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O lugar todo parecia destoar, ou era eu quem destoava. As mesas todas brancas e decoradas por toalhas pretas, os pratos sem um risco sequer de uso, como se ninguém realmente comesse e a meia luz que me dava dor de cabeça.

Tinha vestido a pior camiseta que eu tinha para esse encontro, quando cheguei e disse quem eu devia esperar ficaram me olhando como se duvidassem de mim, mas não levou muito tempo até me reconhecerem.

Então, aqui estava eu... esperando por ela.

O salão parecia ter feito silêncio e então olhei para a porta e lá estava. Os cabelos negros em um coque repuxado, a roupa escura, num vinho que parecia que só fazia sentido para ela. Saltos altos batendo no chão e todos os olhos seguindo seus passos.

Nossos olhos eram iguais, escuros, era dela também que tinha herdado uma força desconhecida de vontade. Foi ela que reergueu a empresa da família Corbello. Não existia outra razão por estarem de pé. Meu pai era um homem centrado e focado, mas ela, Patrícia Corbello era um tubarão.

Quando parou de frente para mim, podia sentir seu julgamento. Meu cabelo não estava como ela queria, minhas roupas não eram como deveriam ser, e sabia que meu rosto demonstrava o cansaço do dia anterior.

Tudo errado.

- Fico feliz que tenha aparecido e não fugido como uma criança. – seu rosto era quase inexpressivo, porém seus olhos continham um ódio que era todo direcionado para mim.

- É bom te ver também, mãe.

A cadeira foi puxada para ela e então estávamos frente a frente. Éramos tão parecidas que me dava medo que no final, eu fosse como ela. Alguém que não se preocupava com o que os outros iam sentir com as minhas ações.

- Não tenho muito tempo, então serei rápida. – O guardanapo foi para seu colo e ela pediu por uma água. – Seu pai vai dar uma festa no sábado. Nem todos sabem que você está vivendo uma vidinha medíocre, então, mandarei um vestido para a espelunca em que vive.

- Eu não vou. – não precisava ir, era só eles continuarem contando a mesma mentira. Retiro espiritual, curso fora do país. – Não preciso ir, você sabe disso.

- Eu sei e não faria questão, se não fosse uma solicitação do seu pai.

- Você não pode achar que isso me convencerá...

- Não acho. – sua água chegou, eu não tinha pedido nada. – Por mim, você não iria, mas é importante para a empresa que, pelo menos, pareçamos uma família normal e feliz.

- Eu não vou.

- Em algum momento perguntei se iria, Alissa? Não me lembro disso, não é o tópico da conversa, você vai. – seu sorriso cínico cresceu.

- Eu não tenho cinco anos e não dependo mais de você, você não pode me obrigar a algo, pelo contrário, eu pretendo nunca mais depender de você.

- Isso não te levará a nada, você já sabe que todas as portas estão fechadas para você.

- Nunca precisei de você.

- Você me deve. – sua voz soou mais alta que o sussurro no qual estávamos falando.

- Eu não te devo nada, o que vocês fizeram por mim enquanto eu morava com vocês era o que pais decentes devem fazer. – Empurrei a cadeira fazendo barulho e chamando atenção do restaurante, mas não ligava, sentia vontade de vomitar. – Fico feliz por ter te visto, mãe. Até.

Minhas mãos tremiam, não conseguia ficar perto demais de Patrícia e sair bem. Ela minava todas as minhas defesas, sentia meu coração apertado. Eu a odiava com a mesma intensidade que a amava. Como podia essa dualidade me fazer tão mal?

Encontro ao Acaso - Série ao Acaso [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora