Por todos os lados da agigantada habitação real, haviam pessoas atarefadas.
Era noite e, no dia seguinte, o festival espiritual começaria.Acelin e Freydis estavam na biblioteca do palácio da primavera. Haviam livros espalhados pelo chão, pois Freydis estava mostrando à Acelin os seus poemas favoritos.
— Chega, chega, assim vais fazer minha cabeça explodir — Acelin afastou com a mão o livro que Freydis segurava. Era mais afeiçoada aos números que as palavras e, em Cadmus, parecia que tudo conseguia ultrapassar o limite de sofisticação.
A noite estava linda. Apesar de a chegada do outono trazer à Cadmus um ar mais frio, não era incômodo, era gostoso sentir o ar gelado entrando através das janelas da biblioteca que estavam abertas.
— Ler ajuda-me a não ficar nervosa — Freydis explicou pondo o livro que segurava no chão.
— E por quê estás nervosa?
Freydis suspirou.
— Amanhã é o festival, então eu terei que realizar uma dança a Belenus. Eu não estou muito segura de que farei bem e eu não queria dançar, mas meus pais pediram. É uma forma de agradar Belenus para que ele nos recompense com uma colheita após o inverno — disse.
— Mostre-me, serei sincera se não estiver bom — Acelin sugeriu.
— Tudo bem, mas eu não garanto que esteja bom — advertiu.
A princesa empurrou seus livros ganhando mais espaço no centro da biblioteca. Ela respirou fundo e riu por alguns segundos antes de ganhar coragem. Não havia música, mas, mesmo assim, Freydis iniciou os passos. Havia muitos movimentos nos braços, mãos e quadris e, mesmo insegura, Freydis dançava com uma leveza absurda. Todos os seus movimentos pareciam ter uma intenção. A princesa dançava incrivelmente bem e Acelin estava estupefata com o talento da princesa.
De repente, a comprida e pesada porta de madeira da biblioteca abriu-se revelando, assim, um rosto jovem e belo. O homem alto, abriu um sorriso revelando dentes perfeitamente alinhados.
— Olá, minha irmã — disse caminhando em direção à Freydis e envolvendo-lhe em seus braços fortes.
Acelin estava a poucos centímetros e podia sentir o aroma doce que vinha dos seus cachos loiros.
— Irmão, esta é minha amiga, Acelin — a princesa disse com naturalidade.
Seu irmão estreitou os olhos. Estranhou que sua irmã tivesse amizade com uma dama e, como era costumeiro em Cadmus, desconfiou.
— Olá, senhorita — a cumprimentou.
Notando que aquele era um príncipe, Acelin curvou o corpo em uma desajeitada mesura.
— É uma honra conhecê-lo, vossa alteza — disse Acelin.
— O nome dele é Anton, é meu irmão mais velho e o herdeiro de Cadmus. Ele não é lindo?
Anton sorriu acanhado. Acelin resistiu a tentação de dizer um bilhão de vezes que Freydis estava certíssima e seu irmão era o homem mais lindo que já vira em toda sua vida.
O príncipe voltou sua atenção à sua irmã mais nova.
— O que achas de jantar comigo em meu palácio, Frey? — Perguntou com um olhar pedinte.
— Claro! — A mais baixa sorriu largo. — É tão raro isto acontecer, como eu poderia negar?
— Estou sempre tão ocupado que não tenho tempo de ver meus irmãos — lamentou-se. — E o outro? Onde está?
Freydis balançou a cabeça negativamente, pois não sabia onde seu outro irmão estava e não queria que Acelin ouvisse sobre ele.
— Senhorita, sabes onde meu outro irmão está? Por acaso o vistes pela habitação real? — Perguntou-lhe.
— Creio que ainda não conheço seu outro irmão — respondeu.
Porém, Freydis sabia que Acelin o conhecia, apenas não sabia que Rurik era um príncipe.
— O nome dele é Rurik. Todos o conhecem por ser muito travesso. Tens certeza de que não o vistes?
Freydis queria apenas que aquilo não estivesse acontecendo. Acelin sempre falava sobre o seu amigo "soldado" e de como começava a gostar de sua pessoa. A princesa não sabia o porquê de o irmão ter mentido, mas não queria que Acelin descobrisse, pois sabia que ela era iria magoar-se.
— Rurik? É este o nome do seu irmão? — Acelin tinha o rosto inexpressivo.
— Sim. Caso o veja, diga que estou o chamando em meu palácio, por favor.
A dama assentiu.
Acelin não o viu. E nem sabia se queria. Estava com raiva, magoada, com uma sensação de ter sido traída. Não o conhecia bem o suficiente para se sentir tão mal, mas odiava ser enganada. Começara a gostar da pessoa que Rurik mostrava ser, agora já não o conhecia mais.
Talvez tenha sido apenas uma coincidência. Talvez existissem dois Ruriks na habitação real ou... Ele apenas mentira.
Quando a gente desconfia de alguém, as mentiras são menos dolorosas. No entanto, quando não há desconfiança, as mentiras quebram as expectativas e dilaceram os laços.
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CADMUS
Ficção Geral"Por trás de grandes reinos há sempre sangue e traição. O poder em Cadmus tem cheiro pobre." Quando se fala em arquitetura e intelecto, qual reino ousaria competir com Cadmus? Ele era o maior reino dentre as nações. Governado pelo egocêntrico rei Ma...