XXII. Irmandade

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- Você está bem? - Minha mãe me lançou um olhar desconfiado.

Era sexta-feira. A festa de Emma seria amanhã e eu havia passado a semana inteira evitando tudo e todos, desde o acontecido com Matteo e Leigh. Sentia um misto de vergonha, ego ferido e medo de confrontação. Assenti em resposta à mamãe de modo nada convincente.

- Não é o que parece. Nunca te vi assim antes. Você tem ido de casa para a escola e da escola pra casa há alguns dias - mamãe sentou-se ao meu lado na cama - E por onde anda Cassie, afinal?

Dei de ombros. Este era outro assunto que eu procurava evitar a todo custo. Eu havia sentido a falta de Cassie especialmente após o catastrófico jantar. Quando cheguei em casa, me joguei na cama e não fui capaz de conter as lágrimas que teimavam em se libertar, peguei o celular por instinto e por pouco não liguei pra ela. Era estranho andar pelo corredor da St. Margaret sem Cassie ao lado, eu me sentia vazia.

- E aquele garoto...

- Eu não quero falar sobre isso, ok? - ao ver a expressão de Bridget, percebo que talvez tenha elevado demais a voz - Desculpa. É que... Eu não quero conversar agora.

- Tudo bem - deitou-se ao meu lado, seus cabelos loiros emaranhando-se nos meus - Eu já fui adolescente também; sei como são essas coisas. 

Virei o rosto para o outro lado, evitando olhar para minha mãe. Era óbvio que ela estava preocupada, e eu não aguentava vê-la assim. Sobre a escrivaninha, estava o caderno que eu usara para montar a infame de lista de possíveis namorados, agora muito menor que antes. Os nomes de Matteo e Steve estavam riscados, e restavam apenas Christofer e Ben.

Naquele dia mais do que em todos os outros, eu sentia falta do meu namorado. Que coisa estranha, sentir falta de alguém que você não sabe quem é! Mas eu sabia, de alguma maneira, que se ele estivesse ao meu lado, não estaria me sentindo tão só. Me desculpei mentalmente por não saber como procurá-lo; sentia como se estivesse falhando com sua memória. Queria que ele estivesse ali. Nada disso estaria acontecendo e eu me sentiria a garota mais amada do mundo, e não estaria me sentindo como esse amontoado de lixo incapaz de manter uma amiga, uma irmã e um namorado ao seu lado.

- ... Sei também que amanhã é a festa de Emma Barrett e você não tem o que vestir - ela soltou, depois de muito ponderar.

- Como você sabe? - virei-me na cama, encarando-a agora.

- Ah, o de sempre.. Nós, pais, sabemos de tudo - ela deu uma piscadela - a Sra. Barrett enviou várias fotos em um resort na Bahamas no grupo de Mães da St. Margaret. Não foi difícil deduzir que a Emma deu um jeito de mandar os pais pra lá para ficar com a casa livre nesse fim de semana.

Fiz uma careta. Pela primeira vez  em anos, não estava me sentindo particularmente animada para a festa de Emma.

- Ok. Lá vai: - mamãe respirou fundo, exalando todo o ar que seus pulmões fumantes eram capazes de reter, antes de continuar em velocidade máxima - Leigh Anne está vindo pra cá. Vocês vão fazer compras juntas. Não olha assim pra mim! Não foi minha ideia!

- Mãe! - levantei da cama em um pulo, puxando o edredom que a cobria.

- Não é minha culpa! - Bridget levantou também. Ela parecia uma criança tentando desculpar-se - Seu pai achou que seria uma ótima ideia! Ele percebeu que tinha alguma coisa muito estranha rolando entre vocês. Ele não parou de encher meu saco até eu aceitar.

 Ele não parou de encher meu saco até eu aceitar

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Leigh Anne estava especialmente assustadora. Ela havia adicionado mechas pretas entre o mar de rosa que era seu cabelo, e sua maquiagem  fazia parecer que ela havia mergulhado o rosto em um balde cheio de delineador. Era até cômico vê-la parada em frente a uma Marc Jacobs com aquele visual.

