Capítulo 7 - Intensidade

8.4K 1.1K 1K
                                        


Na segunda-feira, acordo com o despertador às seis da manhã, e leva um tempo para me situar. Aos poucos, meus sonhos me transportaram de volta para a vida normal, e por uns instantes eu esqueço que não estou em casa.

Não, isso não é verdade.

Eu estou em casa.

Essa é minha nova casa.

Cubro o rosto com as mãos e respiro fundo, tentando debater comigo mesma se preciso realmente me levantar para encarar o dia.

Por um lado, depois de tudo por que passei, até o Papa diria que mereço uma folga, e não vai ser difícil convencer minha mãe do mesmo. Me sinto péssima em dizer isso, mas a culpa que ela sente trabalha em meu favor em alguns casos.

Por outro lado, sei que, se eu não for para a aula hoje, eu vou ter que ir amanhã. Ou no dia seguinte. Ou no dia seguinte do seguinte.

Faltar a aula hoje será apenas adiar o inevitável. Não consigo evitar pensar no que tio Ivan me disse no sábado, quando cheguei. Fugir um problema apenas aumenta a distância entre você e a solução. Rio sozinha. Maldito tio Ivan. Ele está certo, de certo modo, em sua filosofia barata.

Eu sei disso.

Portando, chuto as cobertas e me forço a levantar.

Mamãe não está mais aqui. Estou sozinha na cama, apesar de ela ter vindo passar a noite comigo de novo. Ela já deve ter acordado, embora eu não saiba o que diabos possui alguém para acordar antes das seis da manhã por boa vontade.

Ou talvez não tenha sido por boa vontade.

Talvez os fantasmas estejam a assombrando também.

Pobre mamãe.

Mas me recuso a pensar nisso, porque pensar nela é pensar em mim. Pensar no que a machuca é pensar no que me proibi de pensar. Empurro todos esses pensamentos perigosos para o fundo, bem no fundo, inalcançáveis, trancados a sete chaves, e marcho para o banheiro para me aprontar antes que eles encontrem as fraquezas na minha muralha.

O uniforme da escola nova é deprimentemente simples. Cinza e sem- graça. Uma camiseta de algodão, uma calça bailarina. O emblema da instituição estampado no meu peito. Me sinto apagada quando vejo minha imagem no espelho. Eu ainda existo?

Coloco uma presilha colorida no cabelo e pinto meus lábios com meu batom mais forte. Me recuso a desaparecer, o que é claramente o que eles querem que eu faça, me obrigando a usar essa capa da invisibilidade em forma de uniforme.

Quando estou descendo para a cozinha, escuto o barulho do liquidificador e faço uma pequena oração pedindo a Deus que seja apenas minha mãe e não algum outro familiar inesperado.

Mas não é uma coisa nem outra.

Eu congelo no lugar entre um passo e outro, sem saber se devo mesmo dizer oi ou se posso simplesmente fazer a meia volta e sair dali.

Há um cara na cozinha da vovó, um cara que nunca vi antes na minha vida.

Isso talvez não fosse tão estranho se não fossem seis da manhã ou se ele não estivesse completamente sozinho ali, como se a casa fosse sua.

Antes que eu tenha a chance de me decidir entre ir e ficar, ele se vira na minha direção e sorri.

— Oi — diz. — Você deve ser a Isabel.

Eu olho para ele, olho para o liquidificador onde ele está batendo alguma coisa verde e gosmenta, olho de volta para ele.

— Oi — digo finalmente.

Psicologia ReversaOnde histórias criam vida. Descubra agora