Cap. 08 - Jack Daniel's

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Era a terceira chamada dela em seu celular. Olhou para tela a sua frente, com o nome Ângela Miller piscando na escuridão do carro. Não atendeu. Pela primeira vez na vida, Leon sentiu remorso do que era ser um verdadeiro mau caráter. Relacionamentos começam e terminam o tempo todo, todos os dias e isso na maioria das vezes não são culpa de ninguém apenas, acontece. Sabia disso, mas mesmo assim se culpava, por que no fundo sabia que por mais atraído que tenha se sentido por Ângela, começou um caso com ela, ainda pensando em Ada.
Isso foi desonesto. Com ela e com ele mesmo. Na ocasião pareceu uma boa ideia, ela era bonita, atraente, estava disponível e muito interessada. Do outro lado estava ele, sem qualquer notícia de Ada Wong, há quase oito meses. Seu humor oscilava entre períodos de depressão e desespero acreditando que talvez ela tivesse sido pega e morta, depois virava raiva, rancor... Quase ódio, achando que ela simplesmente foi embora e decidiu ignorá-lo. Que o tempo todo foi só um brinquedo nas mãos dela. Pesadelos frequentes, noites e noites de insônia regadas a muito álcool... Sozinho... Ângela pareceu a mais perfeita tábua de salvação.
Depois do atentado ao Aeroporto de Harvardville, começou então um relacionamento com aquela mulher. Não era um namoro, quanto a isso teve o bom senso de negar a fazê-lo. Já estava tão arrependido... Mas agora que Ângela começou com as cobranças sobre "dar o próximo passo", a cobrar dele alguma atitude ou então cair fora, tudo pareceu ficar ainda pior do que já era. Não era só então aproveitar a deixa e "cair fora". Leon não sabia ser assim. Teoricamente aquilo era só um caso, mas sentia que devia satisfação a ela, que não podia magoá-la e sabia que fosse honesto, era justamente o que estaria fazendo. Contudo, não dava mais para fugir, já passou da hora de chamá-la e botarem logo o ponto final no que nem deveria ter começado.
Leon dirigia pelas ruas de Washington pensando que aquele maldito atentado pelo menos serviu para algo bom. Pode se reaproximar de Claire. Depois de Raccon City existiu um clima muito pesado entre os dois, por causa de Sherry, depois ela estava sempre ocupada e viajando, cuidando de sua ONG Salve a Terra... Ela era a sua melhor amiga e simplesmente nunca teve uma oportunidade de encontrá-la em uma situação... Normal. Mas isso era passado, chegou um email informando que ela passaria alguns meses na cidade, e já havia alguma programação marcada, para ela, Sherry e ele.
Chegando a seu apartamento, cumpriu com o seu ritual noturno quase que diário. Sentou em seu sofá, ligou a TV. Com o controle remoto na mão esquerda... E uma garrafa de Jack Daniel's na direita. No começo, eram só algumas cervejas á mais. Depois descobriu a vodca. Até que finalmente chegou ao uísque. Depois de Raccon City, ganhou uma insônia que nunca o incomodou muito. Depois de Ada, tinha insônia, e quando dormia vinha os pesadelos. Quando acordava, tinha dores de cabeça insuportáveis. Não queria procurar um médico, não queria analgésico ou antidepressivo, não queria se curar, só queria esquecer.
As horas passavam mais rápido a medida que a garrafa de Jack Daniel's ficava mais vazia, já era madrugada. A televisão ainda ligada na sala escura... Um Leon bêbado adormecido no sofá...

(...)

Leon não abriu os olhos, mas acordou quando sentiu a maciez de um corpo familiar sentar em seu colo, e o perfume também familiar. Os lábios que ele tanto amava lhe beijarem a boca. Abriu os olhos.
"- Ada?".
Ela não respondeu. Apenas se acomodou melhor de joelhos no sofá, com uma perna em cada lado do agente. Beijou-o de novo, demoradamente.
"- Ada... Aonde você esteve esse tempo todo? Por quê você sumiu?". - Ele perguntava debilmente, alcoolizado, com a voz lenta e a língua pesada.
"- Psss. Você se lembra? Sem perguntas.". - Trocaram mais um beijo. Leon a abraçava forte, quase desesperado. O alívio por tê-la de volta, por ela esta viva, era maior do que qualquer raiva que ele tenha passado nos últimos meses. - "- Acabou. Agora vai ficar tudo bem, eu estou aqui.".
Sim, agora ia ficar tudo bem. Ele voltaria a ser o Leon que sempre foi. Sem mudanças repentinas de humor, sem dores de cabeça, sem álcool, sem pesadelos... Ela nunca prometeu que ia voltar, mas voltou. Era tudo o que importava agora, Ele a tinha de volta em seus braços, a abraçou ainda mais forte, porém incomodado com o calor úmido que se espalhava em seu peito, escorrendo pela barriga... Não demorou a notar que o corpo da espiã agora nada mais era que um peso morto, afastou-a um pouco para ver o que estava acontecendo... E a viu banhada em sangue... Sentindo o sangue ainda quente dela escorrer em seu próprio corpo. Perdeu o fôlego, aterrorizado com a figura de Ada morta, ensanguentada, de olhos abertos, toda machucada em seus braços... Era um desespero muito pior do que quando isso aconteceu em Raccon City... Porque agora a amava muito mais, porque agora não conseguia mais se imaginar vivo se ela também não estivesse, porque agora tentava gritar, mas a voz não saia, tentava chorar, mas não conseguia nem puxar o ar... Sentia as lágrimas escorrendo pelo seu rosto e que morreria engasgado com o grito do nome dela entalado na garganta...
Tinha que gritar... Respirar... Ada... Ada... Por que o grito não saia? Se fizesse mais força...
Leon foi ao chão em um salto, caindo de quatro no carpete... Foi quando saiu o primeiro jato de vômito da sua boca, foi longo, violento ao ponto de bater no carpete e respingar em seu rosto. O agente não sabia mais o que era a sensação molhada na face, vômito ou choro, mas sabia que estava chorando. Conseguiu respirar de novo, a medida que respirava, seu estômago ficava ainda mais revoltado... Soltou o segundo jato. Suas mãos apoiadas no carpete já estavam submersas num lago de imundice... Soltou o terceiro jato.
Tossia copiosamente a medida que percebia o que aconteceu... Um pesadelo... De novo. Ficou de pé e caminhou até o banheiro deixando um rastro com pegadas de vômito para trás. Ria nervosamente enquanto tirava a roupa. "Idiota!". Aos poucos o desespero e o medo de que a espiã estivesse mesmo morta foi substituído pelo ódio incontrolável que sentia de si mesmo por ter se permitido ficar em um estado deplorável. Ligou o chuveiro gelado e não se preocupou mais para o tempo que iria gastar ali. Claire que o perdoe, mas ele acabaria com toda a água do planeta aquela manhã se fosse possível.

Leon and Ada Side Story (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora