Capítulo 04 - Trabalhando com o diabo

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Eu não queria acordar.

Minha cama sempre me parecia convidativa, mas naquele dia estava como nunca. Minha mãe me sacudia enquanto eu relutava para abrir os meus olhos. Meu cansaço mental era notório.

Depois de muita luta por parte de minha mãe, eu finalmente abri os olhos e me levantei. Minha cabeça estava pesada, como se carregasse o mundo sobre minha cabeça. Me dirigi ao banho e logo que fiquei completamente pronto, desci e cumpri a mesma rotina de sempre até à escola.

Minha rotina era basicamente a mesma sempre. Todos os dias eu levantava, me arrumava e ia para a escola. Todos os dias depois da aula havia grupo de estudos, estudávamos e eu voltava para casa. Eu jantava, conversava com Lisa pelo telefone e dormia. Era muito chato aquilo. Nada de novo. Parecia às vezes que eu estava vivendo o mesmo dia várias vezes. É isso que eu falo quando digo que levo uma vida monótona, que sou um cara de vida simples e comum. Por mais que as coisas acontecessem de forma diferente todos os dias, mas o itinerário dos dias acabava sendo o mesmo.

Assim que cheguei na escola, fiquei sabendo por Lisa que não haveria grupo de estudos naquele dia, pois Matthew iria ter de resolver suas pendências na parte da tarde. Aquilo me dava um tempo para me preparar. Eu ainda não sabia como iria encarar todos depois do meu surto no dia anterior, mas tinha que ser responsável o suficiente para as consequências das minhas próprias ações.

Me sentia diferente depois de tudo. Sentia que estava descobrindo um novo eu. Sentia que talvez não conhecesse os meus próprios limites. Eu ainda não me vira chegando aos meus limites por completo. Aquilo me fez perceber que às vezes nem nós mesmos nos encontramos em uma situação extrema. Nessas horas se conhecer não é o suficiente. Você nunca sabe como agirá diante de uma situação súbita durante sua jornada viva.

Por mais que tivesse me descoberto gay aos meus doze anos, quando realmente tive a completa certeza, ainda demorei um tempo para admitir aquilo para mim mesmo. Eu tentei mudar aquilo. Confesso que tentei. Mas não podia mudar a natureza das coisas. Não era como provar uma comida exótica tantas vezes que seu paladar acabava se acostumando com o gosto estranho. Isso era quem eu era. Nada mais, nada menos que isso.

Por ter crescido num meio religioso, aquilo me fez reter-me dentro de mim mesmo. Eu não podia ser quem eu era porque não era certo. Cresci com tudo aquilo em minha mente e foi aí que meus sentidos começaram a me intrincar. Minha cabeça agia a mil. Eu não queria sentir nada daquilo que eu sentia, mas eu simplesmente sentia. Queria mandar em meus desejos, queria sentir o que todo mundo sentia, queria ser normativo, mas o único problema é que de milhões de pessoas no mundo eu fui sorteado gay e justamente numa família extremamente religiosa. Que ironia não? O destino começou a me pregar peças desde o nascimento. Acho que dentre todas as pessoas eu fora conscrito para viver a famosa ironia do destino. Que legal!

Eu por diversas vezes pedi a Deus que simplesmente me fizesse normal. Que tirasse tudo aquilo da minha mente. Mas de nada adiantou. Talvez fosse o recado dele me dizendo que havia me criado daquela forma. Não sei. Lutei contra mim mesmo por muito tempo. Uma guerra em vão. Talvez eu devesse parar de perder tempo me alto flagelando e realmente passar a me aceitar como eu era. Foi então que aos quinze anos eu decidi sair do meio daqueles que me condenavam e ter de aturar apenas o julgamento dos meus pais mesmo, o que era muito ruim, mas não como ter uma congregação inteira para te julgar.

Meus pais se escandalizaram muito com a minha saída do evangelho. Na verdade, eu não abandonara a fé em Deus, mas o ninho de fiéis intolerantes. Mesmo assim para eles aquilo fora algo como roubar um banco para meus ou até mesmo matar alguém. Mamãe chorou por dias. Não via motivo para tudo aquilo, mas aconteceu. Tudo o que fiz foi ficar trancado no meu quarto até tudo se normalizar.

O Diabo na minha JanelaOnde histórias criam vida. Descubra agora