XXI_Chegada turbulenta

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Karla e Manoel estavam na rodoviária, esperando os tios da garota.

— Acho que vai ser um pouquinho difícil encontrá-los nessa muvuca.

— Por quê?

— A rodoviária tá lotada e...

Antes que Karla pudesse acabar a frase, um homem que parecia ter a idade da minha mãe apareceu, caminhando de maneira desajeitada na direção dos dois, e não parecia ter mais que um metro e sessenta e cinco.

— Poxa, dava pra eu ter enchido o carro que ele ia no colo.— Manoel sussurrou no ouvido de Karla e deu um risinho baixo.

— Por que tá falando isso?

— Ué, não é esse cara que tá encarando a gente e vindo pra cá?

— Não mesmo, cara estranho. Olha eles lá!— Ela apontou para trás de Manoel e ele se virou para olhar.

Um homem loiro, com mais de 1,80 de altura, forte, de barba fina e parecendo estar na casa dos 40 anos apareceu no meio da multidão, carregando diversas malas.

— Eles tão vindo é de mudança mesmo, né Karlinha?

— Sim, e isso é quase tudo de roupa da minha tia.

— E onde ela tá?

— Bem ali.

Para onde Karla apontou, estava vindo uma mulher bonita, de cabelos castanhos e ondulados. Com um corpo esculturalmente definido e de olhos verdes, parecia ter cerca de 35 anos. Vestia roupas que normalmente eram usadas por garotas da idade da Karla, apesar de elegantes, e carregava uma pequena bolsa no braço.

— Acho que tá apontando para a pessoa errada.

— Por quê?

— Aquela mulher é nova demais pra ser sua tia.

— É ela mesma. Já passou dos 40 há um tempinho, mas faz vários procedimentos estéticos no rosto, e eu até brinco que um dia vou parecer mais velha que ela. Mas fala baixo porque ela é brava.

— Vou é calar a minha boca.

— Karla!— Ela gritou assim que a viu.

— Oi tia!— Karla foi em sua direção e a abraçou.

— A cada dia está maior e mais bonita. Um dia vai ficar como eu.

— Talvez eu já tenha parado de crescer mais de 10 anos atrás, mas vou tratar como um elogio. Oi tio!— Karla o abraçou e ele retribuiu de forma fria.

— E quem é esse?— A tia apontou para Manoel— Seu namorado?

— Não, é o irmão da Maria.

— Fico feliz que não seja. Maria?— A tia perguntou, mas logo se lembrou— Ah, lembrei, é aquela sua amiga estranha e que tem uma irmã metida.

— Essa mesma!— Manoel respondeu da maneira mais bem humorada possível.

— Espero que você não seja igual a elas, meu rapaz.— A tia advertiu.

— Sou o mais normal da família.

— Me sinto muito mais segura em ouvir isso. E vamos de que?— A tia perguntou para Karla.

— O Manoel vai nos levar até a casa.

— Então vamos, meus pés estão inchados nesse sapato.

— Talvez seria melhor tirar o salto?

— Não me diga o que fazer Karla! Agora vamos porque eu quero tomar um banho. Querido,— Ela olhou para o marido— leva a minha bolsa por favor, tá pesada.— Ela jogou a bolsa junto à pilha de malas que o marido já carregava.

Eles foram até o carro de Manoel. Os tios de Karla ficaram esperando na porta para que alguém a abrisse para eles. Karla e Manoel entraram e os dois continuaram do lado de fora.

— Por que eles não entram?— Manu perguntou.

— Acho que estão esperando você abrir, devem achar que você é um motorista.

— Eles não conseguem abrir sozinhos?

— São cheios de manias e não gostam, por exemplo, de colocar a mão na maçaneta do carro de um desconhecido. Não, eu não sei o porquê.

— Você escolheu a carreira certa, só tem doido perto de você...

— Eu que o diga. Eu vou lá abrir antes que eles reclamem que o sol tá quente.

— Deixa que eu vou.

Manoel saiu, deu um sorrisinho e... Ao abrir a porta, ela bateu no braço do tio, que fez uma careta de reprovação. Karla só olhou e conteve um riso. Depois os dois entraram e Manoel fechou a porta.

— Estão todos prontos?— Manoel perguntou, tentando ser gentil— Já vamos sair, mas antes vamos ligar o ar condicionado porque ninguém merece esse calor.— Ele ligou o ar, que estava no máximo— Muito melhor.

— Desliga isso!— A tia de Karla deu um grito.

— Mas por quê? Tá quente. Daqui a pouco eu começo a suar igual tampa de marmita e o carro vai feder a suor. Isso não vai ser legal, vocês vão reclamar do cheiro, eu vou reclamar da reclamação e vamos todos ficar irritados.

— Desliga isso, Manoel!— Karla também gritou.

— Não é possível que até você! Você não morou com a Miranda, não é? Porque aquela lá não fica um segundo sem ar condicionado. E a Maria é outra que fica achando que passar calor de manga comprida é a última moda em Paris e coloca o ar no máximo. Agora só falta o seu tio reclamar.

— Ele tem alergia ao perfume que você colocou pro ar condicionado espalhar e a garganta dele tá fechando. Desliga logo!

Manoel olhou pelo espelho e viu que o tio estava sendo ajudado pela esposa, mas respirava com dificuldade e parecia sufocado. Meu irmão se desesperou e começou a tentar desligar o ar. Resultado: sim, o botão quebrou na mão dele, o que o fez ficar ainda mais desesperado. Karla, com toda sua calma, apenas pegou o botão, o encaixou e desligou o ar. O tio logo começou a melhorar.

O resto do trajeto foi tranquilo. Manoel pensou em ligar uma música, mas um leve tapa de Karla em sua mão quando ele aproximou o dedo do som mostrou que era melhor que não o fizesse. Finalmente chegaram.

— Não via a hora de chegar!— A tia se espreguiçou ao sair do carro, ajudando o marido, que ainda não parecia estar bem.

— Tá se sentindo melhor tio?

— Agora ele está, não é Karla? Mas alguns minutos atrás ele estava sem conseguir respirar e quase morrendo. E como você estava? Calma e tranquila, parecendo aqueles hippies do festival de Woodstock. Acha que tudo tá tranquilo e que tudo se resolve com paz e amor.

— Não adianta nada se desesperar nessas horas, o que vai acontecer é quebrar o botão e não conseguir resolver o problema.— Ela sorriu para Manoel, que passou a mão pelo cabelo e sorriu.

— Eu já vou, viu? Foi um prazer!— Ele falou, se virou e entrou no carro. 

— Muito obrigada e desculpa qualquer coisa.— Ela sorriu para ele, que acelerou e foi embora.

— Se você me aparecer com uma criatura dessas na sala de casa e me falar que é o seu namorado— A tia sussurrou no ouvido de Karla— eu te jogo dentro de um convento, e não me venha falar que já é uma mulher, porque um retardado assim eu não aceito na minha família. Estamos entendidas?

— Sim tia.— Karla revirou os olhos ao responder.

— É assim que eu gosto. Agora vamos entrar porque o seu tio vai precisar de ajuda.

— Sim tia.— Karla apenas olhou para a rua e sorriu antes de entrar com os tios na casa.

Apesar Da VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora