VIII_Desilusões

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— Mas já Miguel?— Uma criatura enlameada gritou quando um relâmpago a iluminou.

— Miranda?— Ele se assustou.

— Não olha pra mim! Mas Maria sua maldita, você me paga!

Ela correu para a porta principal e Miguel foi em direção à sala de estar. Quando Miranda entrou, a luz voltou e Miguel pôde ver  que ela estava coberta de lama.

— Miranda?— Ele repetiu.

— Não olha pra mim! Não olha!— Correu em direção aos quartos, onde bateu na porta de Manoel.

— O que houve? Para de ba..._—Ele arregalou os olhos quando viu o estado de Miranda— ter.

— Não olha assim pra mim!

— O que houve com você?

— O desgraçado do Felipe me largou na porteira e eu tive que vir à pé! A merda do meu salto quebrou e eu caí em cima de uma poça que eu acho que não era só de lama! Eu tô fedendo! O meu cabelo tá cheio de lama! Eu tive que colocar o celular dentro da calcinha pra não sujar! — Ela pegou o  celular, coberto de lama — E SUJOU!

— Se acalma, você precisa se lavar. Mas não pode lavar no chuveiro porque está relampejando.

— Então o que eu vou fazer?

— Tenho uma ideia. Vem.

Ele pegou Miranda pela mão e os dois correram até a garagem. Lá ele pegou uma mangueira.

— O que vai fazer com essa mangueira?

— Vou te lavar.

— Com mangueira?— Ela fez cara de assustada.

— Aham. Fica parada que eu só vou jogar um jato pra limpar mais ou menos, assim você não vai dormir suja.

— Tá ficando louco?

— Não. Fica parada que vai rápido.

— Mas a água tá gelada.

— Prefere dormir suja de lama?

— Faz o que achar melhor.

Miranda ficou parada e recebeu um jato gelado de água, que logo acabou. Depois se virou e o jato foi nas costas.

— Acho que você já tá limpa.

— Eu tô me sentindo um lixo, nunca fui tão humilhada na minha vida. Eu caí na lama, tive que tomar um jato de água gelada na cara e, pra piorar, a cachorra da Maria tava quase beijando o Miguel.— Seus olhos estavam cheios de raiva e lagrimas, enquanto os dois voltavam para a casa.

— Tem certeza disso?

— Eu vi!

— Às vezes você viu uma coisa que não era.

— Tá me chamando de louca?

— Não, tô falando que você tá muito sensível por causa de tudo o que tem te acontecido.

— Eu não sou cega, nem louca e nem sonsa. Não tente me fazer passar por isso.— Ela andou rápido na frente, mesmo quase caindo por causa do salto quebrado e entrou em casa.

— Miranda você vai cair!— Manoel veio correndo atrás dela. Foi quando os dois deram de cara com Miguel e eu, que estávamos na sala de estar, e ela veio em minha direção.

— Você pode achar que está saindo por cima...— Sussurrou em meu ouvido—Pode tentar ficar com o Miguel, pode tentar me humilhar... Mas o que não sabe é que nada que vem de você me  abala. Eu vou continuar com a cabeça erguida, pode ter certeza disso.— Ela ergueu a cabeça e foi em direção ao segundo andar.

No dia seguinte, a chuva passou e, enquanto Miguel e eu estávamos tomando o café da manhã com minha família, Miranda desceu, com o mesmo nariz empinado de sempre e sentou-se em seu lugar.

— Bom dia.— Ela falou.

— Por que fez aquele escândalo ontem Miranda?— Mamãe perguntou.

— Aquele imbecil do Felipe me largou na estrada de terra pra eu vir a pé na chuva.

— Por que meu irmão fez isso?

— Porque é um desgraçado e acha que eu sou as vagabundas dele. Pode avisar que eu não sou, viu Miguel?

— Vou avisar sim. O Felipe, muitas vezes, é uma péssima pessoa e acha que pode usar as pessoas da forma que quiser. Não dê ouvidos a ele, você é muito melhor que isso.

— Eu sei, mas você não sabe. Se soubesse não teria me trocado por essa aí.— Apontou com a cabeça para mim.

— Eu não vou discutir com você.— Fiz cara de indiferença.

— Claro que não. Tá errada.

— Sem discutir, minhas filhas. Vamos tentar comer em paz.

E assim fizemos. Por alguns minutos de café da manhã, comemos como se fôssemos uma família feliz. Depois Miguel voltou para casa com a promessa de que nos encontraríamos no dia seguinte na casa da árvore.

...

No dia seguinte estávamos lá. E assim foi pelas próximas semanas, sempre que tínhamos algum tempo livre das obrigações diárias. Dessa forma, a casa na árvore começou a ganhar forma em pouco mais de 1 mês.

— Me ajuda a subir, Miguel.— Apontei para um lugar um pouco alto, mas onde eu não conseguiria alcançar por cima— Me dá pezinho por favor, acho que já dá pra chegar.

— Então vem.

Ele juntou as mãos e eu subi. Me segurei em um tronco e arrumei o que tinha que arrumar. Nesse instante, me desequilibrei, mas Miguel conseguiu me segurar. Segurei em seu ombro enquanto descia, e foi como mágica: nossos olhares se cruzaram em sintonia perfeita. Estávamos tão próximos... Nossas respirações se misturavam como se fossem apenas uma. Nós éramos apenas um naquele instante.

Nos aproximamos mais e mais, até que aconteceu. Nos beijamos.  A culpa me destruía por dentro, mas os beijos de Miguel eram tão... Apaixonados?! Não, eu devia estar sonhando. Ou melhor, em um pesadelo. Seu toque era suave, seus beijos eram quentes, e era humanamente impossível não sentir nada, mas eu tinha certeza de que era apenas prazer e não amor. Não, eu não era capaz de sentir algo a mais pelo filho do meu maior inimigo... Pelo menos não antes de fazer justiça.

Mas aquela mistura de inferno e paraíso teve fim com um grito desesperado.

Apesar Da VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora