Lost

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08 de Março de 1970

Querido H

Meus dedos percorrem o lado adormecido e vazio da minha cama, ausente de tua presença assim como meus lábios dos teus beijos. Acalento-me no calor das brasas já que de teus braços eu não poderei, nunca e jamais irei fazer parte.
Acendo as lamparidas a meia noite e caio sobre o chão, ainda entorpecido pelo álcool já que de ti eu só tenho escassez.

- Seu Boo


Harry Edward Styles

   As pálpebras de Harry pesavam avidamente, adormecera no banco do trem em movimento quando o seu corpo se cansou da mesma posição por horas a fio e seus olhos já enerves e enfadados. Com o lento decorrer das horas e a paisagem repetitiva de árvores cobertas por camadas finas de neve, os campos brancos como se um tapete felpudo fosse estendido pelo mesmo já não mantinham seu corpo atento. Seu psicológico o deixou exausto enquanto pensava em Louis, toda aquela situação o atingia como um raio caindo sobre terra assim que se recordava do porquê estar deixando o país.

Ele acordou quando o trem chegou ao fim do seu destino por aquele dia, era o seu limite e o mesmo precisava de outro trem para prosseguir com a viagem. Com a informação de que o trem iria atrasar por mais de uma hora, Harry permitiu-se acomodar em uma mesa dentro de um simples café em frente aos trilhos. O cheiro de croassiant fresco se fazia presente no ar, notou no balcão alguns pães que pareciam ter saídos de uma vitrine famosa de Paris ou até mesmo da Itália.

O estofado era macio e o ambiente era quente e aconchegante, abraçando-o em meio a todo aquele cansaço quando pediu uma xícara de café e releu a mesma carta em seu bolso. A prova de que alguém o amava demasiadamente, por entre seus dedos abaixo de suas digitais onde seus olhos pudessem chegar.

— Meu marido me escrevia cartas de amor - Uma voz preencheu o ambiente quase silencioso se não fossem as vozes abafadas ao lado de fora. Ao erguer o tronco os olhos de Harry repousaram sobre uma mulher com as feições maduras tomadas por rugas, seus lábios finos se curvaram em um sorriso e lentamente ela ajeitou o cachecol sobre o pescoço.

— A senhora escrevia para ele? - Harry dividiu o olhar entre a carta e a senhora brevemente, indicou para que ela se sentasse na sua frente quando se afastou do balcão após pagar o seu chá.

Cheirava a maçã e canela quando ela repousou o pires sobre a madeira polida.

— Ah, sim querido - Abaixo dos seus olhos surgiu uma coloração rosada em meio as suas bochechas prendendo a atenção do homem com cachos. - ele escrevia lindamente. Ainda guardo todas as carta abaixo da minha cama.

— Por que escreviam cartas? - Questionou Harry indagando pequenas possibilidades em seu subconsciente adormecido, despertando-o da sua maré baixa e retomando as engrenagens.

— Ele foi enviado para a guerra. Achei que nunca mais poderia vê-lo - o reflexo de tristeza tilintou em seus olhos, fazendo-a baixar brevemente o rosto e uma mecha do seu cabelo branco cair sobre a testa enquanto remexia a xícara de chá, finalizou com duas batidinhas da colher sobre a borda e segurou a alça com firmeza. - ele era um homem muito ciumento eu posso afirmar. Escrevia para mim pois acreditava que assim me manteria o amando.

— Parece te funcionado. - Harry utilizou o seu bom humor, sem expressar com sorriso senão apenas por seu tom de voz.

— E funcionou. Mas nós faziamos dar certo. E quanto a você querido? - Os olhos da mulher o ditaram por cima da borda da xícara quando ela aproximou dos seus lábios para bebericar o conteúdo ainda quente, deixando resquícios do seu batom rosado sobre o pires sem ela se dar conta.

— Oh não, eu não escrevo  - Harry passou seus olhos sobre a carta um pouco envelhecida devido suas últimas viagens. - minhas palavras não chegariam perto das palavras dele-dela! - se auto corrigiu e a mulher o encarou curiosa, mas não questionou sua breve mudança.

