As Sereias de ciano

21

— isso é possível? Traze-la de volta?

— sim.

— mas como? — Liana me olha e volta a ver o semblante pálido e  calmo de Lavínia.

Aparentemente o mar curou o ferimento em seu pescoço a deixando belíssima tal como era antes. Mas só isso.

— sabe as pérolas que Lavínia usava para ter pernas? Elas também podem trazer a vida dela de volta.

— isso não é possível. — Liana me olhava incrédula.

— não é possível agora somente daqui à dois dias quando a lua estiver cheia. — digo e ela me olha esperançosa.

— e o que precisamos fazer até lá?

Bom essa era a nova questão. Já teríamos que ter dado o corpo de Lavínia para a deusa sereia da morte para que sua alma pudesse descansar em paz. Mas sei que o desejo dela é voltar para a vida marinha e cumprir sua promessa.

— temos que  proteger seu corpo até a lua cheia. Garantir que nada nem ninguém a leve daqui. — digo firme.

— levar quem daqui? — disse Celly chegando sorrateira atrás de nós. — oh minha deusa do mar Lavínia está morta mesmo? — ela parecia surpresa.

Celly apesar de parecer calma era bem perigosa, ela e meu irmão são bem parecidos. Os dois não medem seus atos o que só torna tudo perigosamente imprevisível.

— sim. — respondo.

— não me diga que foi o príncipe?

— sim Celly foi o príncipe Tristan o rei e seus súditos. E se prepara por que foi só o começo. — Liana tinha um ar de premonição.

Não queremos mais mortes, ela deve ser a primeira e última sereia a morrer por causa de capricho e preconceito alheio.

— escute Celly, você não pode contar que ela está aqui à ninguém. — digo pegando em sua mão, mas ela recusa meu toque.

— eu não ganho nada com isso, mas vou pensar. E se a deusa da morte vier buscar seu corpo o que eu digo? — as mudanças de humor de Celly aconteciam rápido demais.

— finja que os peixes à comeram. — disse Liana com pesar em sua voz.

Estava sendo difícil lidar com isso e Celly não ajudava muito.

— sabe que ela não acreditaria nisso, não é?

— sabemos. — eu e Liana respondemos juntos.

— temos que proteger Lavínia. Seja da sereia da morte ou de qualquer outro ser, entendeu? — Celly me olhava confusa e distante mas acho que ela entendeu.

— tem certeza que ela vai voltar? — ela nada até Lavínia e cutuca seu corpo. — ela parece morta demais pra voltar assim do nada só com o poder da lua e das marés?

— mas vai ser assim mesmo Celly. — disse Liana se aproximando dela. — e nada de tocar, furar ou torturar o corpo dela. Entendeu?

— claro mamãe. — Celly saiu de perto irritada. — vocês estão nessa já eu não tenho nada haver. Mas vou tentar manter minha boca calada. — disse saindo.

— ISSO. Fique de boca cheia e calada de preferência. — Liana falou um pouco mais alto mas Celly já não estava mais na caverna.

— acha que ela vai contar para alguém? — pergunto atraindo o algar dela para mim.

— não sei. Não confio totalmente em Celly mas ficarei de olho. E você pretende ficar aqui até ela acordar?

Meu plano era proteger Lavínia até que ela acordasse mas acho que isso não vai ser possível ou levantarei suspeitas. O rei e Tristan não podem desconfiar de nada.

— hoje eu fico com ela mas amanhã é sua função proteger Lavínia. — digo para Liana que apenas concorda.

— mas eu não vou sair de perto dela. — avisou.

Eu não esperava menos.

Já estava quase anoitecendo quando aquela figura inóspita e estranha surgiu na entrada da caverna, ela não entrou mas ficou parada alí por um bom tempo. Já sabia quem, era seus olhos brancos com tons de um vermelho brilhante nunca me saíram da memória não depois de ter visto ela levar minha mãe, aquele dia foi um dos mais tristes da minha vida.

Ela estava bem alí a esperar para levar mais um corpo que não seria aquele, não o dela. Ela prometeu que retornaria e pretendo ajuda-la a cumprir.

— o que eu digo a ela? — perguntava Liana fazendo menção de ir falar com a sereia.

— diga que ela está só descansando. — digo segurando a mão levemente quente de Lavínia.

Liana saiu em direção a sereia negra de olhos brancos e vermelhos as duas pareciam ter uma conversa calma. Mas sei que ela não vai desistir enquanto não tiver Lavínia em suas mãos. Liana logo retornava para onde estamos no entanto ela continuava na entrada vigiando todo e qualquer movimento nosso.

— o que ela disse?

— eu expliquei tudo e ela disse que quer ficar para acompanhar o tal milagre.

Ela queria uma prova e nada melhor do que estar presente e ver Lavínia acordar. Claro que tenho medo que ela não acorde mas Lil prometeu e costumo acreditar em promessas, mesmo sendo tão vaga quanto essa.

...

Os primeiro raios de sol já invadiam a caverna e meus olhos ardiam por sequer conseguir fecha-los, dormir não era uma escolha. Não com a morte a dois passos de nós. Olhei mais uma vez para o rosto pálido de Lavínia só mais uma noite e ela estará de volta. Não sei quais serão seus planos quando acordar, mas sei que fara de tudo para o reino ser um lugar melhor.

E agora? Agora eu precisava retornar a terra firme e resolver algumas pendências. Todas elas na verdade. Passo algumas instruções para Liana antes e saiu encarando uma senhora morte que me segue com os olhos, aqueles olhos que podiam aterrorizar qualquer um. Pensei em falar com ela porém deixei passar, não iria entrar em um confronto com a morte já que eu teria muitos outros pela frente.

Continua...