Cap. 20 - Terrores do Passado - Parte 2

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Tall Oaks
29 de Junho de 2013
Universidade Ivy

O agente da D.S.O. não teve tempo nem de processar o que ele acabara de fazer. Ele atirou no Presidente dos Estados Unidos. Mais do que isso, não teve tempo nem de chorar a morte do amigo... Pois imediatamente após a tragédia, foi alvejado em cheio por mais uma bomba.
“– É minha culpa... Eu... Eu fiz isso.”.
“– Do que você está falando.”. – Aquela mulher em lágrimas, estava confessando?
Quando ela o encarou com seus brilhantes e pequenos olhos castanhos, com uma aparência tão frágil e abatida... Ele não soube se a apontava a pistola, ou se a escutava.
“– Catedral de Tall Oaks... Me leve até a Catedral e eu lhe contarei tudo, Agente Kennedy.”.
“– Como você sabe o meu nome?”.
Nesse exato instante, o celular da moça tocou, ela rapidamente atendeu, era Hunnigan. Leon correu até lá.
“– Graças a Deus, você está bem!”.
“– Vocês se conhecem?”. – Perguntou Leon.
“– Essa é Helena Harper, ela está no serviço secreto desde o ano passado. Eu não sei dizer o quão bom é ver vocês dois bem?”.
O loiro poderia se bater agora mesmo. O tanto que a pobre Hunnigan o perseguiu por causa dessa menina, Helena Harper, inúmeras, inúmeras vezes, durante mais um ano... E em absolutamente todas às vezes, ele esquecia do assunto. Pelo amor de Deus, a parceira de anos tinha todos os motivos para tratá-lo como um idiota às vezes... Não faz nem uma semana que ele “espionou” essa tal Helena! Ele pôde notar o sarcasmo ao telefone quando foram feitas as apresentações...
“– Olha, eu odeio correr com as apresentações, mas eu preciso que vocês me reportem a situação.”. – Disse ela por fim.
“E agora...”, ele pensou antes de falar. “– Eu... Eu atirei no Presidente.”.
“– Você o quê...”.
“– Ele já estava infectado quando o encontramos! Leon fez o que devia ser feito. Ele salvou minha vida.”. – Helena se apressou.
“– Que Deus nos ajude...” .– Hunnigan nunca esteve tão assustada, pela primeira vez, aquela máscara de mulher séria e inabalável caiu, demorou mais alguns longos segundos que pareceram um eternidade para ela se recompor. – “– Ok. Eu vou enviar o reporte, e vocês dois, por favor, mantenham o foco em fugir daí! O vírus já se espalhou num perímetro de três milhas ao redor do Campus, e ainda está se alastrando... Vocês precisam correr!”.
“– Não primeiro precisamos checar a Catedral de Tall Oaks!”. – Disse Helena. – “– O Agente Kennedy tem uma pista que talvez nos diga quem foi o responsável por isso.”.
“– Leon, é verdade?”.
Quando Hunnigan o perguntou, mais uma vez ele não soube o que fazer, ele tinha todos os motivos para não confiar em Helena Harper, o que a moça tinha de bonita, também tinha de suspeita, aliás, não fazia nem dez minutos que ela mesma se confessou culpada. Porém mais uma vez, ela lhe lançou aquele olhar de súplica, cheio de dor e desespero... Ele não sabia o que foi que ela fez, mas algo dentro de seu coração apenas disse para segui-la.
“– Sim... Eu acho que tenho algo...”. – “Que diabos eu estou fazendo?”, ele pensou em seguida.
“– Compreendido. Eu vou traçar a rota mais segura possível até a Catedral de Tall Oaks. Mantenham os rádios ligados.”.
Helena desligou o aparelho, e então encarou os severos olhos azuis do agente, que pousaram como o peso do mundo inteiro sobre si, como se pudesse esmagá-la contra o chão.
“– Eu tenho uma pista?”.
A voz rouca, grave e repreensiva assustou Helena, mas nem isso a impediria de fazer o que tinha que ser feito.
“– Vai ter. Se vier comigo.”. – Se esse homem for a metade do que dizem a seu respeito, só ele poderia ajudar, e foi muita sorte justamente ele estar ali, era o que pensava.
Leon ajoelhou diante ao corpo sem vida, com aparência decomposta. De todas as criaturas que já atirou, desde o incidente em Raccon City, pela primeira vez, o ex-policial sentiu remorso. Era como se nem estivesse ali, como se fosse um expectador, como se tivesse parcialmente anestesiado... Como se a qualquer segundo fosse acordar de mais um pesadelo.
