As Sereias de ciano

28

Eu precisava saber por que ela ainda estava com ele mesmo estando chocada com suas confissões. Íris me olhou desconfiada.

— estou aqui porque exatamente Tristan descobriu que somos irmãos apenas por parte de mãe, eu contei a ele parte da minha história e o nome da minha mãe que por incrível que possa parecer traiu o rei com um reles mortal humano, e depois de descobrir sua traição o rei furioso mandou que a matassem. E por todo esse tempo pensei que ela tivesse desaparecida. — então ela é mesmo irmã de Tristan e Troy. — a rainha Aires não morreu em um naufrágio como disseram ao povo do reino, isso foi só um disfarce para mascarar o crime do rei.

— sinto muito por isso. Mas por que depois de saber de tudo ainda continua aqui?

— quero desfrutar de tudo o que não tive, e quem sabe me vingar do rei por ter matado minha única família.

— ao que me parece você está ajudando seu rei e os mortais a dizimar nossa espécie. — eu não devia ter revelado minha posição assim tão sedo. Tiana deve estar acordando e estou voltando a ser eu mesma.

— não pode ser, você está morta! — disse surpresa. — e mortos não voltam a vida.

Cheguei mais perto enquanto ela se afastava parecendo nervosa e chocada ao me ver, e bem viva por sinal.

— guardas... — ela gritou abafado e por sorte ninguém a ouviu.

— calma, AMIGA, eu não tenho intenção nenhuma de te machucar como você e seu irmão doente queriam fazer comigo. Aliás como eu não percebi a cobra que eu chamava de amiga, que eu adorava como irmã.

— me desculpe Lavínia, não foi minha intenção. — ela mal conseguia me encarar, tinha medo de mim e eu não sabia o porque já que ela sempre foi mais forte. — eu estava encantada por Tristan e aquilo tudo era uma brincadeira. Bom pelo menos eu achei que era.

— essa brincadeira me custou a vida, e em breve poderá custar a sua e a de todos que se envolveram nisso. — digo sentindo o ódio tomar conta e isso poderia ter efeitos desastrosos.

— como pode estar aqui se todos te viram morrer? Aí minha deusa da água você é uma assombração? — pelo visto ficar com Tristan também estava lhe tirando sua sanidade mental.

— não seja tola eu estou bem viva.

— então como fez para voltar? Por acaso foi algum pacto com o demônio? Leviatã? Poseidon?

Realmente Iris estava cada vez mais louca.

— eu não preciso me explicar. Nem para você mesmo que já tenhamos sido grandes amigas, minha família. — deixei uma lágrima solitária cair. Afinal não eramos mais as mesmas, nem eu nem ela.

— tudo bem, não me interessa. Só vai embora antes que te peguem aqui novamente.

— não finja que se importa.  — digo caminhando para a porta.

— sabe... Eu te admirava mas hoje não te reconheço mais.

Como consegui ficar tanto tempo perto dela e não percebi o quanto me odiava?

Deixei Íris com suas falsas lágrimas e toda a sua luxúria para trás. E quando passei em frente a uma porta entreaberta vi três seres conversando ou conspirando entre sí para capturar mais sereias, o rei, seu filho e seu lacaio de estimação estavam reunidos em volta de uma mesa com o que parecia ser mapas de rotas marítimas sobre a mesma. Não demorei espiando os três afinal logo saberiam que estive alí bem de baixo de suas barbas mal feitas e agora era hora de ir embora.

Não consigo acreditar em todas as escolhas horrendas de Íris, ela estava tendo um caso com seu próprio irmão. Tudo bem que a mitologia esta cheia de histórias assim mas isso não é fantasia é vida real, e eu esperava mais dela.

...

Consegui passar despercebido por todos os guardas do castelo, já a movimentação na cidade continuava a mesma frenética e tempestuosa. Aquelas pessoas estavam prontas para qualquer coisa seus arsenais pesados de caça que o digam. Por bem ainda estávamos seguros enquanto estivéssemos na água, o mar sempre foi nosso porto seguro, nossa fonte de vida e juventude  eterna pelo menos enquanto vivêssemos.

Vendo este lindo entardecer creio que deixamos muita coisa passar, talvez por minha culpa, e se quiséssemos poderiamos cantar e acabar de uma vez por todas com esses humanos idiotas.

Caminho em direção ao mar e antes de entrar escuto um homem dizer:

— moça, não vai é perigoso! — apenas me virei e dei meu melhor sorriso e me atirei na água ainda encarando sua expressão assustada.

Era lindo ver que pessoas temiam aquilo que não podiam controlar ou ter em suas mãos.

Me afastei nadando para longe notando que ele ainda me encarava. Não me importava mais se ele espalharia seu ódio para os outros. Só queria conseguir impedir todas as possíveis catástrofes que aconteceriam a qualquer momento.

— onde você estava?

Ouvi Troy se aproximando com seus lindos olhos brilhantes e me dei conta de que não eramos mais os mesmos desde que renasci. Nossa relação era distante e fria como se só salvar vidas fosse o mais importante.

Estávamos esquecendo do amor, afinal nossas vidas também eram importantes e quem nos salvaria se não nós mesmos?

E o vendo assim tão preocupado comigo não queria ter que mentir ou ser fria com ele.

— fui ao castelo.

— Lavínia não acredito que foi lá novamente, perdeu a noção?

Seu nervosismo era visível.

— eu não sei... Eu só queria saber de Íris.

— não vê que ela não se importa com nenhum de nós?

— acho que ela nunca se importou. — digo triste.

— o que ela te disse para te deixar assim?

— nada além da verdade. Ah, vocês... Vocês são irmãos. — digo o deixando preocupado, de certo não acreditou no que ouviu.

— o que você disse?

— você, Tristan e Iris são irmãos. A rainha Aires teve outro filho antes de morrer.

Ele parecia confuso ao mesmo tempo que alguma coisa começava a fazer sentido em sua cabeça.

— pode ser duro para você saber que seu pai mandou matar sua mãe porque ela teve um filho de um mortal. Eu te entendo. — segurei sua mão enquanto ele encarava um ponto fixo atrás de mim.

— eu desconfiava mas não tinha certeza. No dia da viagem ela estava agitada, eu ainda era pequeno, pedi para ir com ela mas ela insistiu para que eu ficasse com Tristan. Disse que seria uma viagem rápida e eu não sabia de nenhum outro bebê. — suspirou. — ela conhecia muitas bruxas e talvez tenha usado uma delas para encantar sua barriga de grávida.

— e quando seu pai descobriu não suportou a mentira e mandou que a matassem.

— e eu o odeio ainda mais por isso. Sabe que ele nos odeia por conta disso não é?

No começo não fazia muito sentido todo o ódio do rei por sereias já que ele também fazia parte da nossa espécie, mesmo com essa recente descoberta não me vejo capaz de o perdoar por ter me matado.

— por um motivo tolo como ele.

Diante de seu sofrimento silencioso relembrando um passado nada agradável eu só consegui o abraçar e pensar que um dia estaríamos livres de toda aquela injustiça.

Continua...