Escondidos entre as árvores, esperavam a aparição do comboio a qualquer momento. Por sorte, não nevava. Ainda assim o inverno era frio e a vegetacao perdera as folhas. Krisha poderia usar o fogo a vontade, sem medo de gerar um incêndio.
Ela ficou bem atrás dos outros membros do bando. O líder exibia sua cabeça de porco e sua barriga rosada. Balançava seu facão pra cima e pra baixo, deixando todos com medo de algum acidente. Chamou seu pequeno bando maltrapilho.
— Tem certeza de que eles virão por aqui hoje? — rangeu entre os entes presas expostas.
— Tenho certeza, chefe. — Alertou uma criatura que lembrava um macaco prego, com o corpo esguio e bem mais baixo que o porco. — Nossos informantes não erram. É gente de dentro. Gente de confiança.
— Se eles são de confiança, por que eles fazem acordos com ladrões? — resmungou uma criatura com traços que lembravam uma tartaruga, e braços fortes cruzados diante da placa que era a sua carapaça.
— Cala a boca, ligeirinho!
— Eu acabo com a sua raça. Eu sou forte.
— Todos calados! Vamos continuar esperando. Essa é a nossa chance. — Encerrou a conversa o grande porco.
— Tem certeza que é seguro trazer uma humana, chefe, para essa negociação? Os humanos geralmente não servem pra nada. E são todos traiçoeiros.
— Eles servem para comer. — Resmungou novamente a tartaruga.
— Ela é um espécime raro. É uma feiticeira. Vai ficar no suporte. Lançará seu feitiço de fogo. Vai acertar empregado que conduzir a carruagem, e então vamos abordá-los. Se tudo der certo, vão entregar o tesouro sem lutar. Vão pensar que temos um exército. Vão cair direitinho. Se resistirem, basta matar uns dois ou três e eles ficam borrando de medo. As raposas do vilarejo são todas covardes.
— Nisso o senhor tem razão chefe. Bem pensado! Eu cheguei a mesma conclusão. — Continuou o macaco numa fala muito nervosa.
— Eu preferia comer a humana.
O porco se aproximou bem dos comparsas, e falou sussurrando:
— Depois que esse serviço terminar, não se preocupem. Ela pensa que vamos dividir o produto. Vamos dar um jeito em nossa parceira humana no final.
Eles se afastaram com sorrisos no rosto. Krisha detestava quando eles murmuravam. Dava-lhe calafrios.
Os humanos nunca tiveram um rei ou um governante em Al'gória. No entanto, chegaram a viver em relativa paz por um tempo. Essa era a história que ouvira. Ninguém sabia lhe dizer que tempo foi aquele, em que havia assembleia entre as raças, e os humanos podiam pelo menos falar.
Tudo mudou quando os Celestiais chegaram. As raças superiores foram dizimadas. Os leoninos e os lupinos eram as grandes feras que dominavam o território. Quando essas raças caíram, o reino foi entregue ao caos. As raças fracas, incapazes de se oporem aos invasores, passaram a brigar pelos buracos deixados pela guerra. Nesse momento, a vida dos homens virou um inferno.
Os Celestiais trouxeram seus próprios soldados. A raça dos gorilas os acompanhou desde o início. A dominação sobre esta raça aconteceu bem antes de chegarem a Al'gória. Sabe-se lá de onde vieram. Já os Leoninos e os Lupinos, foram escravizados por magia. A sua força não podia ser ignorada, e por séculos, talvez dois ou três espécimes, foram os guardiões dos soberanos. Tais guardiões passaram a ser conhecidos como demônios celestiais.
Os humanos eram conhecidos por sua fraqueza. Até a raça mais frágil estava acima da casta dos homens. Não serviam para o combate, e não serviam para o trabalho na lavoura. Os humanos eram responsáveis pelo lixo, pelas latrinas, pela cremação dos mortos, e pela mendicância. Qualquer pessoa podia matar uma ser humano na rua. Valiam muito pouco. Somente um atributo era exclusivo deles: a magia. Fora os humanos, apenas os Celestiais Brancos.
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O REINO DOS CHACAIS
FantasiNa terra de Algória, governada por uma raça invasora, os humanos são uma espécie decadente. Sem direito a terras, aos ofícios mais nobres, e não tendo defesa, estão sujeitos aos trabalhos mais desprezíveis, desde recolher o lixo até a limpeza de lat...