33. Na biblioteca (parte 2)

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- O que você quer? - A voz saiu fraca apesar dos esforços em parecer destemida. Era difícil encarar o verde intenso dos olhos dele, com um brilho aguçado e inquisidor. 

Pedro estava encostado na estante em frente, os braços cruzados no peito, e o sorriso de canto de boca trazia o roxo já esverdeado da ferida.

- O que aconteceu com a garota boazinha que eu deixei em casa no sábado? 

Lembrar do momento em que se beijaram deixava ainda mais complicado para Tina manter a clareza. Ela desviou a vista e tentou manter o foco nas vozes abafadas que vinham do pátio.

- Até onde eu me lembre, a gente tava de boas - ele comentou, aproximando-se para endireitar o pingente do pequeno brinco de ouro.

O toque casual foi o bastante para provocar um arrepio pelo corpo. Tina se concentrou, decidida a resistir, a criar uma barreira de indiferença. Por mais difícil que fosse, ela precisava lembrar que Pedro só estava jogando com ela. 

- Só me diz logo o que você quer! - A voz saiu tão firme quanto ela gostaria e Tina sorriu por trás da máscara de antipatia.

- Me dá o celular. - Ele estendeu a mão para que ela entregasse o aparelho.

- Pra quê? - Ela continuou mantendo o mesmo tom.

- Não faz diferença. - Ele manteve a mão estendida e autoritária.

Tina hesitou enquanto pensava em uma desculpa, como ter esquecido...

- Se disser que deixou em sala, serei obrigado a te revistar. E, por favor, faça isso! - Ele finalizou com malícia.

Irritada com o fato de ser tão transparente aos olhos dele, ela tirou o celular do bolso e o entregou contrariada.

- Pra que ficar mudando o padrão? - Pedro perguntou achando graça. - É inútil. Desbloqueia.

- Você não pode ficar invadindo minha vida, mandando e desmandando em mim desse jeito!

Enfim, Tina conseguiu empurrar o medo para dentro da mala e a indignação foi genuína. 

Ele ergueu a sobrancelha, surpreso por ver Tina de volta ao modo Pinscher de ataque.

- Não posso? - Ele levou a mão ao pescoço dela e deslizou para cima erguendo o queixo em provocação. - Eu pensei que a gente tinha concordado que você era minha. - Pedro gostava de repetir aquilo. Uma voz dentro dele o recriminava, mas a reação hormonal disparada pelo corpo falava mais alto. 

Tina sabia que o gesto tinha apenas o intuito de intimidar. Os dedos longos e firmes eram inofensivos e, ao invés de causarem medo, provocaram um sentimento excitante e inesperado. Uma vontade indecente de se entregar.

- Ou será que você gostou de ser minha em outro sentido? - Pedro umedeceu os lábios pensativo, se aproximou do ouvido dela e sussurrou. - Foi bem mais interessante.

Ele sentiu o desejo crescer dentro da calça o impulsionando a beijá-la. Subiu mais a mão, pressionou o maxilar e trouxe o rosto na direção dele. Pedro estava a provocando para que ela protestasse ou fugisse, no entanto... O coração bateu com intensidade. Em vez de raiva ou medo, ele encontrou um brilho de excitação pairando nos olhos dela. 

- Tá bom - ela disse após alguns segundos lutando contra si mesma.

- O quê? - Ele havia se perdido.

- Eu desbloqueio.

Sentindo o coração apertar dentro do peito, Tina segurou o pulso dele e comprimiu os lábios. O gesto o convenceu a se afastar e Tina suspirou aliviada.

Sim, ela tinha gostado de se entregar a ele daquela forma vulgar e vergonhosa. A imagem dos dois juntos insistia em voltar à mente dela para a perturbar. Na noite anterior, ela chegou a fechar os olhos e acariciar o próprio corpo pensando nas mãos dele, mas se recriminou logo em seguida. 

Não. Por mais tentador que fosse, ela não permitiria que o jogo fosse tão longe, e ela gostaria de grifar este "não".

Observou ele pegar o aparelho e adicionar o próprio número, ligar para si mesmo e armazenar o dela. Atenta ao que ele fazia, o coração foi voltando ao ritmo normal. Quando pegou o celular e encontrou "senhor mestre" na lista de contatos, achou graça.

Pedro viu o sorriso. Foi contido e breve, mas estava lá e o fez sorrir de volta. Uma pequena amostra da Tina que ele havia conhecido nas imagens roubadas, uma Tina alegre e cheia de vida.

- Você vai trocar para "idiota pervertido" ou algo do gênero. Tenho certeza.

- Boa ideia.

"Mas você podia ter pedido o meu número ao invés de invadir meu celular, seu idiota pervertido", pensou ela.

- Eu tô precisando de nota nos próximos simulados - disse Pedro.

- Não me surpreende - ela deixou escapar em um murmúrio.

- Gracinha! - Ele a escutou. - Eu vou te mandar quais as matérias são mais urgentes e meu endereço. Escolhe a que você quiser e esteja lá, amanhã, às três.

- O quê? - Tina arregalou os olhos - Como assim?!

- Qual parte você não entendeu? - Ele já esperava aquela reação.

- Eu não posso! - Estudar com ele? Na casa dele? Como ela sobreviveria a isso? Jamais! Não! Impensável!

- Por que não?

- Minha mãe nunca vai deixar! Nunca!

- É só isso?

- Como assim "só isso"?! - Essa era a desculpa perfeita e sem solução.

- Pois trate de convencer sua mãe. - Ele se aproximou do ouvido dela e sussurrou - Ou vai ter que convencer Amanda a te perdoar. - Antes de se afastar, ele pousou os lábios no rosto dela, ali mesmo, perto do ouvido, de forma gentil e demorada.

A imagem dos dois na casa dele somada àquela amostra de intimidade fizeram as pernas de Tina perderem a força e a mente nublar.

- Ficar espionando é feio, princesinha - era a voz dele, se afastando. - Mas fica de boas que o reino tá protegido. Só depende da sua amiga.

Tina tomou um choque ao perceber que Amanda estava por perto e a procurou enquanto Pedro saía da biblioteca. Quase perguntou o que ela tinha escutado, mas se conteve, pois ficaria óbvio que estava escondendo alguma coisa.

- Eu disse que ele tá a fim de você - falou Amanda. - Ou você acha que ele quer mesmo estudar?

Pedro e TinaOnde histórias criam vida. Descubra agora