Capitulo 1

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Carolina:

Pernas macias e depiladas para nada.

—Maria? É a Carolina. Onde raio andas tu? Preciso de ti. Este é o pior encontro da minha vida. Estou literalmente a adormecer. Já pensei em bater várias vezes com a cabeça numa mesa para me manter acordada. Preciso que inventes uma emergência e me telefones, a menos que me queiras ver ensanguentada e cheia de nódoas negras. Por favor, liga-me.— Carreguei em «desligar» e suspirei, frustrada, à porta da casa de banho das senhoras, o corredor escuro das traseiras do restaurante.

Fui apanhada de surpresa por uma voz grave atrás de mim:

  — Ele vai perceber, a menos que seja idiota, além de parvo.

— Desculpe? — Virei-me, deparando-me com um homem encostado à parede, de olhos postos no telefone, a enviar uma mensagem.

Continuou, de cabeça baixa:

  — Essa do telefonema de emergência... já tem barbas. No mínimo, devia esforçar-se um pouco mais. Este restaurante tem uma lista de espera de dois meses para conseguir uma reserva, e não é nada barato, querida.

  — Ele é que se devia esforçar um pouco mais, não? O casaco desportivo que traz vestido tem um buraco enorme debaixo do braço. Além disso, passou a noite inteira a falar da mãe.

—Já pensou que poderá estar nervoso com a sua postura pretensiosa?

Quase me saltaram os olhos das orbitas.

  — Prestensioso é ouvir a minha chamada e decidir dar opiniões inoportunas de olhos pregados no telefone. Nem sequer se digna a olhar para mim enquanto fala.

O parvalhão parou de digitar a mensagem. Levantou a cabeça e percorreu-me indolentemente com o olhar, desde os tornozelos passando pelas minhas pernas nuas, demorando na bainha da minha saia, seguindo para as ancas, detendo-se brevemente nos seios, até finalmente me encarar.

  — Exatamente. Olhe cá para cima. Estes são os meus olhos.

Ele afastou-se da parede e endireitou-se. O único foco de luz no corredor projetou-se nele, iluminando-lhe o rosto, e eu consegui vê-lo claramente pela primeira vez.

A sério! Não era o que eu esperava. Com aquela voz grave e rouca, e aquela postura, imaginei um tipo mais velho, enfiado num daqueles fatos convencionais, mas o homem era lindo. Lindo e jovem. Estava todo vestido de preto e, embora a indumetária fosse simples e elegante, havia nele algo especial. O cabelo desalinhado, castanho alourado, dava-lhe aquele ar sensual de quem se está nas tintas para tudo, mas ainda assim parecia perfeito. Tinha umas feições marcadamente masculinas: um queixo quadrado, barba de um dia a cobrir-lhe a pele ligeiramente bronzeada, um nariz direito e uns grandes olhos verdes e sensuais.
Olhos esses que me observam agora, atentamente.

— Quer ver se eu tenho algum rasgão, antes de decidir se mereço que fale comigo?

Lindo era, de facto, mas, decididamente, um imbecil.

  — não é necessário, a sua atitude já me diz tudo. Não merece.

Ele baixou os braços e riu-se baixinho.

— Como queira. Tente desfrutar do resto da noite, querida.

Eu bufei, mas lancei um ultimo olhar àquele belo imbecil, antes de voltar para a minha mesa.

Quando me sentei, o Filipe estava de mãos entrelaçadas sobre a mesa.

  — Desculpa — disse-lhe. —  Havia fila enorme para a casa de banho.

O BossOnde histórias criam vida. Descubra agora