Não acordou... Continuou esperando o próprio despertar. Esperou um pouco mais. E ali ajoelhado diante o corpo transformado do amigo e Presidente, com sua pistola pendurada entre os dedos, no escuro, pela primeira vez, não soube o que fazer.
“– Eu sinto muito, Adam...”.
Recuperou suas forças, e finalmente se levantou.
“– Então... O que há de tão especial nessa igreja? Você tem pecados a confessar?”.
A língua daquele agente batia feito um chicote, mas Helena procurava não se importar. Afinal, ela conseguiu pelo menos a chance de se explicar, quando na verdade nem por isso deveria esperar. “– É difícil explicar. Se eu não lhe contar na Catedral... Talvez você não acredite em mim.”.
Caminharam devagar até o corredor de acesso, tudo parecia sombrio, tudo estava vazio, e o som era apenas de uma tempestade que começara lá fora. “– Então nós temos um acordo, assim que chegarmos na Catedral, você me conta tudo. Certo?”.
“– Certo.”.
Depararam-se com alguns corpos pelo caminho, dois deles não morreram por causa da infecção, foram baleados. O relógio de corda cantava às dez da noite de maneira quase fantasmagórica.
“– Isso está ficando fora de controle.”. – Disse Leon, sem ele mesmo saber se estava falando sobre esse atentado especificamente, ou sobre todo esse terror que começou há quinze anos...
Antes de abrir a porta para o hall principal da reitoria, o loiro fez uma pausa. “– Quando ver um deles... Mire na cabeça, é a sua melhor chance.”.
“– Entendi.”.
Entraram no hall principal, todo ornamentado, onde seria a recepção após o discurso presidencial. Por ali havia um completo rastro de caos, cadeiras amontoados, mesas viradas, comida espalhada pelo chão, pelas mesas, pratos quebrados... Era como se a Universidade tivesse sido alvo de um saque. Pelas grandes janelas, ambos podiam ouvir a tempestade, os relâmpagos e os trovões.
“– Aqui teria sido a recepção, estariam todos jantando agora, se...”. – Leon não completou a frase.
“– Você acha que alguém sobreviveu?”.
“– Eu sinceramente espero que sim.”. – Respondeu o loiro. – “– Eu não posso acreditar que isso está acontecendo de novo... É como Raccon City...”.
Helena agora sabia, era verdade... Chegou a investigar o passado de alguns agentes de destaque... E também ouviu os rumores feitos pela ala contrária ao Presidente, em especial sobre “o misterioso Agente Kennedy”, cujo inicio da carreira foi marcado pela insistência de revelar ao povo, a verdade sobre Raccon City, um segredo de estado. Além de ser amigo da ativista inimiga do país, Claire Redfield, e seu irmão, que nada mais era que um idealizador de uma organização de rebeldes, fortemente armados, disfarçada de braço do Exercito. Todos três segundo essas pessoas, não estavam presas, porque fizeram amigos importantes, dentre eles... Adam... Que agora, estava morto.
“– Sim... O incidente em Raccon City... Você foi um dos sobreviventes...”.
“– Eu nunca vou me esquecer o que eu passei naquele lugar. Escuta, se você teve qualquer envolvimento nesse inferno... Pode dar adeus a sua liberdade!”. – De novo... O chicote.
“– Eu sei...”.
Escutaram o barulho de alguém correr, puderam ver o vulto. Entreolharam-se e acertaram o comando de segui-lo. Correram por entre as mesas e seguiram a sombra até a cozinha.
“– Nos fundos!”. – Disse Leon.
Tudo estava vazio, e nenhum sinal de qualquer zumbi, não havia nada além de um número excessivo de ratos. Atravessaram as dispensas até chegarem a um deposito. Antes de abrir a porta, Leon alertou sua nova parceira com apenas um olhar, não precisava explicações, ela sabia que deveria ser cuidadosa, só Deus sabe o que encontrariam ali dentro. Equiparam suas pistolas e abriram a porta juntos.
“– Não atirem!”. – Gritou um homem baixo, careca e visivelmente em pânico.
“– Você está bem?”. – Perguntou Leon.
“– A névoa... Ela veio e... Elizabeth!”. – O homem tentou correr, mas Leon o puxou de volta violentamente pelo braço.
“– É perigoso!”.
“– Me deixe ir! Elizabeth!”.
Leon observou a chamada no aparelho celular que aquele homem tinha em mãos. “– É a sua filha?”.
“– Minha filha... Ela está sozinha, eu preciso encontrá-la, Elizab...”. – Teve a sua voz abafada pela mão de Leon que o forçou a calar-se.
