Capítulo 36

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David não conseguira tirar o doutor Fernando Desforges de seus pensamentos. Ele salvara sua vida e depois desaparecera. Ficara contente por encontrá-lo de novo. Num súbito impulso, foi à American Dollar Shop, comprou uma linda tigela de prata para o médico, e mandou-a para a embaixada francesa. Era um pequeno gesto de agradecimento pelo que ele fizera. Naquela tarde, Dorothy Stone disse:

— Um certo doutor Desforges está ao telefone. Quer falar com ele?

David sorriu.

— Quero, sim. — Ele atendeu. — Boa tarde.

— Boa tarde, senhor embaixador. — A frase parecia deliciosa no sotaque francês. —
Liguei para agradecer por seu atencioso presente. Mas posso lhe assegurar que era desnecessário. Já tive o maior prazer por poder prestar-lhe algum serviço.

— Foi mais do que algum serviço — disse David. — Eu gostaria que houvesse alguma maneira de poder demonstrar realmente a minha gratidão.

Houve uma pausa.

— Não gostaria...

Ele parou de falar e David estimulou-o:

— De quê?

— Nada, nada...

Ele parecia subitamente inibido.

— Fale, por favor.

— Está bem. — Houve uma risada nervosa. — Eu estava pensando se não gostaria de jantar comigo uma noite dessas... mas sei como deve estar sempre ocupado e...

— Eu adoraria — David se apressou em dizer.

— É mesmo?

Ele podia perceber a satisfação na voz de Desforges.

— Claro.

— Conhece o restaurante Taru?

David já estivera lá duas vezes.

— Não.

— Ah, esplêndido! Então terei o prazer de apresentá-lo. Por acaso está livre na noite de
sábado?

— Tenho um coquetel às seis horas, mas podemos jantar depois.

— Maravilhoso! Soube que tem dois sobrinhos pequenos. Não gostaria de levá-los?

— Agradeço sua gentileza, mas eles estão sempre ocupados nas noites de sábado.

David se perguntou por que mentira.

O coquetel foi na embaixada suíça. Era obviamente uma das embaixadas da classe A,
porque o presidente Alexandros Ionescu estava presente. Assim que viu David, ele se aproximou.

— Boa noite, senhor embaixador. — Ionescu pegou a mão de David e segurou-a por mais
tempo do que o necessário. — Quero que saiba que estou muito satisfeito porque seu país
concordou em nos conceder o empréstimo que solicitamos.

— E nós estamos muito satisfeitos que tenha permitido que o grupo da igreja visite os  Estados Unidos, Excelência.

Ele acenou com a mão, como se isso não tivesse a menor importância.

— Os romenos não são prisioneiros. Qualquer um é livre para ir e vir, como quiser. Meu país é um símbolo de justiça social e liberdade democrática.

David pensou nas filas compridas esperando para comprar os alimentos escassos, a multidão no aeroporto e os refugiados querendo desesperadamente partir.

Ionescu acrescentou:

— Todo poder na Romênia pertence ao povo. Há gulags na Romênia que não temos permissão para ver.

Além Do Teu Olhar (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora