21. Pinscher

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Para chegar até as escadas, Tina teria que cruzar com a gangue. Pedro havia mantido tudo em segredo, mas era certo que Davi ainda queria cantar vitória e ela teria mais uma batalha pela frente.

Tina agarrou o braço de Lex em busca de apoio, torcendo para passar despercebida, mas Davi estava aguardando por ela.

- Olha, olha, quem vem lá. Se não é a Pinscher. Pensei que sua namorada fosse a Rainha de Copas. Trocou ela pelo Otaku? - disse Davi debochado.

- E eu pensei que o Otaku era gay. - completou Martins.

- Não fique triste - respondeu Lex com uma piscada provocativa. - Pode entrar na fila que eu sou flex.

- Ei! Tá pensando o quê? - O garoto se irritou com a insinuação e empurrou o peito de Lex com força. - Eu não jogo nesse time, não.

- Chega! - ordenou Davi estendendo o braço diante do amigo.

- Só deixa a gente passar, tá bom - pediu Tina tentando ser respeitosa. - Eu não quero confusão. Eu já entendi o recado.

- Que bom! Então, mostra que você entendeu mesmo e leva nossas mochilas lá pra cima - desafiou Davi. - Estão ali.

Tina olhou para o banco e encontrou as mochilas surradas, desbotadas e rabiscadas de Davi, Leandro e Martins. Pareciam fáceis de carregar, pois tinham pouco material dentro. Dava para enfrentar a humilhação. O problema começou quando mais duas mochilas de cores vistosas foram adicionadas à pilha por Paola e Viviane.

- Impossível. Me recuso.

- Você o quê? - Davi estava ficando irritado. - Pensei que você tinha entendido o recado. Quem é que manda nessa merda?

De imediato, Tina buscou Pedro com o olhar. Ele estava com um semblante fechado e frio.

- Eu não vou aguentar - ela se justificou para ele. - É sério.

Intrigado, Davi ficou atento à interação dos dois. Pedro ainda mantinha segredo sobre as palavras mágicas, ditas ao pé do ouvido, capazes de controlar aquela garota abusada. O sucesso no terreno baldio ainda era uma incógnita para ele.

- Ela vai levar. - Pedro colocou a mão no ombro do amigo e, em seguida, empurrou a própria mochila contra o peito de Lex. - Ajuda ela - ordenou.

Davi franziu a testa incomodado, mas achou prudente deixar como estava.

- Sim, senhor - Lex bateu continência abraçando a mochila verde musgo com o outro braço.

Um momento de silêncio reinou entre eles. Davi a fez esperar enquanto pegava um chiclete, na própria mochila, o qual ele abriu bem devagar.

- Podemos ir? - perguntou Tina com arrogância e foi ignorada. - Vai fazer um buraco no estômago mascar chiclete tão cedo de manhã, sabia?

Davi a encarou com uma expressão de ódio que a fez se arrepender de ter aberto a boca. Ela engoliu a seco, mantendo a postura, quando o garoto se aproximou e jogou o embrulho do chiclete para dentro da gola da camiseta dela.

- Vamos! - disse Pedro, afastando os amigos, em direção à escada.

Ela aguardou eles sumirem de vista para se livrar da embalagem adocicada, que caiu no chão e lá, ficou. Virou de costas para dividir as mochilas com Lex quando sentiu a mão de alguém a pegar pelo pescoço e a levar de encontro à parede. Foi um gesto rude, mas sem intenção de machucar.

Era Pedro.

- Você ainda não entendeu. - O garoto estava furioso. - Engole essa raivinha e obedece o Davi. Vai chegar uma hora que eu não vou conseguir livrar sua cara.

- Eu não pedi sua ajuda! - Ela foi pega de surpresa por aquele comportamento.

Ele comprimiu os lábios, expeliu o ar dos pulmões com força e a encarou.

- Da próxima vez, vai sobrar pra Amanda. Eu vou entregar o jogo. E, agora, eu tenho várias outras coisas pra contar a ele. O que acha?

Tina o observou decepcionada. Estava enganada ao pensar que ele era diferente do restante da gangue. Pedro observou a expressão dela mudar e se afastou. Respirou fundo, se recompondo, antes de continuar.

- Ele não vai parar até fazer você entender que é ele quem manda. - O tom de voz estava mais suave e persuasivo. - Então trate de baixar a cabeça ou eu conto tudo e jogo no colo da princesinha.

- Ela entendeu. - Lex interrompeu de maneira educada colocando a mão no peito do garoto. - Deixa ela, vai.

Pedro correu a vista entre os dois amigos, pensativo e, então, sorriu para Lex com simpatia.

- Sim, senhor - repetiu as palavras dele com uma discreta continência debochada.

Antes de se afastar, Pedro empurrou a cabeça do garoto numa brincadeira abrutalhada. Lex já estava acostumado com o irmão mais velho que o tratava de forma semelhante. Ele achou graça e Pedro devolveu o sorriso. Antes de voltar para a sala, fechou o semblante em direção à Tina.

- Eu não pedi a ajuda dele - ela disse ao amigo com indignação. Lex deu de ombros parecendo se divertir com as circunstâncias. Ele, de fato, parecia confortável na presença de Pedro e aquilo causava uma certa inveja.

Foi difícil subir as escadas com aquele peso. No trajeto, cruzaram com dois inspetores: Seu Osmar fingiu estar muito atento a um papel que tinha em mãos e o outro voltou, no mesmo instante, para a sala de onde estava saindo. Vários alunos passaram por eles. Alguns sabiam o que estava acontecendo enquanto outros apenas acharam a cena curiosa. Ninguém ofereceu ajuda.

Ao chegar em sala, o burburinho causado foi constrangedor. Tina sabia que falavam dela e da humilhante derrota para Davi. O garoto ouvia os comentários com notável satisfação.

Lex entregou a mochila a Martins, dando outra piscada maliciosa, fazendo o garoto rosnar. Ver que o amigo estava bem era reconfortante. A última coisa que ela queria era mais alguém sofrendo com aquela história.

Tina fez o possível para manter a cabeça baixa. Davi poderia se achar vitorioso, mas ela sabia que era Pedro quem tinha triunfado.

Pedro e TinaOnde histórias criam vida. Descubra agora