XIII

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(Thaís)

Se eu pudesse escolher entre passar o natal ou a virada do ano no Rio de Janeiro, é claro que eu optaria pela segunda opção. De uma forma bem clichê, eu usaria uma calcinha amarela e comeria 12 uvas, pulando sete ondas na praia de Copacabana. Contudo, eu não fiquei triste quando no dia 24 o navio estacionou no porto do Rio. Eu enfim iria conhecer a cidade maravilhosa.

Como prevíamos, a cidade estava um caos. O Brasileiro é conhecido não só por não desistir nunca, mas também por deixar para resolver as coisas de ultima hora. Sem muito o que fazer fora do navio, aproveitamos a programação do mesmo e curtimos o show de uma banda sertaneja. Almoçamos em um restaurante de comida nordestina e Gael amou a decoração, ficando deslumbrando com a imensidade de chapéus que enfeitavam uma das paredes.

- Compra um chapéu pra ele. – Pedi ao José quando terminamos de almoçar.

- E o que ele vai fazer com um chapéu que sequer entra na cabeça dele?

- Guardar de recordação! – Apesar de contrariado, José comprou o chapéu. Entretanto, assim que saímos do restaurante e fomos tomar banho de sol, Gael deixou de lado o presente, passando a admirar os variados brinquedos que havia na piscina infantil.

(José)

Minha intenção era de passar a ceia em um dos meus restaurantes preferidos, mas como eu havia me esquecido de reservar uma mesa, tivemos que cear no navio. O que não foi de todo modo ruim, pois na parte da tarde Gael fizera amizade com alguns meninos e desde então não se desgrudaram.

- Belo vestido. – Elogiei Thaís quando a mesma ajeitava seu decote. Ela ruborizou e sussurrou um singelo obrigado em meio a um sorriso; era um vestido azul marinho que contrastava bem com seu bronzeado. Nada vulgar, mas bastante sexy.

Aquele estava sendo o primeiro natal que eu me permiti deixar as preocupações de lado. Emilly não havia deixado de ser saudade, porém, diferente dos anos anteriores, eu não culpava Gael por sua mãe não estar presente conosco.

- Sabe... – Thaís disse. – É a primeira vez que passo o natal longe da minha família... Mas também é a primeira vez que não tenho que acompanhar o show do Roberto Carlos. – Riu. – Obrigada!

- São tantas emoções... – Brinquei. Thaís abriu a boca para dizer algo, mas foi impedida pelo toque de seu celular. Ela pediu licença e se virou para atender o aparelho.

- Oi meu amor! – Apesar de falar baixo, deu para notar seu entusiasmo, o que me incomodou um pouco. – Pensei que fosse esquecer de mim (...) dá um tempo, Renan! – Pff... Tinha que ser logo ele? – Também estou com saudades, nego (...) Desejo a você e toda sua família um feliz natal e todas àquelas baboseiras de fim de ano (...) Se cuida, amor. Amo você.

Fechei o punho, imaginando o soco que eu daria em Renan caso ele estivesse em minha frente. Eles não eram apenas amigos com benefícios? Amigos dizem eu te amo? Sexo com amor não é apenas sexo.

- Vou buscar o Gael. – Falei sisudo, me levantando. – Já está tarde e ele precisa dormir. – Thaís tentou me acompanhar, mas pareceu confusa quando apertei meus passos. Eu estava furioso sem entender o porque. É claro que ela tinha o direito de amar quem bem entendesse, mas tinha de ser logo ele? Seu amigo com benefícios?

Gael não quis se despedir de seus amigos, o que me fez pegá-lo a força e provocar seu choro. Thaís nos alcançou e o tomou de meus braços, perguntando se eu estava louco. As crianças a nossa volta nos olhavam assustadas, como se fôssemos castigar Gael - logo ele que não tinha culpa de nada. Parte de mim queria deixá-lo ali, mas a outra parte estava convicta de que o natal havia acabado.

- Leva ele para o quarto. - Falei num tom autoritário; Thaís lançou-me um olhar furioso, mas atendeu o pedido. Ela pegou as coisas do Gael e seguiu para o quarto, tentando acalmá-lo contra seu peito. Eu não os acompanhei. Fui até a saída do navio e caminhei sem rumo, até parar em um bar, próximo à orla.

O que havia sido tudo isso? Glória e Richard com certeza alegariam que fora um acesso de ciúmes. Mas por que eu sentiria ciúmes de Thaís?

- Tequila, por favor. - Pedi à atendente que prontamente me serviu. A primeira dose desceu rasgando, mas a partir da quinta, parecia que eu estava ingerindo água. 

- Noite ruim? - Perguntou a atendente com um sorriso no canto dos lábios.

- Você é uma pessoa ciumenta? - Perguntei. - Ou melhor... Já sentiu ciúmes de algo ou alguém que não fosse seu? - Ela deu risada, lançando-me um olhar curioso.

- Apesar de acreditar que ninguém é de ninguém, - Enfatizou. - acho que todos nós já sentimentos ciúmes do que não devíamos sentir. - Sorriu, enchendo meu copo. - Aliás, ciúmes é uma merda.

Ciente de que aquela conversa não daria a lugar algum, peguei uma garrafa de whisky e pedi a conta. Meu intuito não era beber até ficar louco ou sair do ar, eu só queria nublar  a mente.

O sentimento que havia se instalado em meu peito, até então me era desconhecido. Emilly nunca dera motivos para ciúmes e eu tinha a certeza de seu sentimento por mim. Nosso amor e cumplicidade eram tão fortes que não havia lugar para coisas infames.

(Thaís)

O dia já havia amanhecido quando José adentrou a cabine cambaleando. Eu que estava na varanda, respirei fundo e fui ajudá-lo antes que o mesmo acordasse Gael que havia custado a dormir.

- Você está bêbado... Ótimo! - Ironizei.

- Levemente alterado. - José argumentou com a voz embolada.

- Claro. - Assenti sem paciência.

Aquele não era nem de longe o natal que eu sonhara passar.

- Cadê meu filho?

- Agora se importa com ele? - Perguntei dura; Gael ficara inconsolável quando o pai decidira acabar com a diversão da noite.

- É meu filho. - Respondeu como se fosse óbvio; optei por ignorá-lo, pois do contrário acabaríamos brigando e isso acordaria Gael.

- Tira a roupa. - Pedi a ele, que me olhou confuso. - Anda, José Alexandre! - Ordenei, puxando sua camisa. Após despido, guiei-o até o chuveiro, ajudando-o a tomar um banho gelado.

- Vai me ensaboar também? - Perguntou debochado. Rolei os olhos, ignorando-o; terminado o banho, José correu nu para a cama e nela se jogou, dormindo logo em seguida.

Quando subi, dei de cara com Gael acordado. Ele estava deitado, quietinho, com os olhinhos grudados em um ursinho de pelúcia que ele mesmo segurava.

- Oi, neném. - Falei, caminhando até ele e pegando-o no colo. José Alexandre ia pagar por tê-lo acordado. - Não está com sono? - Ele permaneceu sério, mas deitou a cabeça em meu ombro. - Vamos dar uma volta.

Levei Gael até o aquário e só assim vi escapar um sorriso, mesmo que tímido, de seu rostinho. Doía vê-lo assim tão amoado. Uma criança triste é de partir o coração. Pior ainda é quando você se apega a essa criança mais do que deveria.

(...)

Uma babá exemplarOnde histórias criam vida. Descubra agora