POV Edmilson
Hoje é sexta, terminei meu último trabalho e irei entregar amanhã pela manhã.
- Vamos dar uma volta? Está passando um filme legal no cinema – Paty sempre me convida e é a única que me tira de casa, não gosto muito de deixar o meu canto.
- Não sei... Estou cansado.
- Deixa de preguiça, Ed. Lembra que me prometeu que iria da próxima vez que te chamasse.
- Tudo bem. Me dá uns minutinhos que vou me trocar.
- Pode deixar que termino de guardar seu material.
Volto alguns minutos depois e a encontro admirando meus quadros particulares, aqueles que me são mais caros. Ela é minha maior incentivadora e não se cansa de me dizer quanto talento tenho.
- Vamos para o cinema? – tento colocar animação em minha voz.
- Sim, vou só falar tchau para a vovó.
- Não pode esquecer. Ela gosta mais de você do que de mim.
- Não é verdade! Deixa de ser chorão – ela ri descontraída e saímos para a cozinha, onde encontramos minha avó, numa discussão com seu amigo José Magalhães.
- Cabra abestado, já te disse que vai tomá meu chá e pronto.
- Mas eu estou bem, Severina querida.
- Bem que vi você tossindo ontem no terço. Não me engana. Vai se cuidá que ainda tenho muitos planos para você.
- Tudo bem, eu tomo, mas não se zangue. Eu gosto muito dos seus chás, só não queria te dar trabalho.
- Trabáio vai me dá se ficá doente de novo – é divertido observar como minha avó manda no senhor idoso e ele obedece, temeroso de a irritar. É apaixonado por ela, e até já a pediu em casamento, mas minha avó não aceitou. Diz que já está velha de mais, porém cuida dele como uma esposa amorosa, mas mandona.
- Já estamos indo, vovó – Paty a abraça e beija e minha avó sorri encantada.
- Não que comer nada antes, menina?
- Vamos ao shopping, mas na volta experimento um de seus doces.
- Cuida dela direito, Edmilson. Estou achando ela magrinha por demais.
- Certo, vovó. Até mais, Sr. Magalhães.
- Bom passeio, meninos – me responde enquanto bebe seu chá, como ordenado.
Pego as chaves do carro de meu pai, que me empresta, agora que tirei habilitação. Faz apenas 3 meses que estou dirigindo, mas me sinto seguro e meu pai confia em mim.
- Ela não perguntou se eu queria algo.
- Por que você é de casa, não precisa de oferecimento.
- Você também é, até dorme lá às vezes.
- Só quando a situação na minha está muito difícil, você sabe.
- Não estou reclamando, é como uma irmã para mim – ela faz uma cara estranha, que não consigo decifrar, mas logo muda de assunto.
- Engraçado como o Sr. Magalhães aceita tudo que ela manda. Nem parece aquele senhor ranzinza que falavam no bairro.
- Vovó e seu jeitinho especial – ambos rimos muito, lembrando-nos do ar autoritário dela e da cara de cachorrinho obediente dele. Só perto da Paty me vejo rindo e fazendo piada. Algo nela me liberta.
Chegamos ao cinema a tempo para comprar os ingressos e a pipoca. Estamos nos sentando quando vejo Rodrigo se aproximar. Ele mudou-se para nossa escola neste segundo semestre e sempre procura desculpas para conversar com minha amiga. Algo nele me incomoda, talvez a forma como olha para ela, como se não pudesse desviar o olhar.
- Patrícia, que bom te encontrar. Não sabia que gostava de filmes de aventura – diz já a abraçando e beijando seu rosto.
- Oi, Rodrigo, tudo bom? – ela o cumprimenta sorrindo – Quer sentar-se conosco?
- Claro, meus amigos estão atrasados, ficarei com vocês, se não incomodar.
Ele se acomoda ao lado dela e iniciam uma conversa sobre filmes semelhantes. Contribuo com pequenos comentários aleatórios, me sentindo sobrando, apesar das tentativas de me incluir que Paty faz.
O filme finalmente começa, mas meu alívio dura pouco, pois o garoto não para de cochichar ao ouvido de minha amiga e ela ri do que ele está falando. Minha vontade é de ir embora, mas aguento firme até o final, nem sei direito o que aconteceu, em minhas tentativas de ouvir o que tanto falavam.
- Vamos tomar um sorvete? – ele pergunta quando saímos.
- Eu preciso ir embora – digo logo – Vamos Paty?
- Ed fica mais um pouco, ainda é cedo.
- Preciso mesmo ir. Se quiser carona, estou indo – falo ríspido, não sei por que, mas não suporto este cara.
- Eu levo você, Patrícia.
Ela me olha com um olhar que não entendo, suspira e diz que vai ficar. Algo desagradável se instala em meu peito e parto sem nem mesmo me despedir.
Chego em casa me recriminando por minha rispidez. Não sei o que aconteceu comigo, por que fui rude com a Paty.
Envio uma mensagem me desculpando, mas ela não vê. Umas horas depois, resolvo enviar outra, perguntando se ela chegou bem, mas continua sem visualização. Será que a conversa está tão boa que ela ainda não chegou em casa?
Fico na minha janela observando sua casa há alguns metros da minha. Posso ver seu quarto daqui e a luz está apagada. Talvez já esteja dormindo.
De repente, um carro para em frente seu portão e fica parado um tempo, até que a porta se abre e ela sai, com um sorriso no rosto.
Sinto um aperto em meu peito ao perceber que posso estar perdendo minha amiga para aquele garoto, e não gosto nem um pouco da sensação. Ela é a única pessoa que deixo se aproximar e não posso perdê-la. Porém, não devo ser egoísta e querê-la só para mim. Se ela encontrou alguém, tenho mais que torcer para que dê certo. Então por que a ideia dela com ele me incomoda tanto?
E este Rodrigo, hein? O que acham dele?
VOCÊ ESTÁ LENDO
Despertando para sonhar - Livro 4 da Série Sonhos
RomanceEdmilson perdeu sua namorada de infância para o câncer, e se fechou para todos, com exceção da melhor amiga de seu amor. Patrícia sempre foi apaixonada pelo namorado de Janaína, mas nunca sonhou que ele conhecia seu segredo. Antes de partir, confia...