“– Silêncio! Você não vai encontrá-la se estiver morto.”. – O agente buscava sussurrar, mas a tensão do que ele sabia que estava por vir e o fato de ter um descontrolado para cuidar, o estava tirando do sério. – “– Nós vamos procurar a sua filha.”.
“– Leon, nós não temos tempo...”. – Helena tentou argumentar.
“– Nós estamos fazendo o tempo!”. – Disse ríspido.
Helena entendeu o recado, não deveria contrariá-lo mais do que já fez. Mais uma injeção de desespero circulou em suas veias.
O trio pôs-se a caminhar, de volta ao salão onde seria a recepção, os relâmpagos pareciam mais fortes, apesar de assustadores. Até que serviam de alguma ajuda, iluminavam o local que estava sem eletricidade.
Leon estava tenso, o barulho dos trovões e da chuva poderia confundi-los, precisava estar bem mais atento ao mínimo som que algo... Rastejando e grunhindo... Mas um raio estourou em algum lugar... “– Cuidado!”.
Helena teve o passo interrompido pelo braço do agente, foi o tempo apenas de fecharem os olhos para se protegerem dos cacos de vidro que espirraram quando o enorme lustre caiu do teto.
“– Olhem por onde andam...”. – Sussurrou ele, rezando para que o pai desesperado tenha escutado, já que este insistia em correr na frente.
Finalmente chegaram até a ala da reitoria, onde tinha um elevador, cujo homem garantiu que os levaria até a garagem subterrânea, a melhor maneira de sair dali. Sendo assim só precisavam encontrar a garota.
Ao fim de corredor, Helena estava ainda mais tensa, havia manchas de sangue por todos os lados, porém nenhum cadáver – também nenhum cadáver-vivo. – e junto com isso, um silêncio mortal e a expressão extremamente tensa de Leon. Ela sentia cada fibra do seu corpo vibrar em pura eletricidade, se alguém a tocasse agora, ela com certeza ia gritar. Ele abriu a porta e entrou na frente... Havia uma enorme poça de sangue no chão, mau cheiro de morte invadiu suas narinas... Sentiu o estômago embrulhar quando num reflexo – e susto – apontou uma arma para a cabeça de uma criatura que surgiu das sombras.
“– Pai!”.
Era uma menina, uma jovem de não mais de vinte anos. Viu o agente respirar aliviado, e abaixou sua pistola também.
“– Elizabeth!”.
Leon e Helena se entreolharam mais uma vez, apesar das circunstâncias, no fundo ainda eram dois policiais, e nada era mais satisfatório do que a sensação de dever cumprido. Agora que pai e filha estavam reunidos, só lhes restavam fugir dali.
Juntos, os quatro sobreviventes seguiram o caminho de volta, rumo a elevador. O agente mais experiente não deixou de perceber que a menina estava ferida, tossia mais do que o pai, e parecia muito debilitada. Era um mau sinal... Contudo não sabia como dar a notícia a Helena sem alarmar aquele pai. Pensou por alguns segundos, se deveria atirar nela antes... Mas como fazer algo assim?
“– Eu estou tão agradecido por vocês estarem aqui.”. – Disse o homem.
Definitivamente, Leon não iria atirar nela.
Por enquanto, tudo o que lhe restava era ficar atento, manter sua pistola em mãos, e rezar para a menina sobreviver, por mais que parecesse impossível.
Quando o elevador fechou as portas e começou a se mover, Leon não sentiu qualquer alívio. Sua experiência o ensinou bem, nunca se sabe o que encontrar quando uma porta se abre novamente. A menina foi ao chão, doente. O pai ajoelhou-se em seu socorro.
“– Papai...”.
“– Lize?”.
Um último suspiro. O homem caiu em prantos quando ela finalmente se foi.
Leon apertou sua pistola, o que estava por vir seria ainda mais difícil. Primeiro teria que convencer aquele pai a se afastar do corpo. Talvez Helena tivesse que ajudar. Ela mais uma vez olhou no fundo de seus olhos, emocionada com a cena e provavelmente inocente do que, ele, sabia que iria acontecer em poucos minutos. “Não... Ela não parece culpada... Essa moça pode ser qualquer coisa, menos uma assassina fria e sem coração.”.  Leon conhecia muito bem uma, que por fim, tinha sim, um coração. “Ou não.”.
Mais um black out.
“– A energia!”. – Exclamou Helena.
Escutaram a tosse copiosa do pai cessar, e em seguida o barulho de alguém... Mastigando.
A luz voltou.
“– Oh! Meu Deus!”. – Helena estava em choque, a menina morta, agora estava viva, transformada... Assim como o Presidente.
