Cap. 01 - Prólogo - Ada Wong

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Acordou com a visão turva, borrada. Demorou algum tempo para perceber a onde estava. A cama limpa de lençóis impecavelmente brancos e arrumada. Não conseguia mover os pés ou as pernas, também não sentia qualquer dor. Ainda estava sob o efeito da raquianestesia e dos sedativos.
"- Como vai senhorita Wong? Não se preocupe com nada agora, a cirurgia foi um sucesso.". - Disse a enfermeira diminuindo o gotejamento do soro em seu braço e adicionando mais alguns medicamentos." - "- Vou chamar o doutor, tente não dormir até eu voltar, está bem?".
Nesses poucos minutos acordada pode se localizar no tempo e no espaço. Quem era, e o que houve e porque estava ali. Conseguiu escapar de Raccon City, e apesar dos contra tempos, sua missão foi bem sucedida. A amostra do G-Virus estava nas mãos de Wesker, com isso, finalmente conseguiu a confiança dele. Albert Wesker definitivamente acredita que ela, Ada Wong, é sua mais eficiente espiã. A organização para qual realmente trabalha, no fim, também ficou satisfeita.
"- Senhorita Wong! Que bom vê-la acordada!". - Dessa vez era o médico. Imediatamente se dirigiu aos aparelhos que monitoravam a sua oxigenação, freqüência cardíaca e respiratória. - "- A senhorita tem noção do risco que correu não procurando um hospital imediatamente após a batida? Graças a Deus, conseguimos tirar o seu rim direito sem maiores problemas. Foi muita sorte você não ter morrido com uma hemorragia interna, guardando esse rim completamente explodido dentro de você esse tempo todo.".
"- Sorte eu ainda ter o outro. Certo doutor?".
"- Isso também.". - Ele sorriu. - "- Juízo. Eu sempre digo para o meu filho, vende essa moto!".
"Hn, moto...", ela pensou.
"- Ah, a propósito... Eu não costumo fazer isso em cirurgias de emergência... Mas eu procurei fazer um bom trabalho em relação a sua cicatriz, eu não quis ser o responsável por deixar uma marca horrorosa em uma mocinha tão jovem, não se preocupe, com os devidos cuidados, será apenas uma linha bem fina na sua cintura.".
"- Mais um bônus então.". - Ela murmurou enquanto seus olhos insistiam em se fechar novamente.

(...)

Estava de volta ao seu apartamento. Morava sozinha, e por isso era responsável por todos os cuidados para com o lugar e para consigo mesmo durante o seu pós-operatório. Bem, diante de tudo o que passou isso não era nada.
Concentrou-se somente na água morna que caia em seu corpo, deixando seu cabelo curto e encharcado grudado em seu rosto, lavando suas feridas que ainda cicatrizavam. Podia perfeitamente se cuidar sozinha. E com toda a honestidade, preferia assim. Sempre foi sozinha, não teve pai, mãe ou qualquer pessoa que se importasse. Cresceu em um lar para meninas perdidas em qualquer lugar da China na qual nem se lembra mais. Como foi para lá não importa, mas sabe que foi lá, desde cedo que aprendeu que devia ser sempre a mais esperta, a mais forte, e só confiar em si mesma se quisesse sobreviver, se não quisesse ser só uma menina morta, vendida ou prostituída como tantas outras na sua situação.
Secou-se com dificuldade. Todo aquele conforto do hospital já havia ido embora junto com a anestesia e sedativos. Tudo doía, e muito. Abriu o espelho da pia e observou a infinidade de analgésicos que possuía. Alguns na legalidade de uma receita... Outros nem tanto. Morfina. Nada mais justo para quem passou por tudo aquilo o que ela passou.
Deveria usar roupas confortáveis agora, mas optou por um jeans e um sutiã enquanto se decidia sobre qual blusa usar. Recusou-se a deitar. Escorou-se em uma cômoda em frente ao espelho e ali esperou a morfina começar o seu efeito. Era bom, podia respirar sem dificuldade novamente, coisa que não conseguia devido as costelas quebradas. E se respirava de novo, conseguia pensar de novo também. Olhou-se no espelho... Sentia-se um trapo humano.
Doía! E como doía. A dor física nem tanto. Essa dor física era mais do que merecida, um preço muito justo a pagar, e que por sinal já estava indo embora. O pior era a dor da alma. Sua dignidade estraçalhada em mil pedaços. Como pôde ser tão fraca? Como pôde se arriscar tanto? E tudo por que, o que aquele policial tinha afinal?
Sentia o coração aquecer, mesmo contra a sua vontade, mesmo com a sua razão gritando para que ela esquecesse. Lembrava-se da amabilidade daquele rapaz, da preocupação e zelo para com ela, coisa que ninguém nunca teve antes. Das boas intenções, das demonstrações de boa índole e bom caráter. Da coragem, determinação e força tão grandes que faria qualquer mulher como ela admirá-lo, ao mesmo contrastando com toda aquela ingenuidade e ausência de malicia que fez "pessoas como ela" manipular e iludir, passar por cima feito um rolo compressor.
Talvez esse foi o grande problema. Essa foi a sua fraqueza. Toda a sua vida, todo o seu treinamento, fora para que abandonasse sua humanidade e aprendesse a ser fria, calculista, de uma ladra esperta até uma máquina de matar. E durante todo esse tempo, nunca fora apresentada a outro estilo de vida ou outro jeito de ser.
Então ela o encontrou. A humanidade e a honra em pessoa, num lugar mais desumano possível. Leon, um policial recém-formado. O bem intencionado de plantão, com uma inocência que a irritava... E que se atirou na frente de um tiro só para protegê-la.
Ada se olhava no espelho e não se reconhecia mais. O que aconteceu? Em qualquer outra ocasião acharia Leon só mais um estúpido no mundo, mas não. Sua resposta em troca do sacrifício do policial foi se atirar em frente a um Tyrant para protegê-lo, o que colocou toda a sua missão em risco, o que quase lhe custou à vida.
Levou a ponta dos dedos aos lábios, riu nervosamente, lembrou do calor dos lábios dele, ainda podia senti-los, foi mesmo ideia dela a de beijá-lo? E se tratando de beijar alguém como se deve, quando se tem sentimentos envolvidos... Fora o seu primeiro beijo. Sua razão esbravejava, berrava que aquilo não podia ter sido mais patético! Mas ela sabia que era isso o que sentia e percebeu aquilo que não queria a primeira gota de lágrima a se formar...
Uma mulher se olha no espelho. Ela se chamava Ada Wong...
Mas esta manhã, ela dirá adeus a esse nome.
"Não sou mais Ada Wong...".
"Esta e a cicatriz de Ada, não a minha".
E enquanto ela dizia adeus a Ada Wong, ela não pôde conter as lágrimas.
Entretanto não há muito tempo antes de sua próxima missão.

Leon and Ada Side Story (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora