🍁 - Capítulo X

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Por todos os lados da agigantada habitação real, haviam pessoas atarefadas.
Era noite e, no dia seguinte, o festival espiritual começaria.

Acelin e Freydis estavam na biblioteca do palácio da primavera. Haviam livros espalhados pelo chão, pois Freydis estava mostrando à Acelin os seus poemas favoritos.

— Chega, chega, assim vais fazer minha cabeça explodir — Acelin afastou com a mão o livro que Freydis segurava. Era mais afeiçoada aos números que as palavras e, em Cadmus, parecia que tudo conseguia ultrapassar o limite de sofisticação.

A noite estava linda. Apesar de a chegada do outono trazer à Cadmus um ar mais frio, não era incômodo, era gostoso sentir o ar gelado entrando através das janelas da biblioteca que estavam abertas. 

— Ler ajuda-me a não ficar nervosa — Freydis explicou pondo o livro que segurava no chão.

— E por quê estás nervosa?

Freydis suspirou.

— Amanhã é o festival, então eu terei que realizar uma dança a Belenus. Eu não estou muito segura de que farei bem e eu não queria dançar, mas meus pais pediram. É uma forma de agradar Belenus para que ele nos recompense com uma colheita após o inverno — disse.

— Mostre-me, serei sincera se não estiver bom — Acelin sugeriu. 

— Tudo bem, mas eu não garanto que esteja bom — advertiu.

A princesa empurrou seus livros ganhando mais espaço no centro da biblioteca. Ela respirou fundo e riu por alguns segundos antes de ganhar coragem. Não havia música, mas, mesmo assim, Freydis iniciou os passos. Havia muitos movimentos nos braços, mãos e quadris e, mesmo insegura, Freydis dançava com uma leveza absurda. Todos os seus movimentos pareciam ter uma intenção. A princesa dançava incrivelmente bem e Acelin estava estupefata com o talento da princesa. 

De repente, a comprida e pesada porta de madeira da biblioteca abriu-se revelando, assim, um rosto jovem e belo. O homem alto, abriu um sorriso revelando dentes perfeitamente alinhados.

— Olá, minha irmã — disse caminhando em direção à Freydis e envolvendo-lhe em seus braços fortes. 

Acelin estava a poucos centímetros e podia sentir o aroma doce que vinha dos seus cachos loiros.

— Irmão, esta é minha amiga, Acelin — a princesa disse com naturalidade.

Seu irmão estreitou os olhos. Estranhou que sua irmã tivesse amizade com uma dama e, como era costumeiro em Cadmus, desconfiou.

— Olá, senhorita — a cumprimentou.

Notando que aquele era um príncipe, Acelin curvou o corpo em uma desajeitada mesura.

— É uma honra conhecê-lo, vossa alteza — disse Acelin.

— O nome dele é Anton, é meu irmão mais velho e o herdeiro de Cadmus. Ele não é lindo?

Anton sorriu acanhado. Acelin resistiu a tentação de dizer um bilhão de vezes que Freydis estava certíssima e seu irmão era o homem mais lindo que já vira em toda sua vida.

O príncipe voltou sua atenção à sua irmã mais nova.

— O que achas de jantar comigo em meu palácio, Frey? — Perguntou com um olhar pedinte.

— Claro! — A mais baixa sorriu largo. — É tão raro isto acontecer, como eu poderia negar?

— Estou sempre tão ocupado que não tenho tempo de ver meus irmãos — lamentou-se. — E o outro? Onde está?

Freydis balançou a cabeça negativamente, pois não sabia onde seu outro irmão estava e não queria que Acelin ouvisse sobre ele.

— Senhorita, sabes onde meu outro irmão está? Por acaso o vistes pela habitação real? — Perguntou-lhe.

— Creio que ainda não conheço seu outro irmão — respondeu.

Porém, Freydis sabia que Acelin o conhecia, apenas não sabia que Rurik era um príncipe.

— O nome dele é Rurik. Todos o conhecem por ser muito travesso. Tens certeza de que não o vistes?

Freydis queria apenas que aquilo não estivesse acontecendo. Acelin sempre falava sobre o seu amigo "soldado" e de como começava a gostar de sua pessoa. A princesa não sabia o porquê de o irmão ter mentido, mas não queria que Acelin descobrisse, pois sabia que ela era iria magoar-se.

— Rurik? É este o nome do seu irmão? — Acelin tinha o rosto inexpressivo.

— Sim. Caso o veja, diga que estou o chamando em meu palácio, por favor.

A dama assentiu.

Acelin não o viu. E nem sabia se queria. Estava com raiva, magoada, com uma sensação de ter sido traída. Não o conhecia bem o suficiente para se sentir tão mal, mas odiava ser enganada. Começara a gostar da pessoa que Rurik mostrava ser, agora já não o conhecia mais.

Talvez tenha sido apenas uma coincidência. Talvez existissem dois Ruriks na habitação real ou... Ele apenas mentira.

Quando a gente desconfia de alguém, as mentiras são menos dolorosas. No entanto, quando não há desconfiança, as mentiras quebram as expectativas e dilaceram os laços.

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