III

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15:12h

O tic-tac do relógio ecoava como sinos na cabeça de Vinícius. Seus olhos o encaravam de minuto a minuto, enquanto a mão atacava o caderno sem piedade. Ele olhou as pontas dos dedos, eles estavam enegrecidos pela reposição do estêncil. O menino nunca escrevera tão rápido. Nunca havia precisado fazer isso.

— Hilda! – Gritou, enquanto arrancava três das cinco folhas que escreveu.

— Oi, meu amor? – A mulher entrou pela porta do quarto.

— Preciso que preste muita atenção no que vou dizer. Não tenho muito tempo.

A mulher olhou para a medicação pendurada no suporte. Era apenas soro fisiológico, ele não deveria estar alucinando, e muito menos com um suave tremor que era notável apenas para olhos treinados.

— Tudo bem, meu anjo, pode falar – disse, sentindo algo estranho crescer dentro do peito.

Vinícius sentiu a dor aguda na fronte começar a expandir crânio afora, inflando uma bolha de pressão no ouvido interno. O menino cerrou os olhos para o relógio.

15:13h

— Entregue estás folhas para a Pâmela e esse caderno para a Luna. Não deixe que ninguém toque neste caderno, além da Luna. – O menino estendeu o caderno e as folhas para a pequena enfermeira. – A Pâmela não pode saber sobre esse caderno, entendeu? – Viu a enfermeira menear a cabeça, começando a se preocupar. – Diga a ela que eu te pedi folhas e que meu caderno não estava aqui. O caderno da secretária fica na primeira gaveta e é reciclado assim como o meu. Tire três folhas em branco e as jogue no latão da rua, tudo bem? A Pâmela não vai notar a diferença.

— Vinícius, você tá me assustando. – Pôs a mão na testa do menino – Meu deus do céu, você tá ardendo em febre, Vinícius!

Neste momento o menino se inclinou para frente, levado as duas mãos para as têmporas, apertando-as. Um grunhido de dor soou baixo por entre os dentes do menino, enquanto a enfermeira revirava a gaveta, a procura de um termômetro.

O garoto apoiou a cabeça no travesseiro, encarando novamente o relógio. Não faltava muito tempo, ele precisava ser mais rápido. Ele segurou o pulso da enfermeira com uma força que ambos não imaginavam existir.

— Vinícius, eu preciso med...

— Responda se entendeu! – Gritou, fazendo a mulher pular.

— Entendi, entendi... – Meneou a cabeça, assustada. – Caderno para Luna sem Pâmela saber. Folhas para Pâmela. Três folhas do caderno da recepção no lixo. Entendi, agora me deixe medir sua temperatura, por favor.

O menino largou o pulso da enfermeira, encarando novamente o relógio que marcava três e quinze da tarde. O barulho das engrenagens que moviam o ponteiro de segundos, neste momento, machucava o menino como se marretas acertassem-lhe a cabeça.

15:16h

— Obrigado, Hilda. – Recostou sem forças. A enfermeira apressou-se em descer a cabeceira. – Você é muito boa gente, dá pra sentir... – Fez uma pausa buscando ar. – Assim que puder, fuja para longe da doutora...

A mulher notou um fino fio de sangue escorrer do ouvido do menino, parecendo engrossar cada vez mais, enquanto os olhos começavam a também tingir de vermelho.

— Meu deus do céu...

A mulher enfiou a mão no bolso do jaleco e puxou o celular, colocando-o em discagem rápida, enquanto via o garoto, com sua primeira lágrima de sangue, olhar para os adesivos na parede. Vinícius encarou o telhado vermelho da casinha de PVC, deixando um inocente sorriso pintar-lhe a face sofrida. Os sons dos ponteiros ganhavam ecos distantes na mente de Vinícius. Ele sentiu-os reverberando pelo espaço.

UMA NOVA CHANCE - O Velho RyanOnde histórias criam vida. Descubra agora