Cap. 09 - Achados e Perdidos

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Não era humano. Era sobre-humano. Uma força maior do que qualquer homem seria capaz de lutar contra. Era um borrão preto, um vulto que se movia mais rápido do que o olho humano podia acompanhar. Chris Redfield mal sentia as próprias pernas, fraco, impossibilitado de continuar. Já perdeu a conta de quantos golpes recebeu. Seu corpo já estava quase adormecido no chão depois do último impacto... "O vulto preto" se aproximou, suas mãos eram fortes como garras de aços, porém já estava tão fraco, que não sentiu uma dor proporcional ao ataque quando essas garras o ergueram do chão pelo pescoço. Estava fraco demais até para gemer.
O estrondo de um raio soou quase como uma explosão, o clarão possibilitou que ele visse o sorriso estampado no rosto de seu algoz. E o cadáver de Oswell Spencer aos seus pés.
"- Vamos acabar logo com isso.". - Albert Wesker fechou o punho para desferir o golpe de misericórdia.
"- NÃO!". - Gritou a mulher que corria em direção aos dois. O bioterrorista estava tão entretido em finalmente ter Chris Redfield em suas mãos, indefeso como um frango, que se esqueceu de Jill Valentine.
Ela correu como quem corresse para salvar a própria vida, mas não foi o que fez. Correu para salvar seu amigo, o parceiro de anos. Sem medir as consequências, sem se importar com o preço a pagar. Ela investiu contra Wesker que estava desprevenido e completamente exposto próximo a uma enorme janela de vidro, e se atirou com ele para a própria morte.

(...)

Era difícil acreditar que um dia tão triste pudesse ser tão bonito. O sol brilhava em Washington como se ainda fosse verão, estava quente, o que constatava com todas aquelas pessoas vestidas de preto.
Leon não chegou a conhecê-la pessoalmente, mas sabia o que ela representava. Tinha sido uma sobrevivente de Racoon City, além de ser uma das mais importantes aliadas contra o bioterrorismo, melhor amiga de Chris, irmão de Claire. O ex-S.T.A.R.S estava inconsolável, a própria irmã já não sabia mais dizer quando foi a última vez em que ele esteve nos Estados Unidos, mas agora estava de volta, somente para ir ao enterro simbólico de sua parceira.
Chris se pôs de joelhos em frente à lápide com o nome de Jill Valentine. Não havia qualquer corpo enterrado ali. Fora uma queda de mais de sessenta metros, os restos mortais de Jill e Albert Wesker não foram encontrados, contudo, após tantas buscas e avaliando as circunstâncias da queda, ambos foram dados como mortos.
Uma sensação de paz pairou na Casa Branca, afinal, agora eles tinham finalmente eliminado o maior terrorista de todo o globo, sem precisar expor ao público a verdade sobre Raccon City, sem mostrar a fraqueza e a inabilidade do governo em evitar um terror tão grande como aquele. Sem criar pânico na população civil, mostrando-lhes o quanto sua própria segurança era frágil... Era patético como as pessoas escolhiam sempre o caminho mais fácil.
Isso estava errado. Leon estava tão enfurecido com tamanha idiotice que às vezes chegava a pensar em desistir de tudo, se tornar algum tipo de "agente freelancer", poderia se reportar a Chris e seguir a recém formada B.S.A.A. De maneira independente, sem... "Vínculos empregatícios". Era mais do que óbvio que a morte de Wesker não significava o fim do terror. B.O.W's continuavam a ser fabricadas todos os dias e vendidas no mercado negro, a situação já estava fora de controle e é um direito do cidadão saber a verdade, e como tudo começou. O que ainda o segurava ali, era a sua amizade com Adam Benford, um homem de palavra, que agora abandonou o Exercito para assumir um cargo de chefia importante na segurança nacional, além de entrar para a política, como uma promessa de ser um dos poucos políticos honestos e comprometidos com a verdade.
Chris e Claire se aproximaram.
"- Sinto muito, finalmente nos conhecemos pessoalmente numa ocasião como essa Chris.". - Os dois apertaram as mãos.
"- Eu...". - O moreno fez uma pausa. - "- Eu estou bem. Vou ficar bem. Eu vou continuar o trabalho dela. Não foi em vão.". - Os olhos de Chris se desviaram dos de Leon e se fixaram em um ponto distante. - "- Quem é ela?"
