32. Na biblioteca (parte 1)

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- Amanda, por favor! - Tina estava ficando frustrada e Amanda, irritada.

- Vá procurar o Lex. Tá um dia lindo lá fora.

- Eu não vou te deixar aqui sozinha.

Amanda soltou uma risada de escárnio.

- Engraçado. Você não teve problema algum em me deixar sozinha no final de semana.

Tina teve medo de ligar para a amiga e enfrentar possíveis questionamentos sobre a noite da festa junina. Preferiu mandar mensagem de texto para cancelar o encontro, no domingo, e foi ignorada. Quando encontrou a amiga na escola, Amanda nem sequer a cumprimentou.

Ela estava na porta da saleta de estudos e Tina forçou passagem.

- Eu já te expliquei que precisei ficar com a Maya que está doente.

- E sábado? - Amanda perguntou com sarcasmo. - Foi cuidar dela também?

Tina deu um suspiro estudando alguma possível resposta que acabasse com aquele conflito.

- Nenhum pedido de desculpas! Nada! - Amanda prosseguiu fazendo voz fina e debochada enquanto recitava a mensagem de texto. - "Oi, amiga. Não posso ir hoje. Minha irmã tá doente e tenho que tomar conta dela".

Diante do silêncio de Tina, ela continuou o desabafo.

- Você me deixou sozinha! Você sabia o que tinham... Não! Mais que isso. Você viu o que fizeram comigo. E não me disse onde ia nem fazer o quê. Simplesmente sumiu e até agora, nenhuma explicação. Sequer respondeu minhas mensagens de sábado!

Uma voz dentro de Tina reclamava indignada por Amanda estar sendo ingrata ao menosprezar todo o esforço em protegê-la. Outra voz, bem mais sensata, dizia que Amanda nunca tinha pedido por nada daquilo. A amiga só queria... Ela só precisava que Tina estivesse ao lado dela até que um outro "alguém irritasse a gangue ou fizesse uma besteira gigante". Aquelas tinham sido sábias palavras de Lex e ela havia entendido tudo errado. Quanto mais tentava a proteger, mais a prejudicava.

Tina observou a amiga com mãos nervosas lutando entre si, os olhos marejados, os lábios contraídos, Amanda merecia uma resposta honesta.

- Eu fui atrás daqueles delinquentes de novo. Desculpa. Eu sei que eu devia ter...

- Eu sabia! - Amanda a interrompeu. - O que você fez dessa vez? - Tina baixou a cabeça evitando dar mais informações. Mencionar a casa abandonada e a venda dos cigarros estava fora de cogitação. - Aposto que vai dar errado. Se é que já não deu. Eu te pedi pra ficar longe deles. É tão difícil assim? Você só se mete em encrenca.

- Nisso ela tem razão. - Uma voz masculina e familiar veio da direção de Amanda fazendo Tina levantar a cabeça em sobressalto. - Você realmente é muito boa se metendo em encrenca. Só que eu sinto informar que não vai conseguir ficar longe da gente.

Tina engoliu a seco ao se deparar com Pedro parado na porta da saleta. Ela sabia que ele viria. Em algum momento, ele viria com aquele sorriso de dentes alinhados, os lábios, a língua... "Pare de pensar na boca do garoto!", a mente gritou.

- Não mande arrancarem a cabeça dela, rainha. A freirinha tem boas intenções. Só falta a ela um pouco de bom senso, mas eu juro que tô tentando.

Ele olhou mais uma vez na direção de Tina e fez um gesto com a cabeça para que ela o seguisse para algum lugar, para fazer alguma coisa, e seja lá o que fosse, parte dela estava ansiosa para ir junto e isto a petrificava de medo.

- Vem, freirinha - ele insistiu de forma amigável estalando o dedo para tirá-la do transe. - Acorda! Tenho um lance pra falar com você.

Ela achou que estava pronta para manter a distância e o autocontrole, mas estava enganada. O corpo a traía. Os segredos e ameaças estavam ali, a sufocando. A imagem da amiga, fragilizada no canto da saleta, reforçava a necessidade de obedecê-lo. Entretanto, Tina permaneceu onde estava.

Desistindo de esperar, Pedro pegou a mão da menina e a conduziu até um canto reservado e mal iluminado da biblioteca. Assim que teve oportunidade, Tina se livrou da mão que a segurava tentando manter distância. No caminho, viu Dayse concentrada em algo sem se importar com a interação dos alunos.

Pedro colocou Tina de costas contra uma estante de livros parando para a observar. Ela estava diferente, tanto da menina ousada que havia enfrentado Davi, quanto da menina dócil que ele tinha deixado em casa. Estava amedrontada e pensativa. Ele quase podia ver as engrenagens do cérebro funcionando, liberando fumaça e o deixando curioso.

Tina baixou a cabeça, fechou os olhos por um breve momento e puxou o ar, enchendo os pulmões. Ela tentou trancar o medo dentro da mala, mas ela estava lotada de lembranças do corpo dele, do perfume amadeirado, da voz rouca ao pé do ouvido, repleta de ansiedade e desejo.

Ela o encarou e, ao encontrar o verde dos olhos dele, sentiu o frio na barriga se espalhar pelo corpo. Teve a certeza de que seria muito mais difícil do que estava imaginando.

Pedro e TinaOnde histórias criam vida. Descubra agora