XXVIII

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          Pelos olhos de Aurora

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A viajem até Salvador _ que outrora foi a capital do Brasil _ foi exaustiva,principalmente para Bianca que nunca pôs os pés em terras nortistas. Paramos a todo momento,pois suas ânsias de vômitos eram frequentes e os enjoos constantes.

Mas chegamos ao nosso destino faz um dia. Estamos acomodadas no pequeno gabinete,Bianca escreve uma carta para nosso tio. Pois ficou na província paulista para cuidar das coisas por lá. Estou vendo os últimos relatórios que o administrador me entregou. Não há nada incomum,mas ainda assim vou averiguar com os trabalhadores do canavial,como anda a rotina. É sempre bom manter os olhos abertos.

Confiança é mercadoria rara nesse meio.

_ Pronto,terminei. _ diz Bianca ao colocar a pena no descanso. _ Tão logo seque vou mandar o mensageiro deixar.

_ Perfeito,não quero meu tio preocupado. _ volto minha atenção para o relatório. _ Como está se sentindo?

_ Sonolenta,com uma vontade de comer limão.

Ergo a vista surpresa.

_ Limão? Esse desejo é estranho. Então trate de satisfazê-lo,senão o bebê nascerá com a boca aberta,como dizem os antigos.

_ Quem deveria...

Bianca se interrompe,uma sombra de tristeza passa por seus olhos escuros. Não preciso que me diga o que pensa,pois está escrito em seu semblante. Essa melancolia tem nome e sobrenome:Daniel McLane!

_ Bianca. _ a chamo e ela olha para mim como se despertasse de um transe. _ Eu sei que McLane não foi digno de você,mas se maltratar por ele não paga a pena!

_ Desilusão fere,Aurora!_ ela suspira pesadamente. _ Sonhos que ruíram como um castelo de cartas.

Largo o relatório,me levanto e vou até ela. Agacho-me e tomo-lhe suas mãos.

_ Nada do que eu disser vai mudar sua dor,mas seu filho precisa de você. _ aponto para sua barriga. _ Precisa de uma mãe que o protegerá e você tem que encontrar forças por ele!

_ O que seria de mim sem você?_ sua voz sai pontuada de angústia e admiração. _ Sua capacidade de não julgar precipitadamente me surpreende toda vez.Fui leviana e agora me lamento.

_ Você não foi leviana!_ falo convicta _ Por que se foi,eu também fui.

_ Mas você não está carregando uma criança. É a prova de que fui ...

_ Pare Bianca!_ me levanto abruptamente. _ Chega de lamúrias! O que está feito,está feito. Não adianta chorar leite derramado. _ vejo que se encolhe diante das minhas palavras. _ Desculpe-me,não devo me alterar com você.

_ Mas tem razão! O passado não volta e não posso ficar lambendo as feridas como um cachorro maltratado. _ ela se levanta,dobra a carta em mãos e a deixa sobre a mesa. _ Vou chamar um mensageiro e procurar satisfazer meu desejo. Eu não quero que meu filho ou filha nasça com problemas por causa de um limão azedo. _ ela sorri suavemente. _ E por acaso tem limão doce?

_ Na verdade,tem. Só que você não vai achar fácil.

_ Não se preocupe,eu quero o azedo mesmo. Esses desejos são tão estranhos,ontem quis comer sabão.

_ Sabão? _ não contive uma risada. _ E você comeu?

_ Sem sombra de dúvida!_ ela ri e se retira do recinto.

Volto a me sentar,mas não são os números à frente que ocupam minha mente. É em como será a vida de minha irmã.

Bianca tem muito que aprender e compreender. Pode ser que essa criança que vai nascer,possa mudar seu olhar sobre o mundo. Sua maturidade está apenas começando,os desafios que virão vão fazer com que decida o rumo da sua vida.

Aurora _ A Cada Amanhecer Uma Surpresa Onde histórias criam vida. Descubra agora