Leon olhou para trás, seu coração falhou uma batida quando a viu, depois de dezenas de lápides, por entre árvores, uma mulher magra, com uma echarpe vermelho. Quando ela percebeu que foi vista, fez um delicado gesto com a cabeça, pedindo que ele a seguisse, antes de se retirar. O agente procurou palavras para responder, era muita ousadia, ela aparecer num enterro infestado de agentes federais, militares e membros do governo. O que dizer... O que dizer...?
"- Longa história, Chris. Eu te conto depois.". - Disse Claire, segurando o braço do irmão que estava visivelmente desconfiado, afinal, quem observa um enterro assim de longe? - "- Vá Leon, antes que você não a alcance.".
Sem olhar para trás, Leon procurou sair a passos largos. Só não correu porque seria muito difícil fazer isso sem chamar a atenção de todos. Passou por entre as lápides, as árvores, deixando o aglomerado de pessoas cada vez mais para trás. Já estava num ponto distante do cemitério, seus olhos azuis varrendo todo o lugar de maneira quase desesperada, sem a encontrar, até que num ponto ainda mais distante, viu alguém se fechar dentro de um mausoléu.
Agora podia correr. Correu até a porta de ferro em estilo gótico, tocou o metal frio pensando na mulher que encontraria ali... Tentou lembrar de tudo o que aconteceu até hoje desde que ela desapareceu, mas não conseguia. Era como se sua mente fosse tomada por um enorme branco, onde não havia memórias, não havia ressentimentos, onde a única coisa que sobrou era a vontade de entrar ali. Respirou fundo, abriu a porta e entrou fechando-a atrás de si rapidamente.
Caminhou pelo pequeno corredor que desembocava em um pequeno altar de mármore, o lugar estava escuro iluminado pela pouca luz colorida refletida dos estreitos vitrais góticos nas laterais, as gavetas mortuárias da família cujo aquele mausoléu pertencia. Procurava por Ada em algum canto, escondida em alguma sombra, quando sentiu um golpe nas costas. Imediatamente girou os calcanhares e ficou de frente para a agressora a tempo de interceptar um murro que o acertaria bem no rosto e imobilizar o outro braço dela.
"- Seus reflexos estão lentos, Bonitão. Imagina se fosse um inimigo, você poderia estar morto agora.". - Ada tentou não se impressionar e também não perder a pose mesmo quando percebeu que agora Leon apertava os seus dois braços com força e os olhos azuis pesados em cima de si, numa severa expressão de reprovação. - "- Hn. Você tá bravo. Que bom, então é porque sentiu mesmo a minha falta.". - Ela sorriu.
Leon rosnou algum palavrão não identificável entre os dentes enquanto usava mais força para segurar a espiã, prendendo os braços dela para trás. "- Você acha isso engraçado? Se diverte as minhas custas?". - Esbravejou soltando-a logo depois e virando de costas para ela. - "- Diz o que você quer e vá embora.". - O agente não conseguiu evitar que sua voz denunciasse o quanto ele se importava, e isso feria o seu orgulho, ele só queria mostrar para ela, que ele não ia aceitar ser feito de idiota, não ia aceitar tudo de Ada Wong... Mas toda essa valentia foi por água abaixo quando escutou a porta de ferro se abrir. - "- Espera.".
"- Pois não, agente Kennedy.".
"- Por quê apareceu agora? Não deu notícias. Eu cheguei achar que você estivesse morta!".
"- Digamos que eu estava um pouquinho ocupada tentando sobreviver, Leon!". - Agora era a vez dela não conseguir disfarçar a mágoa em sua voz. - "- Mas se você já me manda embora, sem me dar a chance nem ao menos de me explicar, é porque nós não temos mais o que falar.".
Sobreviver... Sobreviver...
"- Ada!" - Correu até ela e fechou a porta bruscamente puxando a mulher de volta para dentro usando os braços para cercá-la contra a parede. - "- Desculpa. Por tudo que é mais sagrado, me perdoa... É que eu... Eu achei que fosse perder a razão a qualquer momento sem notícias suas, você não sabe o que eu passei, foi dia após dia, noite após noite esperando por você, imaginando coisas horríveis, tentando aceitar que você não ia aparecer mais. Eu cheguei a tentar abrir uma investigação a seu respeito, usar a agência para enviar uma missão de busca... Eu desisti porque não sabia se isso só te colocaria ainda mais em risco, eu fiz tanta besteira... Eu nem sei por onde começar! Eu só queria uma notícia sua, só uma...". - Ele parou quando ela tocou-lhe os lábios com a ponta dos dedos.