- Não vamos entrar aí - era a primeira vez que ela falava comigo, desde que saímos de casa.

- Mas...

Ela me lançou um olhar que dizia "você não tem escolha aqui. E você sabe muito bem o por quê".

- Tudo bem. Para onde vamos, então? - a culpa não me permitia protestar naquele momento.

- Eu conheço alguns brechós legais por aqui.

- Brechós?

Leigh Anne deixou escapar um sorriso vitorioso.

Era a minha primeira vez em um brechó. Diferentemente da minha irmã, eu não via necessidade de comprar roupas usadas sabe-se-lá-por-quem quando eu tinha dinheiro para comprar roupas novas. Por que comprar uma roupa vintage surrada quando posso comprar algo que foi intencionalmente projetada para parecer vintage? Mas Leigh Anne tinha uma filosofia oposta: ela era o tipo de garota rica que, embora não abrisse mão de todas as regalias que o dinheiro pode prover, gostava de parecer pobre. Aparentemente, isso estava se tornando moda entre as rebeldes privilegiadas.

Leigh Anne estava provando sua terceira calça jeans dos anos 90.

- Essa é perfeita - ela disse, assim que saiu do provador. Mais para si mesma do que para mim.

Em seguida, Leigh jogou uma pilha de porcaria no meu colo. 

- Você não vai escolher sua roupa? Afinal, quem é seu acompanhante? - ela nem olhou para mim enquanto falava.

- Ainda não sei... - respondi casualmente, enquanto separava as roupas que provaria daquelas que eu nunca mais iria querer ver.

- Eu vou com o Matteo - Leigh me lançou um olhar de esguelha.

- Eu sei.

- Eu sei que vocês ficaram.

Agora Leigh estava parada em minha frente.

- Ah, por favor - girei os olhos - Nós nem nos beijamos.

- De qualquer forma, - ela tornou a virar-se para o espelho, dando de ombros - não estou com ciúmes ou algo do tipo. Só não esperava que minha irmãzinha estivesse saindo com o mesmo garoto que eu sem ao menos me contar.

Segurei um vestido de cetim e me encaminhei para o provador, passando por Leigh sem ao menos virar.

- É. Acho que me falta espírito de irmandade - fechei a porta atrás de mim.

O vestido coube como se tivesse sido feito sob encomenda. Olhei-me no espelho. Como eu estava cansada de tudo aquilo! Nunca quis ter uma irmã, e agora ela estava ali cobrando uma lealdade que nunca existiu entre nós. Eu sabia que estava errada, mas não estava disposta a ficar ouvindo insultos e indiretas pelo resto da tarde. Aliás, por que todo mundo insistia para que fôssemos amigas? Só porque nossas mães transaram com o mesmo cara, não quer dizer que temos que nos amar.

Peguei o celular, e quando percebi estava ligando para Steve Reynolds. Em outra circunstâncias, ele seria a última pessoa que eu convidaria para me acompanhar em uma festa. Mas Christofer se recusava a comparecer, Ben estava viajando com a família - e, sinceramente, aquele não era o tipo de ambiente que eu o imaginaria frequentando -, Matteo era o novo namoradinho de Leigh e todos os outros garotos já teriam acompanhantes àquela hora. A única pessoa louca por mim o suficiente para aceitar mudar de planos a fim de me acompanhar seria Steve.

- O-oi? - a voz na outra linha parecia genuinamente surpresa.

- Steve, você gostaria de ir na festa de Emma Barrett comigo?

- Eu... Eu... Poxa, Liz, é que... Ah, quer saber? Sim, eu vou com você. 

- Obrigada, Steve. Esteja na minha casa às 20h. 

- Sim, claro! - ele parecia prestes a explodir.

- Tenho que desligar agora. Assunto urgente. Tchau. Te vejo amanhã. Beijos!

Desliguei antes que ele pudesse dizer alguma coisa e troquei de roupa novamente. Teria que ser aquele vestido. Eu não passaria mais nenhum minuto na presença de Leigh.

- Vamos. Já escolhi meu vestido - anunciei, ao sair do provador.

Procura-se Meu Namorado [COMPLETA]Onde histórias criam vida. Descubra agora