tudo bem. – Marieta soava desconcertada. Seus olhos estavam marejados, mas ainda forçava aquele feio sorriso triste.

– Eu sinto muito, querida, eu... – Helena buscava palavras além da raiva do defunto naquele momento, mas nada reconfortante vinha em sua cabeça.

– É claro que ele tinha uma amante. – Disse Marieta. Parecia falar mais consigo mesma do que com Helena. – Por que não teria, não é mesmo? Tudo bem, tudo bem. Eu deveria saber. Ou, ao menos, presumir. Por que... Por que estou surpresa, não é mesmo? – riu – No fim das contas, a culpa é minha. É isto que acontece quando...

Castro e SouzaOnde histórias criam vida. Descubra agora