-Boa tarde, tenho consulta com a Dr.Mónica.
-Boa tarde, Ileana certo?
Sabendo que a resposta era sim mandou-me esperar um pouco, uma vez que frequento este sítio há mais de um ano era difícil não decorar o meu nome. Sempre que cá venho fico a mexer no telemóvel enquanto espero. É o método que todos nós usamos quando não queremos encarar alguém. Não quero desviar o olhar de ninguém em específico, quero desviar de toda a gente que frequenta este local.
-Ileana, podes entrar.
Chegando à porta cumprimentamo-nos simpaticamente como sempre.
-Olá.
-Olá.
Sentamo-nos as duas num consultório pequeno e a primeira pergunta que Mônica me faz é a mesma de sempre, como é que tens estado?
Sempre que Mônica me faz esta pergunta gera-se silêncio, para pôr fim ao silencio, que acaba por incomodar, digo que não sei. E posso dizer que é a resposta mais sincera que encontro para responder àquela pergunta que eu tanto evito. Já tinha andado numa psicóloga antes, mas tive de sair em vez de me sentir melhor sentia-me cada vez pior, saia de lá com uma enorme dor no peito e com um conjunto de sentimentos que pareciam ter como objetivo comerem-me viva. Aquelas consultas conseguiam fazer com que eu tivesse pressa em ir para o sítio que eu não tinha a mínima vontade de ir, casa.-Então? Já chegaste a alguma conclusão?- eu só gostava que Mônica desistisse da resposta pelo menos uma vez na vida, mas ela insiste sempre em tela.
-Eu não sei mesmo, acho que bem.
-Achas? Não tens a certeza?
No fim, para não ficarmos a matutar mais no assunto, acabo sempre por dizer que tenho a certeza. Claro que por vezes é impossível dizer que está tudo bem. Quando não estou bem explico o porquê e conversamos sobre isso. Dificulto o trabalho de Mônica quando digo que não estou bem mas não tenho motivo para tal, simplesmente não estou. Tenho muitos dias assim.
Há dias piores que outros. Há dias em que estou bem e há outros que sinto que não faço falta aqui e que seria muito mais fácil para mim não viver mais. Sem vida não há problemas, a vida é baseada em problemas, nunca estamos contentes com nada mesmo quando está tudo perfeito, quando a vida não tenta dar cabo de nós o nosso psicológico faz esse favor.
Depois da minha consulta, é sempre a minha mãe que me vem buscar e hoje não é exceção. No início, a minha mãe fazia o seu papel e perguntava como tinha corrido no fim de todas as consultas e do que falávamos, como nunca obteve uma resposta da minha parte, deixou de o fazer. Apesar de continuar a ter curiosidade, limita-se a perguntar apenas como correu.
Sempre fui vulgar e reservada, também nunca tive uma boa auto-estima, tenho 17 anos, 1,57m ( sim, sou baixa e ouço isso todos os dias), cabelo castanho encaracolado e comprido, olhos castanhos e um sorriso que por acaso até gosto.
A vida até pode conseguir fazer o favor de ser boa para alguns de nós, mas uma coisa vos garanto, não vai durar para sempre. Num dia podemos ter tudo e noutro podemos já não ter nada. Tudo o que foi construído a nossa volta, tudo aquilo que adorávamos, acaba por desaparecer um dia. O meu nascimento foi planeado, os meus pais amavam-se profundamente, só um cego é que não via isso. Em pequena, eles fizeram questão de me darem tudo o que um criança desejava, pais que se amavam, uma boa relação com o meu irmão mais velho, montes de brinquedos, amor, carinho, presença e educação. Eles tinham dinheiro, eram empresários de uma empresa de condomínios, a inteligência e o jeito para os negócios do meu pai e a organização da minha mãe eram óptimos aliados. Tinham de tudo para terem uma vida óptima durante muitos anos, mas o dinheiro consegue destruir tudo, até um amor tão forte como o dos meus pais.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Silêncio Profundo.
RandomIleana é uma adolescente com 17 anos. A sua vida deu uma volta enorme a uma dada altura da sua vida, como consequência dos atos de outras pessoas, Ileana teve de aprender a viver com duas coisas, depressão e mutilação. Transformou-se num coração de...