A morta viva que antes comia o próprio pai, agora voltou sua atenção a Leon, saltando em cima dele, atacando-o, tentando mordê-lo.
“– Helena, ela já acabou! Atira!”. – Ele pediu enquanto lutava como podia...
“– M...Mas...”.
“– Atira!”.
Leon conseguiu se desvencilhar, porém levou um golpe, teve que se jogar para não ser arranhado.. A menina-zumbi então partiu imediatamente para cima de Helena, atirando-a no chão, batendo os dentes e grunhindo. O loiro equipou sua arma e desferiu o primeiro tiro, que pegou nas costas da criatura, o segundo... O terceiro... Foi à deixa para que Helena conseguisse inverter as posições, saindo debaixo da zumbi.
A morena encostou o cano de sua pistola contra a testa da criatura. Tentando não pensar muito... Atirou. Sentiu o sangue espirrar contra seu rosto. Permaneceu observando a poça de sangue que se formava. Então se levantou, apavorada.
“– Eu... Eu não posso acreditar nisso.”.
“Definitivamente... Ela não parece uma assassina.”
“– Ok. Você fez bem. São eles, ou nós. E eles não hesitam.”. – Leon não esqueceu quem ele era, e porque ele estava ali. Mas era de seu caráter, era quase um instinto, desde seu primeiro dia como policial, talvez desde sempre. Ele tinha que consolá-la, orientá-la e protegê-la. Era mais forte que ela.
“– Por quê que isso tem que acontecer?”. – Helena tinha a voz trêmula. O elevador chegava ao seu destino final, ambos podiam escutar os gemidos horripilantes vindos da garagem. – “– Eu acho que não estamos sozinhos...”.
“– Helena agarre sua arma...”.
Ele sussurrava de maneira cautelosa, não aparentava ter nenhum medo, mas sim, parecia querer acalmá-la e a preparar para o que estava por vir.
Então a porta se abriu. Não contaram quantos... Sabia apenas que eram muitos. Leon foi o primeiro a atirar, abateu dois, um tiro em cada cabeça. “– Merda! Não os deixem entrar!”. – Ele era forte e conseguiu abater mais alguns com golpes físicos. Helena ajudava como podia, mas não pôde evitar que a horda começasse a invadir. Usaram então os golpes físicos para sair dali e correr para a garagem.
Leon era um homem forte de trinta e seis anos, lutava bem e tinha boa mira. Vê-lo em ação, finalmente a despertou de que ela também era uma combatente, e aquilo tudo era real, não um simples pesadelo. A morena lutava bem, seus golpes eram eficientes, era capaz de esmagar a cabeça de um zumbi com o cotovelo.
Os carros tinham seus alarmes disparados, e o barulho chamava mais e mais zumbis. Uma nova horda tentava arrombar o portão de ferro que estava prestes a ceder.
“– É a nossa deixa para sair daqui.”.
“– Eu não poderia concordar mais.”. – Ela respondeu.
Correram para o acesso as escadas, abandonando a ideia de conseguirem um carro. Deixaram os zumbis para trás e trancaram a forte porta de aço atrás de si. Usaram algumas cadeiras e uma mesa de ferro para evitar que a horda arrombasse a porta.
Leon olhou a sua volta e percebeu que estavam na guarita da segurança, havia vários monitores com imagens das câmeras de segurança. Em um dos monitores, tinha a imagem de sobreviventes pedindo por socorro, eram jovens estudantes trancados no hall de entrada da Universidade.
“– Vamos!”. – Ele correu para a porta de saída.
Helena observou o monitor, a mesma sala estava infestada de zumbis...
“– Leon é tarde demais.”. – O agente freou os próprios pés.
“– Não há mais nada que você possa fazer.”.
Sabia que ele a odiava, e tinha seus motivos para isso, sabia que não deveria contrariá-lo... Mas também sentia que eram de certa forma, parceiros agora, só tinham um ao outro, deveriam se ajudar e cooperar. E claro, chamar o outro de volta a razão de vez em quando, caso contrário, não sobreviveriam.
Pela segunda vez ela viu os lábios dele tremerem, pela primeira vez ela não teve aqueles olhos azuis inquisidores como se a fuzilassem, mas sim a encarando de maneira triste. Ele era um homem honesto, que queria fazer o bem. Ele estava sofrendo. O amigo morreu pelas suas próprias mãos, pessoas estavam morrendo diante dele, um velho pesadelo estava se repetindo... E tudo isso, era culpa dela.
“– Você tem razão.”. – Dois segundos, e foi tudo o que ele precisou para se recompor.
“– Vamos embora daqui.”.

Leon and Ada Side Story (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora