Se eu disser que não estou fatalmente atraída por João Ignacio eu estarei sendo uma das pessoas mais mentirosas do mundo todo.
Não que ele seja um Adônis como Paulo, mas ele tem lá seu charme. Os cachos negros, os olhos de cachorrinho ferido, as bochechas marcadas, os lábios almofadados... O conjunto todo não é nada mau. Isso sem falar na personalidade intrigante dele. Só de estar dividindo o mesmo ambiente que ele, já sinto um milhão de borboletas passeando pela minha pele e sambando no meu estômago.
João tira os olhos do menu e os coloca em mim. O sorrisinho de lado, típico dele, é a reação natural que ocorre em seguida.
Parece ridículo que estejamos aqui, em um restaurante de luxo no centro turístico da cidade, fazendo uma pausa para o almoço, enquanto o mistério do Sanatório rola solto além do nosso alcance, mas João me garantiu que precisaríamos estar bem alimentados antes de entrar nos detalhes sórdidos. Além disso, ele insistiu que o almoço seria por conta dele. Não sou eu que vou reclamar.
Limpo a garganta, me sentindo um pouco desconfortável sob o olhar de João.
— Por que decidiu confiar em mim? — eu pergunto por fim. — E por que não quis contar pra Leta, pra Toni e nem pro Paulo, que é seu irmão?
Ele comprime os lábios em um biquinho e entorta a boca, me olhando de forma pensativa.
— Primeiro de tudo — ele fala, colocando o menu sobre a mesa. — Eu não confio em você.
— Mas...
— Não ainda — João corrige. — Mas eu tô precisando confiar em alguém. E você tá precisando da distração. Só achei certo unir o útil ao agradável.
— Tá, mas e por que você não contou nada pro Paulo? — eu insisto. — Aliás, por que mentiu pra ele tantas vezes sobre esse assunto do Sanatório? Eu achei que vocês dois se dessem bem. Por que você não confia nele?
Nessa hora o garçom, que aparentemente é um velho amigo de João, se aproxima e pergunta se nós já decidimos o que vamos comer. João fala que quer o risoto de funghi, e eu imito só para não ter que admitir que esse tempo todo que era para eu estar olhando o cardápio e escolhendo meu prato eu estava distraída observando João.
— Vocês vão querer vinho? — o garçom pergunta.
— Duas taças do Pinot Noir da casa por favor — João diz com naturalidade. O garçom assente e vai embora. Eu faço uma careta impressionada com o jeito casual que João pede a bebida alcoólica em público mesmo nós dois sendo menores de idade, ao que ele dá de ombros e diz: — O quê? O Brasil nos obriga a beber.
Eu rio, mas lembro, cruzando os braços:
— Você não respondeu a minha pergunta.
— Sobre Paulo? — João suspira quando eu confirmo com a cabeça. — É que cheguei em um ponto que não dá pra confiar em ninguém da cidade. Tem muita gente aqui que não é quem diz ser.
— E por que você não confia na cidade? — pergunto. — O que foi que Hortência fez para você?
A expressão no rosto de João fica muito sombria de repente. Eu quase me arrependo de ter trazido esse assunto à tona, mas ao mesmo tempo estou tão curiosa que a reação dele faz tudo valer ainda mais a pena.
Ele desvia os olhos de mim e sorri quando vê o garçom voltando com nossas taças de vinho.
— Ooopa! — diz, aceitando a própria taça e já dando um belo gole de cara.
— Juízo, rapaz! — o garçom alerta rindo.
— Como eles deixam você beber assim, sem nem questionar? — eu pergunto quando o garçom se afasta.
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Psicologia Reversa
Teen FictionVovó Henriqueta acha que houve uma falha monumental na criação de sua neta. Tio Ivan, por outro lado, acredita que a teimosia de Isabel esteja diretamente relacionada aos três Touros em seu mapa astral. A opinião profissional de Tia Anni...