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O rio está calmo,é início de verão. Estou nadando,aproveito a maravilhosa sensação de liberdade.
Não que eu seja enclausurada,mas é terrível ter que prestar atenção a cada movimento temendo quem lhe julgue.

Naquele momento estava somente aproveitando o prazer de relaxar em águas calmas ,mas se alguém me visse quase despida,seria um escândalo.

_Srta. Aurora!_exclama alguém.
Viro-me para quem me perturba. É Selia,minha dama de companhia.
Uma mulata linda,dona de olhos
dourados vibrantes ,curvas bem delineadas e que decorou todas as regras de etiquetas.

_ Não é apropriado que esteja quase despida. Se alguém vê a senhorita dessa forma,poderá destruir sua reputação_ela põe as mãos na cintura ultrajada e indignada.

_Estou em minha propriedade Selia,não vejo motivos para não aproveitar o rio que passa por aqui. Além do mais,se houver intrusos, é bom que saibam que os acusarei de invasores.

Mergulho ainda mais,chegando ao fundo do rio,que não é tão profundo. Volto à superfície,e fito a jovem parada que parece querer dizer algo.

_O que foi Selia?

_O Sr. Castillo Vergara acaba de chegar.

_O QUÊ? E você só me diz isso agora? Mas é claro,tinha que dá sermão primeiro!_nado até a margem e saio do rio. Pego o vestido que já está na mão de Selia e com sua ajuda coloco sobre a roupa molhada.

_Sinto muito senhorita _diz a dama _mas não consegui evitar falar sobre suas ações.

Ignoro Selia e sigo rumo ao casarão. Sei que ela não faz por mal,minha acompanhante é uma pessoa de estirpe e tenta de todas as maneiras fazer de mim uma dama de altíssimo padrão. Entretanto é uma tarefa difícil,uma vez que sou conhecida como "A Indomável ".

Sempre tive o privilégio de ser ouvida,tanto pelos meus falecidos pais como pelo meu adorável tio,Eduardo di Castillo Vergara. Minha mãe,Aurélia,morreu no dia que Bianca nasceu,eu tinha 5 anos na época. Então,coube a papai,Henrique,criar as duas filhas. Ele nunca reclamou por sermos mulheres,sempre nos amou sem restrição. Também nunca se casou,pretendentes existiram e não houve ninguém que conquistasse o seu coração. Seu amor por mamãe era demasiado grande.

Ele não deixou a convenção social dirigir sua vida,de que um homem viúvo,com crianças ,principalmente sendo meninas,deveria contrair matrimônio. Uma presença feminina seria ideal para a educação das filhas. Mas papai julgou desnecessário,pois a sociedade não sabia o que era melhor para ele e suas meninas.

Desde cedo,habituei-me a admirar o orgulho da nossa família:o cafezal. O Sr. Henrique sempre amou aquele verde majestoso,e por consequência, eu também. Estava disposta todos os dias para acompanhar sua rotina,pois visitava a plantação,vendo e dando instruções para cada colheita ou reposição de mudas.
Ele ensinou tudo o que podia para mim,a respeito do cafezal e da vida. Era pequena,mas isso não foi empecilho para aprender tantas coisas.

Quanto a Bianca,ele a amou em excesso. Todas as suas vontades eram realizadas,mas sem nunca deixar de alertar que tudo que se faz tem consequências. Claro que Bianca não entendia muito,mas às vezes ela sentia na pele os efeitos de suas proezas .

Quando ele morreu de pneumonia,eu contava 10 anos e Bianca 5. Foi uma perda tão sem tamanho que ignorei o mundo por dias a fio. Recusei-me a vê seu corpo no caixão e mais ainda em enterra-lo.

Aurora _ A Cada Amanhecer Uma Surpresa Onde histórias criam vida. Descubra agora