Porão misterioso

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  A dor era insuportável.

  Rachel tremia ao entrar na banheira do quarto de hóspedes. Fez questão de preparar o próprio banho com água gelada. Seu corpo estava muito fraturado, porém já se curando de todos os ferimentos devido ao sua cicatrização rápida. Uma das vantagens de ser uma vampira.

   Aproveitou já estar morta para se deitar por debaixo da água e pensar no motivo de estar fazendo aquilo. Se destruindo, se machucando, se torturando daquela forma. Valia de fato a pena? No fim nada foi feito, nada havia mudado. As vezes ela pensava se seu tio fazia isso por que queria ajuda-la ou por que estava apenas a testando.

  E então veio as lembranças... 

  Agora, viver presa dentro do castelo não parecia uma ideia ruim, já que pelo menos naquela época ela era humana. E tinha uma amiga...

"Johanne..." — Pensou, e se ela não estivesse debaixo d'água, estaria com os olhos cobertos de lágrimas .

  Lembrou-se de Vlad e Lilian, não só de ambos como também se lembrou da infância, e do amor que tinha. Que por mais rígidos seus pais fossem, as vezes eles mostravam afeto.

  Rachel sentia pela sua mãe que também faleceu no castelo. Todos morreram.

  Sua família fora massacrada. 

  E então, de tristeza, Rachel passou a ter raiva. Abriu os olhos mais uma vez vermelhos e emergiu da água segurando firme nas bordas da banheira de madeira rústica enquanto cuspia fora toda a água que seu pulmão engoliu.

— O que queres? — Perguntou uma voz familiar feminina pelo banheio. — O que desejas aqui? — Rachel olhou para frente e pressionou os dentes com ódio...

— Eu...

— Ela te tirou tudo... — Sussurrou alguém em seu ouvido. Porém a jovem vampira sabia que não havia ninguém por ali. — Te tirou a família. Te tirou a liberdade. Uma vida... Você perdeu TUDO! O que está fazendo aqui ainda?! — Perguntou sussurrando do outro lado do ouvido.

— Esperando respostas... — Rachel respondeu.

— A resposta que precisa está bem à sua frente. E então lhe pergunto mais uma vez condessa de bran. — Disse a voz desta vez surgindo à frente de Rachel como uma silhueta feminina segurando firme as bordas da banheira junto dela. Tão perto que se Rachel pudesse respirar e a moça também. Com certeza estariam trocando oxigênio naquele momento. — O que queres de verdade... Senhorita? — Era ela. Era Johanne.

— Quero vingança. — Respondeu e Johanne sorriu de forma diabólica. 

— Então se vingue. Me vingue. — Logo a imagem da serva simplesmente se dispersou como fumaça e Rachel se levantou da banheira exibindo a silhueta nua e molhada de seu corpo para fora.

  Do lado de fora do quarto havia uma roupa deixada por Van Alucard. Provavelmente de sua prima, um dos filhos dele. Ela tinha quase a mesma idade dela quando morreu.

  As duas costumavam brincar juntas sempre que ela ia para sua casa em sua infância.

  Agora só lhe restava vingança. 

  Van tinha razão. Os demônios são a praga do mundo, se não fossem por eles, sua prima e tia estariam vivas, sua família estaria viva. Ela estaria viva.

  Agora ela era um deles. Um desses bichos nojentos que matam pessoas. Rachel se igualava a eles e isso dava repúdio a ela.

  Por isso, precisava do tio. Se ela não pode ser curada, então iria obter vingança contra Elizabeth, e para isso teria de aprender a se controlar.

***

  Já não se via mais a imagem de Johanne. Aparentemente e obviamente era uma alucinação da cabeça da jovem Condessa. Rachel estava tão perdida em seus pensamentos que quase entrou no lugar errado da mansão e...

  Ou melhor...

  O que era aquilo?

  Ela viu pela fresta da porta do quarto de seu tio, um tapete vermelho fora do caminho onde possivelmente tampava a existência de uma pequena porta quadriculada no chão do quarto. A porta estava aberta, provavelmente seu tio estava lá embaixo. Rachel sentia isso. Deixou apenas a desconfiança de lado e decidiu avançar para o local de destino.

  O retorno dela para a cozinha na hora do jantar fora silencioso. Ela não dirigiu uma palavra ao seu tio desde o momento em que fora torturada.

— Quer parar? — Ele perguntou devorando a coxa do frango ao notar o olhar fixo de Rachel perante a ele.

— Quero encontrar ela.

— Ela? — Ele perguntou como se não soubesse do que se tratava.

— Precisa me treinar. Quero aprender a dominar minhas habilidades e...

— Está se escutando Rachel? — Ele perguntou largando o pedaço de frango e bebendo do vinho. — Quer dominar suas habilidades?? Até a pouco tempo queria voltar a ser humana. Não foi por isso que me desafiou?

— Nunca te desafiei, e jamais o obriguei a nada meu tio. Se não quer me ajudar, pois bem. Não ajude!

— Estou tentando!

— Não! Tudo o que faz é me torturar! Isso já não ficou claro pra ti, que não funciona?! Por que me odeias tanto? O que eu te fiz afinal?! — Perguntou pegando a garrafa de pano e se levantando para se dirigir ao quarto de hospedes e dormir livremente.

  Ao correr em direção ao quarto envolta a lágrimas Rachel parou no meio do caminho para encarar a porta agora fechada do quarto do tio.

  O que será que tinha ali embaixo?

  O que quer que seja... Rachel tinha um pressentimento estranho, de que devia ver o que era.

— Maldito sentido vampírico. — Respondeu retornando para seu quarto ao tentar mais uma vez beber daquele sangue ruim de um carneiro morto.






Alucard: O Início - Vol 1 - Uma história Renegados do Inferno - Vol 1Onde histórias criam vida. Descubra agora