XXXII. Fim

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Quando o universo lhe conceder o privilégio de esquecer algo, aceite calado. Era nisso que eu estava pensando enquanto borrava toda a minha maquiagem no banheiro do ginásio. Eu sabia que as garotas conseguiam ouvir meus soluços nada discretos, e não ligava. Tudo o que importava era que eu acabara de descobrir que fora traída pela pessoa que eu mais amava. Não, não o meu namorado. Cassie.

É retórico mencionar que mil perguntas assolavam a minha mente naquele momento. Cassie sabia de tudo e estava fingindo? Não, não haveria de ser. Ela se mostrou tão ou até mais confusa que eu desde a primeira ligação que fiz, com a voz desesperada e trêmula, perguntando quem era o neu namorado. E Tobias? Não, também era impossível. Em nenhum segundo ele me tratara diferente de uma companheira de palco com quem não se tem intimidade ou conexão alguma, e nunca pareceu saber mais do que o meu nome e algumas fofocas espalhadas ao meu respeito. Então, eu deveria aceitar que eu estava sozinha nessa merda de pegadinha do destino. Destino este que aparentemente nem se importava o bastante para explicar o que estava acontecendo ou o por quê de tudo aquilo. Minha tristeza se transformou em raiva. O que eu deveria fazer com aquelas informações, afinal? De que serve o conhecimento de um passado que nem existe mais? Mais uma vez, desejei não saber tudo aquilo. Se eu desejasse o bastante, o destino me daria uma terceira chance? Eu seria  tão afortunada assim? E, mais importante: eu repetiria minha busca incessante por meu namorado, uma segunda vez?

Encostei a testa na parede da cabine, sem nem ao menos me importar com a sujeira. Sentia e minha cabeça pesar e temia desmaiar se não me apoiasse em algo. Steve, Ben, Matteo, Christofer. No final, nenhum deles era quem eu procurava; no final, eu havia desenvolvido algum tipo de sentimento – mesmo que seja ódio, no caso de Steve – por todos eles, e não sentia nada quando pensava em Tobias. Desde o primeiro dia em que eu acordara com as lembranças borradas, eu imaginava que todo o amor que eu sentia por aquela figura quando namorávamos voltaria, e que aquele sentimento seria mais forte do que tudo que já sentira. Mas toda vez que eu pensava em Tobias, o que me vinha ao peito era semelhante àquela sensação que temos quando esbarramos na rua com alguém que costumava ser muito importante em nossas vidas, mas agora era apenas um estranho. Eu sabia tudo sobre ele, agora que tinha minhas memórias claras como o dia, mas não o conhecia. E, o pior de tudo: eu não ligava. O choro, a raiva, as náuseas. Não era por amor, mas por frustração.

Duas batidas na porta da cabine.

- Liz, você está aí? - era a voz de Cassie. A última pessoa com quem eu queria falar - Liz, responde!

- O que você está fazendo aqui? - me insultei mentalmente ao perceber o quão fraca e trêmula minha voz estava.

- Christofer me mandou uma mensagem. Ele está preocupado, você sumiu há mais de meia hora.

Fazia tanto tempo assim?

- Eu estou bem. Pode voltar. Diga a ele que eu estou bem.

Ouvi um suspiro pesado do outro lado da porta.

- É claro que não está.

- Tobias Atkins está te esperando! Volte pra quadra! - perdi ainda mais o controle sobre minha voz. Agora estava mais do que claro que eu estava chorando. Ótimo!

E então houve um longo silêncio. Me perguntei se Cassie realmente havia me deixado ali e decidido ir para a quadra, para viver seu conto de fadas enquanto eu me tornava prisioneira em uma cabine fedorenta de banheiro, por livre e espontânea vontade. E então ouvi o barulho de algo se arrastando.

- Eu peguei uma cadeira. Não sei quanto tempo você vai demorar, então é melhor esperar sentada.

Chorei ainda mais. Porque ela estava ali, comigo. Enquanto havia um banquete a esperando na quadra de natação e uma festa no ginásio, ela estava ali, entre o cheiro de banheiro sujo e bebidas contrabandeadas para o interior da escola e derramadas no chão.

- Cass - comecei, mas não soube como terminar, então levei um bom tempo - Você ama o Tobias?

Ela riu.

- Sim! - ela estava tão animada, que a voz parecia até mais aguda. Mesmo não podendo vê-la, eu sabia que estava sorrindo - Muito. Às vezes eu até mesmo me assusto!

- E o que você sente?

- Não sei... Não é só o frio na barriga, entende? Não é só a vontade de estar com ele o tempo todo, ou a urgência de quebrar todas as regras dos meus pais sobre o que não fazer antes do casamento - ela riu - É o jeito que ele cuida de mim e eu cuido dele. É... É ter vontade de saber sempre mais sobre ele e achar tão interessante quanto na primeira vez que ele confessou algo. Eu não acho, ou não espero, que seja só paixão adolescente. Acho que vai durar. Mas se não durar... Se não durar, também não tem problema! Ficarei feliz só de ter vivido isso. Caramba, Liz, você tem que mandar eu calar a boca de vez em quando! Estou falando há 2 horas!

Abri a porta. Era até cômica aquela cena, Cassie sentada em uma cadeira de plástico no meio do banheiro.

- Por que você estava chorando?

- Algum dia eu te digo - dei de ombros.

Eu não diria. Não estragaria aquilo para ela por puro rancor de algo que ela nem sabia ter feito.

Christofer levantou assim que bateu os olhos em mim. Eu estava consciente de que parecia maluca, com a maquiagem borrada, o rímel derretido formando uma máscara abaixo dos olhos. Mas eu não me importava, e aquela determinação com que eu andava, sem ao menos olhar para trás, era algo novo e excitante para mim.

Joguei meus braços ao redor do seu pescoço e o beijei. Pela primeira vez, eu não tinha dúvidas de que aquilo estava certo. Quando nos separamos, ambos estávamos um tanto ofegantes.

- Elizabeth, isso pode ser uma má ideia... No-nossa amizade... E minha mãe quer que eu vá morar em Londres com ela, e...

Dei um passo para trás, surpresa com a última sentença. Aquilo era novidade para mim. Balancei a cabeça, para me afastar desse pensamento, e senti a determinação voltar.

- Eu não me importo. Você se importa?

Christofer me encarou por um longo período, como se para decorar todos os traços do meu rosto. Eu estava tomada por um misto de euforia e ansiedade, e as palavras de Cassie não saíam da minha cabeça.

Ele deu aquele sorriso. Leve, despreocupado, amigável.

- Eu também não me importo. Só queria ter certeza de que estávamos na mesma página.

E então nos beijamos.

E eu tive a certeza de que sim, Christofer era a resposta. Fora Christofer o tempo, fora Christofer mesmo quando era Tobias. E, mesmo que a resposta não permaneça sendo Christofer para sempre, pelo menos fora Christofer algum dia.

Procura-se Meu Namorado [COMPLETA]Onde histórias criam vida. Descubra agora