Cobrança

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- Gwendolin.- chamou vendo seu rosto pálido.- Gwen, por favor...- pediu lhe tocando angustiado.

- Achei que ela tinha ido embora, e não atendia o telefone por estar irritada comigo.- comentou Joe.

- Faz quanto tempo?- perguntou o loiro.

- Quase um mês desde a última vez que a vi. Mendy me alertou dela não ter levado suas coisas, mas não me ative a esses detalhes.- confessou.

Azrael, olhou pesaroso para a moça. Temia que a ida dela a Abismus tivesse algum efeito negativo nela.

- Antes de desmaiar, ela chamou por Ouriel.- o Ceifeiro não gostava de lembrar do arcanjo que fizera parte do passado Celeste de Gwen.- Acha que devo chamá-lo?- indagou.

- Talvez ele saiba o que fazer para que ela acorde.- o mecânico deu os ombros.

Joe estava certo, Az pensou. Ouriel saberia o que fazer para trazer a Abençoada de volta a lúcidez.

- Ouriel, sas epikaloúntai (Ouriel, te invoco).- entoou o loiro sem muita vontade.

Instantes depois, Ouriel estava na sala do Mestiço. Seu olhar recaiu imediatamente sobre Gwen. Se ajoelhou tocando o rosto da morena que estava com a pele pálida e ainda desacordada. Desconfortável pela cena, Joe pigarreou atraindo a atenção do arcanjo.

- O que houve com ela?- indagou Ouriel.

- Ela foi me buscar em Abismus.- disse o Ceifeiro.

- Como?!- exclamou aflito começando abrir a camisa da morena.- Quanto tempo ela esteve lá?

- Eu não sei...o que está fazendo?- rugiu o anjo negro afastando o arcanjo da Abençoada.

- Ela deve ter sido envenenada pelo ar de Abismus.- respondeu se abaixando novamente para a jovem.- Tenho de tirar todo o ar poluído do organismo dela.

Azrael e Joe observavam os gestos e murmurios do arcanjo que massageava o peito da morena sentido o pescoço. O Mestiço teve de segurar o loiro que avançou para Ouriel quando este se inclinou e beijou a Abençoada. Não fora um beijo exatamente, um selar de lábios. No instante em que o arcanjo se afastou, expeliu um neblina escura.

Gwen sentia o corpo cansado e quente. O peito queimava enquanto tossia. Um gosto amargo habitava em sua boca. Abriu os olhos e se viu cercada por três rostos conhecidos.

- Áz.- sussurrou com a garganta seca. Logo o anjo negro estava ao seu lado, colando suas testas e afagando seu rosto.- Agora você está aqui.- comentou sorrindo debilmente.

- Sempre estarei, Gwen.- assegurou beijando sua testa.

- Ela precisa descansar, aspirando mirra.- informou Ouriel.

- Leve ela para o quarto, Áz. Eu vou comprar algo com esse cheiro...- ofereceu Joe vestindo um casaco.

O Ceifeiro ergueu o corpo da morena nos braços e se deparou com o arcanjo ainda ali.

- Obrigado pela ajuda. Mas não há necessidade de permanecer aqui.- falou tentando não soar rude.

- O que houve com suas asas?- questionou enfim notando o loiro.

- Nada. Sempre foram assim.- deu os ombros e subiu as escadas carregando Gwendolin.


***


Gwendolin cordou em um sobresalto. Havia tido sonhos obscuros. Lúcius lhe cobrava o trato, enquanto Azrael a olhava cada vez mais distante.

O coração acelerado como se estivesse na garganta. Percebeu um calor a suas costas e algo macio em seu ombro. Talvez tenha sido o cheiro que lhe mostrara que era o anjo negro ali mesmo antes de se virar para olhá-lo. Domia com os fios loiros levemente arrepiados, as asas a abraçavam como se fossem braços, como uma ave mãe acolhe seus filhotes.

A morena tocou as plumas que eram da mesma maciez que as negras, porém, a cor era diferente, igualmente belas.

Com um suspiro, as palpebras do homem se mexeram e abriram mostrando os brilhantes olhos claros.

- Gwen.- murmurou puxando-a para mais perto fechando as asas.- Como se sente?- perguntou.

- Bem.- sorriu para a pequena cabana se penas.- Quanto tempo se passou?

- Um dia, acho.- deu os ombros.- Senti sua falta.- ronronou beijando-a no rosto.

- Não mais que eu.- afirmou beijando lhe nos lábios.