"- Leon, você não faz ideia, de quantos vezes eu pensei em te procurar. Mas eu mal estava conseguindo cuidar de mim mesma, quanto mais de nós dois, caso você fosse marcado como algum contato meu. Oswell Spencer não foi a única morte, Wesker matou tantos que eu nem sei enumerar todos de cabeça. Eu só posso dizer que cada vez em que eu quase fui pega, eu agradeci muito por você estar longe.".
O agente voltou sua memória aos relatos de Chris sobre o ataque de Wesker, sobre ser praticamente impossível se defender. Por algum tempo, chegou a não odiar o terrorista, afinal foi graças a ele que Ada fugiu de Raccon City. E durante muito tempo teve até ciúmes, achando que os dois tiveram algo mais, hoje tudo o que sobrou foi pavor, e a certeza que depois daquela traição, Ada não teria qualquer chance de sobrevivência caso Wesker pusesse as mãos nela. Leon se sentia egoísta, como se durante esse tempo ele não pudesse imaginar como seria estar sendo caçado dessa maneira, sem poder contar com quase nenhuma ajuda, e ainda por cima foragido da lei, ficando preocupado com a própria dor de cotovelo. E ela ainda sim teve cabeça para se preocupar com ele.
Era como se pudesse ver novamente os flash's de seus piores pesadelos com Ada ensanguentada em seus braços, era como se pudesse imaginar cada um dos golpes de Wesker que Chris descreveu, e falando em Chris, saberia que nem direito a uma lápide mesmo que sem corpo, ou qualquer tipo de lembrança da mulher de vermelho ele teria direito.
Leon a abraçou, como se ela fosse indefesa, como se ela fosse frágil, como se fosse a coisa mais preciosa do mundo e quase tivesse sido quebrada. "- Eu sou um idiota, Ada. Eu nem sei porque você ainda perde tempo comigo.". - Ele riu quando ela tomou seu rosto entre as mãos e respondeu.
"- Eu te conto o motivo. Mas é segredo... Eu adoro policiais.". - Ela sorriu quando percebeu os pelinhos se arrepiarem no pescoço de Leon, continuou murmurando algo mesmo depois de já estarem se beijando. - "- Eu fiquei caidinha por você desde a primeira vez que te vi com aquela farda.".
Tudo voltou ao normal. Ela estava de volta, com o mesmo humor infame de sempre e agora eles estavam dando um amasso em um mausoléu, E lá fora infestado de agentes federais, membros do Exercito, B.S.A.A., Força Aérea, Marinha... Nada seria tão perfeitamente "Ada Wong" quanto isso. Ela estava bem viva, e ele se sentia vivo outra vez, sentia como se tudo voltasse à normalidade, como se a gravidade voltasse a prendê-lo á Terra, estava tudo bem... Se não fosse por um detalhe:
"- Ada, a gente precisa terminar isso em outro lugar.".
"- Por quê?".
"- Aquele Jesus Cristo gótico, esquelético, pregado naquela cruz com a boca aberta, olhando para gente, esta me dando nos nervos.".
A espiã gargalhou alto abraçando-o forte e dando-lhe um beijo na bochecha. - "- Eu passo na sua casa mais tarde. Eu acabei de chegar na cidade e logo vim te ver, mas ainda tenho muita coisa para resolver.".
"- Você vai mesmo, né?".
"- Vou. Prometo.".
"- Jura?".
"- Juro, Bonitão.". - Um último beijo antes de abrir a porta. - "- Te vejo por ai.".
Quando a porta de ferro se fechou, Leon sabia que já era impossível alcançar a espiã para dar uma última informação - Ela esqueceu de pegar o meu endereço. - depois apenas bateu na própria testa dando graças a Deus por não ter dito nada tão estúpido, era óbvio que a essa altura do campeonato, Ada já sabia a cor de suas cuecas de cor.

Leon and Ada Side Story (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora