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Música: Expectations - Lauren Jauregui

Sempre achei interessante o ciclo de como uma amizade funciona.

Você conhece uma pessoa, conversa, vocês se encontram e convivem casualmente e se for da vontade maior do universo, vocês se dão tão bem que viram amigos.

Com Caroline não foi assim.

Eu sem dúvidas me dava bem com ela, tinha apenas um mês que eu morava no dormitório, mas nossa amizade evoluiu rápido e eu aprendi mais rápido sobre sua personalidade. Como ela gostava de falar e rir alto com frequência quando estava confortável, -Carol tinha um problema com horários, assim como eu.- Era mais criativa era o período da tarde e da noite, -Eu também não- e foram essas similaridades que nos aproximaram.

Ela me chamou inúmeras vezes para festas e rolês aleatórios. Porque se tinha algo que Caroline era, é aleatória.

Por vezes ela me convidava para os lugares mais inesperados que uma pessoa imaginaria para começar uma amizade. A primeira vez que saímos juntas foi para ir até o posto de gasolina.

-O pão de queijo de lá é gostoso.

Quem sou eu para recusar um convite sincero para comer pão de queijo por preços abusivos num posto de gasolina próximo à uma saída para rodovia?

De fato era um pão de queijo muito gostoso.

-Cansei de fazer nada sozinha.

Eu não negaria uma vaga em meu sofá para que ela se jogasse enquanto me assistia pintar, cozinhar, estudar ou até mesmo cochilasse em minha presença só porque não queria ficar sozinha.

Caroline era tão estranha que se tornava incrivelmente interessante.

O novo hobbie dela, é me observar enquanto eu pinto qualquer coisa. Descobri que ela cursa artes cênicas, o que é 100% a personalidade dela. Eu não digo que é "a cara dela" porque, honestamente, não é. Carol parece fechada, séria e mal humorada, mas o que basta é um olhar para que o sorriso travesso venha iluminar seu rosto. Ela é cheia de luz por dentro e isso é um fato incontestável.

Porém nesse dia em específico, Carol estava quieta.

Quieta demais pra ser Carol.

No início da madrugada, imaginei apenas que ela estava ocupada em algum hiperfoco em um novo interesse inusitado. Pensei que seria mais uma noite comum até as três e quinze, quando ouvi batidas na porta do meu quarto. Logicamente, sabia que era Carol. Só ela em todo o andar passava as noites em claro como eu. Mesmo assim, era um horário incomum até para ela. Carol costumava aparecer até as duas horas da madrugada caso quisesse companhia.

Deixei meu pote de tinta de lado e me levantei para abrir a porta. Caroline não tinha o sorriso brincalhão no rosto, ao invés disso, seu olhar era irritado e frustrado.

-Você acredita que ela ainda não voltou?

Ah! É mesmo.

Até entre todas as pessoas adoráveis e incríveis, todas tem um defeito. O de Carol era um defeito ambulante. Sua namorada, que morava dois andares para baixo.

O nome dela era Vitória mas todo mundo a chamava de Vi. Menos Carol.

Carol estava constantemente sendo magoada e ficando insatisfeita com ela. Então ela a chamava de Vitória mesmo.

Eu não gostava de Vitória. Muito menos ela gostava de mim, mas nós quase nunca nos encontrávamos, então não fazia muita diferença.

-Carol...- Eu abri espaço para que ela entrasse no quarto. -Talvez ela ainda esteja na boate...

Burra? Sim. Eu sempre aliviava as besteiras de Vitória porque queria muito ver Carol feliz. Gostar de alguém, para mim, sempre foi sobre isso. Mas ver Carol chateada em um vestido bordô de veludo, colado ao corpo, cabelo solto, brincos dourados e os tímidos Vans calçados aos pés à espera de uma mulher que não chegava era um absurdo.

-São três e quinze da manhã, Dayane.- Eu a observei sentar no sofá e desamarrar os tênis. -E eu sei que a boate fecha as duas da manhã. É sempre a mesma coisa! Sempre fala que vai vir me ver, que vai voltar pra casa, que vamos sair, que vai me dar atenção e nunca faz isso!

Caroline estava cansada e eu previ isso. Sendo honesta... Demorou para acontecer.

-Eu fico na cama largada imaginando onde ela tá e eu fico paranóica Day! Eu queria simplesmente não esperar mais nada dela. -A ruiva suspirou e me olhou, abraçando as pernas, os pés agora apoiados no sofá. -Não faz mais sentido nem pra mim esperar algo vindo dela... Ontem foi nosso aniversário de um ano e ela saiu com as amigas dela, prometeu que me levaria pra sair hoje e sumiu. Eu entendo que ela quer se divertir, mas eu preciso de atenção também...

Uma lágrima caiu pelo seu rosto e agora eu estava desesperada. Nunca fui boa em consolar pessoas chorando, um casual "realmente, é foda" aqui, outro "complicado" ali mas nunca sabia bem o que falar, muito menos para pessoas que eu não conhecia a muito tempo. Me contentei em me sentar ao seu lado e acariciar os cachos ruivos suavemente. Os braços se apertaram ao meu redor num abraço inesperado e seu rosto se escondeu em meu peito. Carol esbravejou baixo, indignada com todas as galáxias, estrelas e astros que colocaram Vitória em seu caminho.

-Você sabe que a galáxia e as estrelas não tem nada a ver com isso, né? -Eu falei me distanciando e passei os polegares pelas bochechas molhadas dela e lá estava novamente. O sorriso travesso. Um pouco tímido, mas na situação atual era até aceitável.

-Desculpa, eu só entrei sem pedir licença...- Ela falou em voz baixa, numa volta súbita a sua plena consciência.

-Carol, eu acho que nós já passamos da fase de licença na sétima vez que você entrou aqui sem pedir. -Brinquei e ela riu abaixando a cabeça e fungando enquanto enxugava os olhos. -Agora, eu sei que você amaldiçoou tudo só na hora da mágoa, mas acho melhor pedir desculpas pro Universo. Ele não gosta de moças que dão chilique.

Ela me olhou ofendida.

-Eu não dou chilique!- Ela bateu no meu braço. -Eu só perco o controle. De uma forma exagerada.

Eu não pude não rir, o que me rendeu mais tapas. Mas tudo bem pra mim, porque ela estava rindo de novo e isso significava que estava melhorando.

-Vem, eu vou fazer chá pra você. Vai te deixar mais tranquila. -Eu a puxei pela mão até o pequeno cômodo da cozinha e ela sorriu pra mim.

Carol se sentou no balcão e me observou colocar água na chaleira, ela parecia pensativa, mas não me atrevi a quebrar o silêncio confortável entre nós até que ela mesma o fez.

-Ei, Day?

-Hmm? -Resmunguei e entreguei a caneca à ela.

-Obrigada. -Carol sorriu e eu me senti aquecer por dentro. -Você é sensacional.

Estava tudo bem.

1460 dias de você (DAYROL)Onde histórias criam vida. Descubra agora