- Gwen,- chamou.- Temos de conversar, sobre como conseguiu entrar em Abismus...Quem a levou?- inquiriu sério.

O sorriso da jovem morreu quando se lembrou do trato. Seus olhos transmitiam culpa e medo. Esse último foi como um tapa no loiro. Nunca quis esse sentimento nela. Medo. Ainda mais dele.

- Diga, Gwen.- pediu serenamente abraçando-a forte. A sentiu se encolher em seu peito e soluçar.

- Eu já não sabia mais o que fazer...então ele apareceu...e ofereceu um trato...- gaguejou entre os choros.- Me levaria para que lhe buscasse...em troca lutaria ao lado dele...

- Com quem fez esse trato?- perguntou se sentindo culpado. Por sua causa, a morena estava naquela situação. Se não tivesse ido ao cemitério em sua busca por Misericórdia, nada daquilo estaria acontecendo.

- Lúcius...- murmurou apertando-o. Estava em uma grande encrenca. Não poderia romper o trato sem que morresse. Somente o demônio poderia cancelar ele.

Ao ouvir aquele nome, o Ceifeiro ficou tenso. Era assim que o Senhor chamara seu pai. Lúcius. O primeiro que caiu.

- Como-como é esse Lúcius?- o anjo negro fechou os olhos lembrando-se da imagem de seus pais. Um homem alto e forte. De cabelos longos e loiros. Olhos verdes e profundos, queixo angular. Sua mãe, pequena e jovem. Iluminada como o sol. Um sorriso doce e encantador...

- Para que quer saber, anjo?- a moça estranhou a pergunta.

- Curiosidade.- sorriu fraco.

- Arrogante, prepotente, manipulador...

- Não.- riu.- Digo, como ele é fisicamente? Sua aparência.

- Oh.- ruborizou.- Grande, forte, um cabelo liso e loiro. Olhos de lince. Asas brancas...sei lá.- riu relaxando um pouco.- Por que quer saber?

- Porque...ele é meu pai.- confessou.

- O quê?!- exclamou se sentando na cama.- Como assim, Lúcius é seu pai?- guinchou perplexa.

O Ceifeiro tentou resumir todo o acontecido em Firdaus. Desde que deixara o cemitério até o momento em que a encontrou. O mesmo fez Gwendolin em relatar como fizera o trato com Lúcius.

- Agora tudo faz sentido. A revolta, a fúria e amargura de Lúcius...ele tinha sofrido. Sofrido por amor.- comentou se recordando de algumas vezes em que flagrara o arcanjo com o olhar vago.

- Mas se voltar contra o Pai? Começar uma guerra? Isso já é demais...- murmurou o anjo negro.

- Eu sei. Mas não o culpo. Talvez eu mesma teria feito igual. Amor assim, é para sempre...além da vida até.

Gwen tinha razão, pensou Azrael. Ele faria o mesmo ou até pior caso lhe tirassem a Abençoada. E quase o fez. Se não tivesse ouvido a voz da moça. Teria destruído boa parte de Firdaus para descer para a Terra e se encontrar com a moça novamente.

A trouxe novamente para o ninho de suas asas e a beijou. Beijo urgente e faminto. Não tinha ficado tanto tempo sem sentir a pele dela arrepiada sob seus dedos. Os ofegos soltos quando lhe beijava o pescoço. Suas mãos se infiltraram na camisa dela, sentindo o calor que era pórpio da moça.

- Cena tocante.- uma voz entediada ecoou no quarto asustando o casal.

Ambos olharam para a figura alta e ereta. Anjo negro tinha os olhos arregalados para o ser a sua frente.

- Lúcius!- ofegou com o coração batendo louco no peito.- O que faz aqui?- perguntou olhando de lado para o Ceifeiro que encarava o arcanjo.

- Vim para cobrar nosso trato, irmã.-Lucifer olhou para o anjo negro.- Esse seria o Ceifeiro que fez com que arriscasse sua vida humana?- franziu o cenho como se o reconhecesse. Algo no Ceifador era familiar para o arcanjo.- Creio que não o conheço...?

Azrael olhou para a morena pedindo que não dissesse nada.

- Esse é o Áz. Como vê, ele não é mais um Ceifador.- informou a moça.- Seu trato se restringe a mim, Lúcius.

- Pois bem.- resmungou desconfiado. Algo nos olhos do anjo negro intrigou o arcanjo.- Esteja preparada para quando a chamar. Sabes que não adianta fugir, nosso elo me mostra onde está.- alertou sumindo depois.

Anjo NegroOnde histórias criam vida. Descubra agora