O seu pedido chegou e ele sentiu um alivio pela interrupção, fora uma boa escapatória de algo o qual poderia vir a ser constrangedor.

— Eu me chamo Mary - Disse assim que tornaram a ficar a sós. - agora não precisa ter medo de dizer que ama um homem.

Harry quase cuspiu para o lado o líquido dentro da sua boca, ocupando o espaço nas bochechas as quais ele inflou como um mecanismo de defesa para manter o conteúdo no mesmo lugar. Sua garganta parecia estar sendo cortada quando engoliu com muito pesar e força o café, pousou a mão sobre o peito e sua reação inesperada fora o suficiente para Mary concluir que estava certa.

— Veja querido, você tem certeza? - Harry encarou-a confuso.

— Como?

— Veja bem, está na flor da idade. A juventude está fora de controle! comete absurdo como esse as vezes e tudo bem, desde que volte para o caminho certo o quanto antes. - Harry ergueu suas sobrancelhas um pouco anestesiado por suas palavras.

— O caminho certo seria voltar a estar com mulheres?

— É assim que deve ser querido. - Ela disse com calma e Harry desviou o olhar, balançou a cabeça e afastou lentamente a xícara. Ele se colocou de pé e deixou dólares a mais como gorjeto pelo bom café, não por quem o frequentava. - está de saída, querido?

— Tenho um trem para esperar. Deve estar chegando a plataforma neste instante. - Usou uma boa desculpa enquanto colocava seu sobretudo sobre o seu corpo e a mesma acenou, com um sorriso genuíno nos lábios e Harry prosseguiu para fora do local.

Se recordou das ondas pefeitas do cabelo de Anelie que caiam sobre seus ombros, como uma castaca de ouro sendo despejada de um baú. Seus lábios eram destacados por um batom o qual mesmo que tentasse ser discreto, tudo em Anelie chamava a atenção além da sua beleza. Mas não era em seus braços que Harry estava procurando resposta e indo encontrar. Questionou a existência de um Deus maior acima dos seus ombros e se questionou de como ele poderia ser tão egoísta em coloca-lo em um mundo onde, Louis era proibido de ama-lo.

Ninguém deveria ser proibido de amar.

  Com o trem se aproximando, Harry novamente segurou sua mala a margem da plataforma de volta para o trem. Apertou a alça com um pouco de força tentando manter sua mente mais aberta, livre de arrependimentos quando suavizou o aperto e sentiu sua mala ser puxada de abrupto.

— Hey! - Ele gritou, franzindo a testa quando notou que um homem fisgou sua mala como um peixe próximo a rede e correu para longe.

Por fim Harry lembrou-se de que deveria correr, ir atrás do que lhe pertencia. Quase tropeçando nos próprios pés ele gritou atrás do homem chamando todos os olhares para sí. Seus documentos, roupas e dinheiro estavam lá e agora estava tudo quase a ser perdido. Ao concluir tal pensamento o mesmo avançou em meio as pessoas e agarrou a ponta do casaco do homem, mas o peito de Harry doeu e ele o soltou quando o ar esvaiu por completo e o foragido conseguiu se esgueirar na multidão e sumindo com tudo que lhe pertencia.

Desnorteado e sem qualquer ajuda ele se inclinou para frente e apoiou as mãos no joelho, tomando ar enquanto seu subconsciente girava como uma garrafa ao centro de uma mesa durante um jogo entre adolescentes. Olhou ao redor e perguntou para quem estivesse próximo se poderiam saber em que direção o homem poderia ter ido.

O barulho do trem se fez presente e Harry correu para o mesmo e as portas se fecharam diante do seu rosto. Seus gritos em protestos foram ignorados e agora, Harry Styles estava perdido em algum lugar do país, sem mala, roupas, documentos, trem e... Seu amor.

A última carta | L.S. Onde histórias criam vida. Descubra agora